quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

Wladimir K. Teles: "O Lado Bom de 2016"

O Estado de São Paulo

Ano foi terrível em termos de desempenho econômico, mas foi decisivo para uma retomada sustentável de longo prazo

A economia brasileira se encontra na pior crise de sua história. Durante a década perdida dos anos 80 o crescimento do PIB per capita na década foi de 0,2%. Na década que estamos teremos pela primeira vez desde 1900, quando temos dados de PIB, um crescimento negativo do PIB per capita.
No ano de 2016, nós observamos mais uma queda vertiginosa no produto e um crescimento acelerado no desemprego. No ano de 2015 as empresas queimaram seu caixa – sua gordura – mas em 2016 começaram a quebrar, quando atingimos elevados níveis no índice de empresas pedindo recuperação judicial (cerca de 9 vezes maior do que em 2010). Em outras palavras, as empresas começaram a vender seus ativos – sua musculatura. Com isso o preço dos ativos cai e colateral das firmas com ele, levando a economia rumo a uma crise de crédito. Nesse cenário, com as empresas falindo, não adianta ter confiança, pois não há mais condições para o investimento ser realizado.
ADCO190  BSB -  06/10/2015 - CONGRESSO / VETOS  -  POLITICA - Presidente do Senadpo Renan Calheiros presie sessão do Congresso Nacional para tentar votar vetos da presdiente Dlma, e enfrenta baixo quorum, no plenário da Câmara dos Deputados , em  Brasilia.  FOTO: ANDRE DUSEK/ESTADAO
(Foto: André Dusek/Estadão)
Ou seja, as políticas econômicas equivocadas fizeram a economia desmilinguir. Mas infelizmente é bem mais fácil destruir a economia com uma política equivocada do que promover a recuperação. As medidas de ajuste fiscal podem evitar um crise ainda mais aguda, mas a retomada do crescimento não emergirá tão rapidamente em uma ambiente tão calamitoso.
Mas qual o lado bom de 2016? O grande avanço que o ano nos deixará como legado foi o aumento do accountability da democracia. A sociedade começou a monitorar e cobrar as ações dos três poderes como nunca antes. A tendência que observamos nesse ano foi de criar instituições de combate à corrupção e à ineficiência do setor público. Observa-se essa tendência em três direções:
A primeira é o aumento do accountability judicial. A operação lava jato começou a investigar, julgar e prender corruptos por todos os lados. A literatura de economia política tem apresentado evidências que esta é a forma mais eficiente para reduzir corrupção no país. O fim da impunidade cria incentivos apropriados para evitar mais corrupção no futuro.
A segunda é a pressão da sociedade. A lava-jato criou um ambiente que contaminou a população. A sociedade que se apresentava como uma criança que obedecia sem questionar apresenta-se hoje como um adolescente que questiona e se rebela contra as tentativas insistentes dos que querem manter os modos e costumes da corrupção. Com o uso crescente das redes sociais, acredito que esse processo não tem volta.
A terceira foi a aprovação da PEC que limita o crescimento dos gastos públicos. À medida que o estado tem um limite de gastos a corrupção encontrará menos espaço e o uso dos recursos públicos tende a ser mais eficiente.
Em outras palavras, o ano foi de avanços institucionais que tendem a ter efeitos significativos no médio-longo prazo. O medo da instabilidade institucional não deve impedir tais avanços. A democracia está se desenvolvendo e o accountability que presenciamos é sintoma evidente desse avanço. O ano de 2016 foi terrível em termos de desempenho econômico, mas foi decisivo para uma retomada sustentável de longo prazo. Em 2017 temos que consolidar esse avanço.
Vice-diretor da FGV/EESP e pós doutor em economia pela Harvard University