Em meio ao processo de impeachment, a presidente Dilma Rousseff decidiu viajar nesta quinta-feira a Nova York, onde participará da cerimônia de alto nível de assinatura do Acordo de Paris sobre Mudança do Clima, na Organização das Nações Unidas (ONU).
Dilma só deverá voltar a Brasília no domingo, véspera da instalação no Senado da comissão que analisará seu afastamento. Durante sua ausência, o vice Michel Temer, a quem Dilma tem se referido como “conspirador” e “traidor”, assume o cargo. Conforme antecipou o colunista Lauro Jardim em seu blog, Dilma aproveitará a viagem aos Estados Unidos para denunciar, no exterior, o que chama de “golpe”.
A estratégia de Dilma de falar à imprensa estrangeira foi decidida segunda-feira, quando ela deu entrevista para jornalistas brasileiros, para os quais disse se sentir injustiçada com o resultado da votação da Câmara, que aprovou a abertura do processo de impeachment.
No mesmo dia, a Secretaria de Comunicação Social da Presidência enviou e-mail para todos os correspondentes estrangeiros registrados no Brasil. Estiveram na entrevista coletiva 26 veículos internacionais. Na avaliação do governo, a imprensa estrangeira estaria dando maior espaço aos argumentos de defesa da presidente.
Na entrevista de terça-feira, Dilma disse que o Brasil tem um “veio golpista adormecido”. Aos correspondentes, listou casos da História para reforçar o argumento:
— Se acompanharmos a trajetória dos presidentes no meu país, no regime presidencialista, a partir de Getúlio Vargas, vamos ver que o impeachment, sistematicamente, se tornou um instrumento contra os presidentes eleitos. Tenho certeza de que não houve um único presidente depois da redemocratização do país que não tenha tido processos de impedimento no Congresso Nacional. Todos tiveram. Todos — afirmou, sem citar, porém, os processos movidos contra os ex-presidentes Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso, liderados pelo PT.
“ESTÃO VENDENDO TERRENO NA LUA”
Embora em tom mais ameno, em relação à semana que antecedeu a aceitação do impeachment pela Câmara, Dilma voltou a falar em “golpe de Estado”, “conspiração” e “injustiça”. Disse que as articulações políticas paralelas ao Planalto — no Palácio do Jaburu, residência oficial do vice — são fantasiosas e descompromissadas.
— Estão vendendo terreno na Lua — declarou: — A conspiração se dá pelo fato de que a única forma de chegar ao poder no Brasil é utilizando métodos, transformando e ocultando o fato que esse processo de impeachment é uma tentativa de eleição indireta, de um grupo que, de outra forma, não teria acesso pelo único meio justificável, que é o voto direto.
Referendado duas vezes pelo STF, o processo de impeachment foi aprovado por 72% dos deputados no domingo.
Ao ser questionada se não sabia da corrupção no PT e na Petrobras, Dilma afirmou que não tinha conhecimento dos malfeitos porque a corrupção é feita “às escuras”, e que medidas tomadas pelo seu governo, assim como pela gestão do ex-presidente Lula são as causas das investigações atuais:
— Foi preciso a delação premiada, o reconhecimento da independência dos procuradores, do Ministério Público, uma atitude em relação à Polícia Federal. Foi preciso um conjunto de leis para que isso fosse descoberto. Agora, o que é próprio da corrupção
Em resposta ao que considerou uma tentativa de “vitimização” por parte da presidente Dilma Rousseff, o PMDB coordenou a divulgação, nesta terça-feira, de nota de repúdio assinada por 14 partidos favoráveis ao impeachment. No texto, o grupo critica os questionamentos da presidente ao processo conduzido pela Câmara no último domingo e alega que ela procura inverter sua posição de “autora de crime em vítima”. Segundo o texto, Dilma encenou “triste espetáculo” perante correspondentes da imprensa estrangeira ao tentar “desqualificar a soberana decisão da Câmara” na autorização do processo.
DILMA CRITICA CITAÇÃO A CORONEL USTRA
Na entrevista, Dilma também declarou que não teve responsabilidade pela crise econômica brasileira. Alegou não ser a única responsável pela situação econômica nacional e citou fatores internacionais que teriam contribuído para a recessão, embora ao tombo na economia brasileira seja maior do que a dos demais países emergentes.
Dilma condenou o voto do deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) a favor do impeachment, no plenário da Câmara. Bolsonaro citou o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, já falecido, acusado de torturar presos na ditadura militar.
— Era e é o maior torturador que este país já viu. Eu lastimo que esse momento no Brasil tenha dado abertura para a intolerância — disse Dilma, que classificou o episódio de “lastimável”.
À noite, Dilma desceu a rampa para receber flores de cerca de 400 mulheres, que organizaram um ato de apoio a ela e fizeram um “abraçaço” no Palácio.
— Estou de alma lavada! — disse às mulheres.