A flexibilização das medidas sanitárias vai permitir a abertura de novos negócios neste segundo semestre.|
Embora a pandemia do coronavírus tenha afetado em cheio o setor de alimentação fora do lar, o número de novos negócios abertos apenas no primeiro semestre de 2021 já é maior do que no mesmo período de 2019, antes do aparecimento da doença que paralisou o mundo.
Dados divulgados na última semana pelo Instituto Brasileiro de Pesquisa Tributária (IBPT) apontam a abertura de 16.659 restaurantes, lanchonetes, casas de suco e similares em todo o Brasil de janeiro a junho de 2021. É um número maior do que no mesmo período de 2019, quando 13.326 novos negócios foram criados, e de 2020, com 10.939 – sendo que a pandemia no Brasil começou a afetar o comércio a partir do final do mês de março.
A pesquisa leva em consideração os dados públicos da Receita Federal do Brasil, e estima que 85% deles são de negócios independentes e 15% de franquias. Esse bom desempenho contrasta com o número de fechamento de empresas ao longo da pandemia que, segundo entidades representativas do setor, ficou entre três a quatro em cada 10 estabelecimentos.
Já o número oficial de baixas de CNPJs é um pouco mais complicado de se apurar, segundo o IBPT, já que muitos empresários param de funcionar sem comunicar a Junta Comercial e mantém as portas fechadas até uma nova oportunidade de retomada dos negócios.
Gilberto Luiz do Amaral, head do de estudos do Empresômetro, o índice do IBPT para a análise de novas empresas, explica que a crise provocada pela pandemia do coronavírus abriu uma espécie de “janela de oportunidades” no setor, mesmo tendo sido o mais afetado pelas restrições.
“A expectativa é de que vamos continuar com esse índice alto de crescimento no segundo semestre, e uma tendência que a partir de do primeiro semestre de 2022 a intensidade caia, pois já vamos ter muitos estabelecimentos abertos”, analisa.
A explicação é a mesma que especialistas de mercado vêm comentando desde meados do ano passado, de que a crise provocada pela pandemia iria tirar muitos empresários do mercado por conta das dificuldades de manter o negócio em pé. Ao mesmo tempo, isso iria criar oportunidades para outros ingressarem no mercado, com um aumento da vacância de espaços em shoppings centers e nas ruas – consequentemente, com melhores negociações de aluguéis.
Dentre esses mais de 16 mil novos negócios, segundo o IBPT, também estão os empreendedores “por necessidade”, que perderam os empregos e foram começar o próprio negócio com as verbas rescisórias pagas pelos antigos empregadores.
Estatísticas do índice do Empresômetro apontam que outra parte destes novos negócios é de antigos empreendedores do setor de alimentação fora do lar que encerraram um modelo de operação para iniciar outro. Segundo Amaral, muitos deles fecharam os pontos fixos para investir no formato de delivery, que deu um salto ao longo da pandemia.
“Os restaurantes tradicionais e as lanchonetes não tinham a visão do delivery, e foram forçadas pelo fechamento obrigatório a começarem a operar, mas sem uma estrutura e uma visão do que é o delivery. Já os novos negócios que estão surgindo estão incluindo o serviço nas suas estratégias de venda”, conta.
É exatamente o que apontou a mais recente pesquisa da Brain Inteligência Estratégica feita com exclusividade ao FoodCo., a nova plataforma de comunidade e educação da Pinó, da Gazeta do Povo. De acordo com o levantamento, os aplicativos de delivery passaram a ser usados por 56% dos entrevistados, sendo que 14% usavam pouco e 42% já tinham uma frequência maior.
Destes, 26% disseram ter aumentado muito o uso, e 37% um pouco. Isso confirma o que o que Gilberto Luiz do Amaral classifica como uma “mudança cultural da população”, que não deixou de consumir alimentos prontos mesmo com o fechamento dos restaurantes. Apenas mudou a forma de compra-los.
“As pessoas não deixaram de comer alimentos preparados fora de casa, mas não sabiam o que era pedir uma comida através de aplicativos. Com isso o mercado foi ampliado”, afirma.
Aposta na retomada
É o que o empresário Leonardo Macedo, da rede de docerias Nanica Brasil, viu acontecer do ano passado para cá. Durante a pandemia do coronavírus, as vendas triplicaram no delivery dele, o que permitiu a abertura de mais pontos voltados exclusivamente para as entregas em São Paulo.
“Entramos em 2020 com uma loja física e duas dark kitchens, e aí as notícias da pandemia começaram a chegar. Mas nós já estávamos preparados para o delivery desde o começo, e vimos as vendas triplicarem e abrimos mais uma dark kitchen em São Paulo e uma em Campinas, apostamos na retomada”, explica.
Isso confirma o que a Brain atribuiu aos dados da pesquisa, de que os empreendedores que se prepararam para o delivery teriam um desempenho de vendas maior durante e após a pandemia.
Com a flexibilização dos decretos sanitários por todo o país em função do avanço da vacinação, Gilberto Luiz do Amaral diz que mais e mais negócios estão podendo voltar a operar com uma maior capacidade ou limite de horários de atendimento. A chegada do verão, segundo ele, vai ser de novas apostas de negócios.
“Vemos também os empreendedores indo para determinados nichos de atuação [como comida vegetariana, etc], e veremos ainda a abertura de muitos negócios com espaços de convivência ao ar livre e de reunião de pessoas para socializarem e cozinharem juntas”, afirma.
Isso deve ocorrer por conta da necessidade de socialização que as pessoas têm após tantos meses de pandemia e de restrições sociais, como também vem sendo apontado em pesquisas de mercado.
Guilherme Grandi, Gazeta do Povo