segunda-feira, 5 de agosto de 2024

'Obrigado, Rebeca Andrade', por Paulo Polzonoff Jr.

 

Obrigado, Rebeca Andrade.- Foto: EFE/ Miguel Gutiérrez


Não sou de acompanhar esportes olímpicos. Muitos menos a ginástica. Aliás, até outro dia eu estava bem disposto a boicotar as Olimpíadas de Paris. Não que meu boicote fosse mudar qualquer coisa, mas é aquele gesto simbólico, de mim para mim, que na pior das hipóteses rende uma boa discussão com meu amigo Marcio Antônio Campos. Só que no meio do caminho entre mim e o boicote havia Rebeca Andrade. Ainda bem.

Não sou capaz de discutir aqui os evidentes méritos esportivos de Rebeca Andrade. Nem me cabe. Mas sou capaz e me cabe exaltar a postura da moça, que transborda uma alegria simples e genuína e tranquila, mesmo em meio a um ambiente tão tóxico, com fãs e a imprensa estimulando uma inimizade entre a brasileira e sua principal rival, a norte-americana Simone Biles.

De tudo o que vi até aqui, Rebeca Andrade dá de ombros para essas coisas. Para o que os outros esperam dela. No que faz muito bem, clap!, clap!, clap! E não falo apenas dessa rivalidade que não é e nem precisa ser assim uma coisa Ayrton versus Prost. Falo também da exigência para que Rebeca Andrade se posicione politicamente num mundo viciado em política. Ela simplesmente parece ignorar essas exigências, faz o seu melhor e, cristã que é, agradece a Deus por suas conquistas. E pronto. E basta.

Para além do sucesso na ginástica, essa despretensão sorridente é a maior contribuição que Rebeca Andrade poderia dar não apenas para o mundo do esporte – um mundo corrompido por vitimismos e identitarismos de toda sorte; é a maior contribuição que Rebeca Andrade poderia dar para o Brasil de hoje – um país triste, viciado na disputa política, tomado por um permanente sentimento de indignação e sobretudo paralisado por um medo inconfessável, mas ainda assim medo.

É disso – de alegria, de gratidão, de talento e do trabalho bem feito, sem exaltações ao próprio eu quando do sucesso e sem justificativas vitimistas quando do fracasso – que o país mais precisa. Sei que amanhã ou depois  ninguém mais vai se lembrar da joie de vivre e desse desprendimento virtuoso de Rebeca Andrade, mas tudo bem. Fiz questão de registrar para dizer: obrigado, Rebeca Andrade.

Obrigado por nos lembrar de que a vida é mais simples do que parece e do que interessa àqueles que lucram, financeira, política e emocionalmente, com o interminável estímulo ao conflito. E desde já aproveito para pedir desculpas. Porque essas lições a gente aprende e esquece rápido demais. Você vai ver amanhã.




Paulo Polzonoff Jr., Gazeta do Povo