Manifestação na Avenida Paulista, em São Paulo| Foto: EFE
As manifestações de massa do último domingo em São Paulo dividiram o PT, basicamente, em dois lados. Um lado, quase sem ninguém, que não abre mão do seu direito de pensar. Outro lado, com quase todo o resto, que não consegue mais viver no mundo tal como ele é. Estão intoxicados com a mesma ideia fixa de Lula: tudo neste mundo e nesta vida se resume hoje a uma “narrativa”.
O que de fato acontece, segundo essa obsessão, não aconteceu. Só pode acontecer o que a “narrativa” diz que está acontecendo. É por conta disso que se deram a obrigação de acreditar só no que lhes dizem para acreditar – e de ver diante dos seus próprios olhos só o que a “narrativa” permite. É o caso da manifestação de massa que acaba de acontecer em São Paulo. A maioria do PT nega que tenha acontecido.
Segundo a “narrativa”, só havia na rua meia dúzia de “fanáticos”, ou “fascistas” ou “golpistas”.
O próprio Lula, com toda a sua capacidade de mentir automaticamente em qualquer circunstância, resmungou que sim, infelizmente, “eles” tinham feito uma manifestação “grande”. (Para Lula, as centenas de milhares de pessoas que foram à Avenida Paulista reivindicar o Estado Democrático de Direito não são brasileiros; são “eles”.)
Mas a imensa maioria do PT, da esquerda e das classes intelectuais mergulhou sem pensar num negacionismo exaltado. Decidiram, antes mesmo de a multidão ir para a rua, que a manifestação já tinha fracassado. Depois, com vídeos e fotos mostrando pelo menos dez quarteirões inteiros forrados de gente na avenida, continuaram a dizer que deu tudo errado. Virou uma neura.
Segundo a “narrativa”, só havia na rua meia dúzia de “fanáticos”, ou “fascistas” ou “golpistas”. Bolsonaro estava “isolado”. Alexandre de Moraes foi o grande vencedor – assustou os “bolsonaristas” e mostrou que é ele quem manda neste país. Os melhores momentos ficaram por conta da análise cromática do palanque. Os “golpistas” estavam fatalmente divididos, diz a esquerda. A prova mais evidente, pela doutrina petista das cores, é que o governador Romeu Zema foi de camisa branca – um claro desafio à multidão vestida de verde e amarelo que estava à sua frente. O governador Tarcísio de Freitas foi outro escândalo: sua camisa, de um amarelo mais claro, não estava no tom de cor exigido para a ocasião.
Falaram de tudo. A manifestação fracassou porque o Brasil tem mais de 200 milhões de habitantes – e a maioria deles não estava na Paulista, como se houvesse a possibilidade física de estarem. Nada disso vai adiantar nada – “o Xandão” vai prender Bolsonaro, e aí tudo estará resolvido. O mais cômico de tudo, possivelmente, foram os cálculos de um professor da USP assegurando que houve só “185 mil” pessoas na manifestação. Professor de que? De “políticas públicas”.
No passado, foi um defensor aberto do terrorista italiano Cesare Battisti, condenado por quatro homicídios e hoje cumprindo prisão perpetua na Itália. Seu número, aparentemente, saiu de “algoritmos”; para a esquerda virou informação “científica”. Não ocorreu a nenhum deles fazer a única pergunta possível: “E daí?”. Qual a diferença que pode haver entre os 185 mil do professor e os 750 mil do cálculo feito pela PM de São Paulo – ou qualquer número entre um e outro? O que aconteceu na vida real foi a maior manifestação de rua dos últimos dez anos, e essa manifestação foi contra o governo. A esquerda decidiu que não houve.
J.R. Guzzo, Gazeta do Povo