Os mais velhos se lembram do tempo em que telefone era mercadoria valiosa. Em 1990, demoravam-se anos para se conseguir uma linha telefônica pelos meios oficiais (as empresas pertenciam ao governo, mas atendiam mal ao público).
O caro telefone era declarado no Imposto de Renda, desde que adquirido legalmente. A muitos não restava alternativa senão alugá-lo de comerciantes que, sabe-se lá como, tinham alguns disponíveis.
Preços altos e venda ilegal são consequências da intervenção pública atrapalhada e das restrições ao comércio.
Preços altos e venda ilegal são consequências da intervenção pública atrapalhada e das restrições ao comércio.
Políticas setoriais podem ser bem-sucedidas. Muitas vezes, porém, estão apenas a serviço do oportunismo.
Empresas ineficientes demandam proteções e auxílios porque não conseguem vender seus bens aos preços dos importados. Concorrência desleal, argumentam, afinal a taxa de juros por aqui é mais alta e a taxa de câmbio não ajuda.
Pois bem. Na última década assistimos à disseminação das medidas de incentivo setorial, como a concessão de crédito com taxas de juros subsidiadas, desonerações tributárias e regras de conteúdo nacional.
Não deu certo. Como no caso das estatais de telefonia, o resultado da intervenção pública foi um país mais pobre pela insistência nas velhas teses desenvolvimentistas da época Geisel. Recursos da sociedade são desperdiçados com empresas que adotam tecnologia inadequada para produzir bens de baixa qualidade.
As intervenções atrapalhadas prejudicam o restante do setor produtivo que não pode comprar máquinas e equipamentos mais eficientes, por serem produzidos no exterior. Estima-se que entre 40% e 60% da menor produtividade dos países pobres, como o Brasil, decorra das proteções inadequadas a setores e a empresas.
Reformas são bem-vindas, afinal o Brasil há décadas perdeu o bonde do crescimento em razão do seu capitalismo de compadres. A renda por trabalhador cresceu 18% no Brasil entre 1995 e 2016, contra 48% nos Estados Unidos e 127% nos demais emergentes, excluindo a América Latina.
Deve-se abrir a economia ao comércio exterior, reduzir as distorções tributárias e privatizar muitas estatais. Sugere-se atentar para a regulação, afinal nossa telefonia ainda deixa a desejar.
Algumas empresas irão à falência, como ocorreu com os comerciantes de telefones, desempregando seus funcionários. Recomenda-se cuidar das vítimas inocentes e garantir um período de transição, pois muitos apenas seguiram a regra do jogo, por mais equivocada que fosse.
A alternativa é sucumbirmos, mais uma vez, às pressões de empresários e das corporações de servidores públicos. Subdesenvolvimento não se improvisa.
Folha de São Paulo