sexta-feira, 4 de junho de 2021

"A história como liderança", por Ana Paula Henkel

 



A pandemia nos mostrou que estamos carentes de líderes, mas podemos nos aquecer na memória de homens e mulheres que não deixaram o mal avançar


De vidas à economia, a pandemia que assolou o mundo em 2020 trouxe enormes perdas. Países testemunharam o vírus chinês destruir famílias e dizimar negócios. A doença trouxe vários sintomas graves e, entre eles, a fome, a mentira, a manipulação, a politização de vidas e do futuro de todos nós. Governantes pelo mundo foram expostos. A liderança deles à frente de problemas graves foi posta em xeque, e o pior ficou em evidência. Não temos líderes. Não temos homens de fibra como antigamente. Em um cenário já com a esperança devastada, com inimigos torcendo por “quanto pior, melhor”, onde encontrar a inspiração para seguir sem medo? É preciso resgatar a aura da coragem histórica de pessoas que não se deixaram levar pelo desespero diante de graves situações e até de guerras. A pandemia nos mostrou que estamos carentes de líderes, mas podemos nos aquecer na memória de homens e mulheres que não deixaram o mal avançar.

Por mais que estejamos vivendo um momento complicado em nossa história, neste próximo domingo, 6 de junho, pare por alguns minutos, converse com os filhos e netos sobre história, dê uma chegadinha com sua família ali no YouTube e coloque na barra de pesquisa: “D-Day”. Precisamos apreciar a perspectiva de que, por mais dolorosa que esteja nossa situação, o mundo é um lugar melhor por causa daquele dia.

Às 6h30 da manhã de 6 de junho de 1944, a primeira leva de tropas norte-americanas, britânicas e canadenses pousou nas praias da Normandia, na França, naquela que seria a maior invasão marítima da história. Ao amanhecer, 18 mil paraquedistas britânicos e norte-americanos já estavam em solo francês. Um adicional de 13 mil aeronaves foi mobilizado para fornecer cobertura aérea e apoio para a invasão. No fim do dia, 155 mil soldados das forças aliadas estavam nas praias normandas para lutar contra as tropas de Hitler.

Passados 77 anos do Dia D, tudo parece claro e óbvio. Bastava invadir a Europa pelas praias da Normandia com um suporte aéreo maciço, pegar as tropas alemãs desprevenidas e começar a retomar a França e depois o resto do continente. A maior invasão por mar da história deu certo, o mundo começou a ser libertado do monstro nazista no dia mais famoso da 2ª Guerra, mas de claro e óbvio não havia nada, apenas o heroísmo que anda tão em falta nos dias de hoje.

Além de recordarmos o histórico Dia D, nesta semana também lembramos os 17 anos da morte de Ronald Reagan, o 40º presidente norte-americano, que lutou incansavelmente contra regimes totalitários no mundo nos anos 1980 e faleceu em 5 de junho de 2004. Em 1984, na celebração de 40 anos do desembarque das tropas norte-americanas nas praias da Normandia, Reagan fez um discurso histórico com a presença de alguns dos Rangers norte-americanos que sobreviveram àquela batalha: “Vocês eram jovens naquele dia em que tomaram esses penhascos; alguns de vocês eram apenas garotos com os maiores prazeres da vida diante de vocês e mesmo assim arriscaram tudo aqui. Por quê? Por que vocês fizeram isso? (…) Nós olhamos para vocês e de algum jeito sabemos a resposta. Fé e crença. Lealdade e amor”.

Ainda há veteranos da 2ª Guerra Mundial entre nós e, se você tiver o privilégio de conhecer algum, não deixe de dizer a ele quanto somos gratos e eternamente devedores do que fizeram. Como muito bem disse Churchill, “nunca tantos deveram tanto a tão poucos”. A democracia liberal que herdamos não caiu do céu, ela foi construída com “sangue, suor e lágrimas”, somos apenas beneficiários de um presente que nada fizemos para merecer, mas temos, a cada dia, a oportunidade de reverenciar, homenagear e agradecer. Reagan, que se firmou como líder mundial no combate ao comunismo, foi categórico: “A liberdade nunca está a mais de uma geração da extinção”.

O fim da 2ª Guerra não encerrou os problemas do mundo. A ela se seguiu a Guerra Fria e o risco real de uma hecatombe nuclear, como na Crise dos Mísseis de 1962, naqueles fatídicos “13 dias que abalaram o mundo” (o filme homônimo com Kevin Costner é espetacular!). No entanto, o risco de perdermos a Europa e depois o mundo livre para o nazifascismo é incomparável com o que houve antes ou depois na história. Sem o desembarque na Normandia, em 6 de junho de 1944, é difícil imaginar que a vitória viesse meses depois.

Em 1940, ainda no começo da guerra e sem a presença das tropas norte-americanas, depois que belgas, britânicos e franceses foram cercados por tropas alemãs durante a longa batalha de seis semanas no norte da França, 198 mil soldados britânicos e 140 mil soldados franceses e belgas foram salvos na operação conhecida como “Milagre de Dunquerque”. A evacuação maciça das tropas aliadas das praias e do porto de Dunquerque, que envolveu centenas de embarcações navais e civis e serviu como ponto de virada para o esforço de guerra dos Aliados, é maravilhosamente retratada no excelente filme Dunkirk, de 2017, dirigido e produzido pelo britânico Christopher Nolan.

Sou fã confessa de Christopher Nolan e profunda admiradora de seu trabalho, e é de Dunkirk que me lembro neste momento tão crítico no Brasil e no mundo. O trecho que resume a ideia central do filme se dá quando o piloto de um avião derrubado, resgatado boiando no mar e traumatizado, grita com o homem comum que segue com seu pequeno barco para tentar resgatar soldados a pedido de Churchill na França ocupada. “Você tem que voltar! Seu lugar é em casa!”, grita o piloto abatido.

Para o piloto, vivido pelo sempre enigmático e brilhante ator irlandês Cillian Murphy, o cidadão comum deve deixar a guerra para os profissionais, que o mais prudente é ausentar-se, omitir-se, proteger-se na própria casa, enquanto o destino da nação estava sendo decidido entre as forças do bem e do mal na 2ª Guerra. A resposta de Mr. Dawson, interpretado com dignidade comovente por Mark Rylance, não poderia ser mais definitiva: “Se não ajudarmos, não haverá mais casa, filho”.

A grande geração que salvou o mundo do eixo nazifascista há mais de sete décadas era composta de heróis na essência do termo, em pensamento e ação, em força, em capacidade de sacrificar tudo por todos. Lembrando G. K. Chesterton, eram jovens que não foram movidos pelo ódio do que estava na frente, mas por amor ao que deixavam para trás.

O Brasil, país das forças aliadas na 2ª Guerra, ainda sofre as consequências de uma dura batalha travada contra o assalto petista sem precedentes às instituições brasileiras, completamente impregnadas de seus agentes políticos torpes, e padece atualmente ataques diários da imprensa de necrotério, como muito bem diz nosso mestre Augusto Nunes. O projeto de poder da era petista envolve não apenas um fantástico e inacreditável volume de dinheiro, mas também mostra a clara e evidente intenção de usar da força desses braços infiltrados no Estado para subjugar o país ao projeto de poder do partido mais uma vez.

Mas vamos lá: para os que empurram a falsa esperança de uma “terceira via” para 2022, não é difícil reavivar a memória de quem não se lembra o que foram petistas no poder entre 2003 e 2016, o que fizeram e que país entregaram. Será que já esquecemos a pilhagem bilionária dos cofres públicos, verdadeiras fortunas “emprestadas” a ditaduras companheiras, e o aparelhamento do Estado por militantes cleptomaníacos? E a total incapacidade de viabilizar no país um ambiente favorável ao investimento e à geração de empregos, com crescimento sustentável sem feitiçarias econômicas, como empréstimos sem lastro que acabaram gerando crise, recessão e milhões de desempregados e inadimplentes?

 

Um povo acostumado com o Estado onipotente e paternal hoje pede austeridade fiscal e um governo mais enxuto

 

Enquanto a bolha de falsos liberais, jornalistas militantes e celebridades hedonistas se preocupa com a proteção de seus vícios e perversões, suas estúpidas falácias são plantadas e espalhadas como ervas daninhas, na rasa e falsa comparação de um ex-presidiário — e, talvez, o maior corrupto que o país já viu — com o atual presidente.

O Brasil está no campo de batalha novamente. Não apenas no campo de batalha da pandemia, uma guerra travada em todo o mundo, mas na árdua tarefa de lutar com um inimigo invisível ao mesmo tempo em que precisa enfrentar inimigos domésticos que não almejam progresso e liberdade.

Nossas batalhas são incrivelmente menores e incomparáveis àquelas vividas por homens de extrema bravura há 77 anos. No entanto, é deles que devemos tirar o exemplo de patriotismo — palavra tão demonizada pela atual geração mimada, afetada e egocêntrica — que pode e deve servir como combustível durante tempos de sacrifício, resiliência e compromisso com o futuro. Apesar do vírus e do grande movimento para derrubar um governo legitimamente eleito, o curso de quem trabalha segue. Há enormes ganhos em campos importantes como a MP da Liberdade Econômica, a Reforma Trabalhista e a da Previdência, a MP do Saneamento Básico, a balança comercial que teve seu melhor desempenho dos últimos 33 anos, e agora a excelente projeção do PIB, que pode superar os 5% no ano de 2021, de acordo com algumas instituições financeiras importantes como Goldman Sachs, XP Investimentos e Banco Itaú.

Testemunhamos atualmente a vontade popular para uma importante e independente conscientização política. Um povo acostumado com o Estado onipotente e paternal hoje pede austeridade fiscal e um governo mais enxuto. Temos a chance de avançar ainda mais com a Reforma Administrativa, a Tributária e, quem sabe, uma possível Reforma Política que tiraria os sabotadores da pátria do cenário político.

O Brasil não pode vacilar. Não podemos mais nos condicionar ao fracasso e cultivar crises, é o futuro das próximas gerações que está no front. Se faltam líderes no mundo atual, sobra história para nos inspirar. Se não encararmos essa guerra e apenas voltarmos para casa, poderá não haver mais casa esperando por nós.

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Revista Oeste