Luiz Inácio Lula da Silva recebeu em seis meses de prisão 572 visitas em sua cela especial montada na Polícia Federal em Curitiba – o berço da Operação Lava Jato. A maioria feita pelos advogados com procuração para defender juridicamente o ex-presidente, entre eles, políticos como o candidato derrotado do PT à Presidência da República, Fernando Haddad – que não atua nos processos contra o ex-presidente.
A nomeação de políticos aliados como defensores permitiu ao ex-presidente comandar o PT e a campanha de Haddad da prisão – onde cumpre pena de 12 anos e um mês desde o dia 7 de abril. Além do candidato, a presidente do partido, Gleisi Hoffmann, o tesoureiro, Emídio de Souza, e outros três partidários, o deputado Wadih Damous e os ex-deputados Luiz Eduardo Greenhalgh e Luiz Sigmaringa Seixas, receberam procuração.
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A estratégia possibilitou visitas dos aliados de segunda a sexta a Lula – direito previsto em lei para defensores de presos. Documento da PF anexado ao processo de execução da pena do ex-presidente registra 385 visitas recebidas até o dia 9 – data posterior a da votação do primeiro turno.
Condenado em segunda instância em janeiro por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro no caso do apartamento triplex do Guarujá (SP), que ocultava propinas da empreiteira OAS no escândalo Petrobrás, Lula fez do dormitório transformado em cela no último andar da PF seu comitê político e eleitoral.
O ex-presidente, mesmo inelegível, tentou disputar as eleições. O PT registrou Lula como candidato e Haddad como vice, mas o pedido foi indeferido no dia 31 de agosto pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Nos dias que antecederam e sucederam a decisão de impugnação pelo TSE, as semanas estão entre as mais movimentadas na cela Lula. Haddad esteve com o ex-presidente duas vezes: na segunda-feira, dia 27, e na quinta-feira, dia 30. Na semana seguinte, a cela-comitê – de cerca de 15 metros quadrados – ficou pequena para a maior reunião realizada por Lula: dez advogados estiveram entre 9h e 12h, na segunda-feira 3 de setembro. Entre eles, Haddad, que ainda voltou à tarde.
O ex-prefeito de São Paulo escolhido por Lula, inicialmente, como seu vice e “porta-voz” foi oficializado candidato à Presidência pelo PT na semana seguinte – prazo final dado pelo TSE. Na véspera e no dia do registro, feito em 11 de setembro, Haddad também esteve em Curitiba na PF de manhã e à tarde, em quatro encontros que duraram, ao todo, cerca de dez horas.
Eleito. Haddad fez 21 visitas a Lula na prisão. A primeira delas em 17 de maio, quando seu nome ainda era cotado como “plano B” para a disputa presidencial. A última, na segunda-feira chuvosa de 8 de outubro, após eleito com 31,3 milhões de votos (29,28%) para o segundo turno. Chegou a Curitiba em um jato executivo alugado, modelo Gulfstream G200, da Icon Taxi Aéreo – empresa que recebeu pelo menos R$ 883 mil da campanha petista. Com ele estava o tesoureiro do PT, Emídio de Souza e assessores.
A reunião com Lula foi o primeiro compromisso de campanha de Haddad no segundo turno. Nos 21 dias de encontros foram cerca de 400 horas de conversas, segundo os registros da PF de permanência dos visitantes.
Na última visita antes da derrota, Haddad entrou às 11h08 na cela e saiu às 14 horas. Deu uma entrevista à imprensa, em um hotel da cidade, e retornou para São Paulo. No dia seguinte, a presidente do PT anunciou que Lula teria mandado um recado por ela: “Manda o Haddad fazer campanha, não precisa vir mais aqui”. Desde então, não esteve mais em Curitiba.
Banca. Além de Haddad e os demais políticos, outros 21 advogados se revesaram nas visitas diárias a Lula. São defensores que atuam nas áreas criminal, cível e eleitoral. Os mais presentes foram os paranaenses Manoel Caetano Ferreira e Luiz Carlos da Rocha, com mais de 100 visitas cada, que cumprem as funções de representantes legais e também de companhia para o ex-presidente.
O criminalista Cristiano Zanin Martins, dos processos da Lava Jato, fez pelo menos 31 visitas no período. Greenhalgh é quem coordena a defesa de Lula no processo de execução de pena, na 12.ª Vara Federal de Curitiba. A banca constituída por Lula inclui ainda o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Sepúlveda Pertence (3 visitas), o ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão (11 visitas), o experiente José Roberto Batochio (7 visitas) e o compadre Roberto Teixeira (4 visitas).
A nomeação de políticos como advogados chegou a ser vetada pela Justiça Federal, em Curitiba. A juíza Carolina Lebbos Moura, responsável pela execução da pena, negou a Gleisi (12 visitas) e a Damous (13 visitas) o direito de verem o ex-presidente como advogados. Ex-presidente da OAB do Rio, Damous conseguiu reverter a decisão no Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4) – a segunda instância da Lava Jato. A presidente do PT ainda recorre e só pode ver o petista como “amiga”, no dia das visitas sociais – as quintas-feiras.
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‘Família’. Nos seis meses de prisão, Lula recebeu 54 visitas “sociais”, entre elas, as de Dilma Rousseff (2 visitas), Jaques Wagner (3 visitas) e de algumas 'celebridades', como Chico Buarque, Martinho da Vila e o ator e ativista norte-americano Denny Glover.
A quinta-feira é o dia das visitas de familiares e dos amigos de Lula – data especial reservada ao petista, os demais presos da carceragem da PF recebem a família nas quartas. Nos seis meses de prisão, os registros da PF mostram que o ex-presidente recebeu 116 visitas da família, a maioria dos filhos.
Na prisão, o ex-presidente também teve o direito de receber visitas “religiosas”, nas segundas-feiras. No período, foram 17 de líderes religiosos que estiveram com ele, o mais assíduo, o pai de santo Antonio Caetano de Paula Júnior, o Caetano de Oxossi (3 visitas), da Cabana Pai Tobias de Guiné, conhecida como Terreiro Tulap.
Ricardo Brandt e Ricardo Galhardo, O Estado de São Paulo