sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

"O imprescindível Modesto Carvalhosa", por Helio Bicudo

O Globo

Foi um acadêmico brilhante e, enquanto desenvolvia trajetória de professor e jurisconsulto de ilibada reputação nacional e internacional, nunca deixou de exercer cidadania


O ano de 2018 mal começa, e percebo que nossos cronistas políticos, reprisando 2017, curiosamente ainda não atinaram para um fenômeno raro, tanto aqui nesta Terra de Santa Cruz como alhures.

Refiro-me ao singular homem público e maior catedrático de Direito Comercial do Largo de São Francisco de sua geração, que é o professor Modesto Carvalhosa.


Nossos antigos laços de fraternal amizade não me impedem de enxergar os fatos da forma como se passaram em sua vida.

Acaso fosse preciso algum dia apresentar Modesto Carvalhosa, poderia dizer que começou a trabalhar aos 14 anos de idade, que foi um acadêmico brilhante e, enquanto desenvolvia trajetória de professor e jurisconsulto de ilibada reputação nacional e internacional, nunca deixou de exercer sua cidadania, mesmo se o inconformismo de autêntico democrata pudesse trazer-lhe, como trouxe, a injusta perseguição do regime militar, que o prendeu por três vezes.

Poderia, em seguida, citar inúmeros feitos públicos de Carvalhosa, desde o tombamento da Serra do Mar em toda a sua extensão, passando pela meticulosa apuração de ilícitos contra o Erário, cujos relatórios foram enfeixados no premiadíssimo “Livro negro da corrupção” e, mais tarde, o empolgariam a tornar-se um dos maiores tratadistas sobre o tema. Poderia então subscrever os rasgados elogios que sua imensa obra jurídica tem merecido de todos os nossos tribunais há quase seis décadas. Poderia ressaltar a importância de seu magistério para a evolução do mercado financeiro nacional. Poderia também fazer menção à equanimidade com que se houve na presidência do Tribunal de Ética da OAB, assim como ao brilho de sua inteligência no período em que passou pelo Conselho da República.

Ora, tantas e tão grandiosas são as suas realizações, que um simples artigo pecaria por absoluta insuficiência.

Por isso, hoje, detendo-me sobre a ainda aflitiva hora presente, antes acho de meu dever louvar os serviços patrióticos de Carvalhosa, prestados apenas em 2017:

1 — Manifesto à nação pela convocação de uma Assembleia Constituinte, texto escrito em conjunto com Flavio Bierrenbach e José Carlos Dias, propondo que o Brasil se atualize e aceite um necessário reencontro com a realidade através de nova Constituição;

2 — Defesa do performance bond como efetivo instrumento de combate à corrupção;

3 — Oferecimento de seu próprio nome e de uma agenda ética ao país para a hipótese de eleição indireta, se Temer perdesse o mandato a partir de audiência clandestina a um dos donos da JBS;

4 — Ação Direta de Inconstitucionalidade contra o aberrante fundo partidário de R$ 2 bilhões;

5 — Ação pedindo o fechamento de PT, PMDB, PP, PSD, PDT, PCdoB, PR, PRB e PROS, todos por corrupção;

6 — Ação pelo voto impresso como forma de impedir que as urnas eletrônicas sejam fraudadas.

A sétima batalha que Carvalhosa tem empreendido é, entretanto, a mais decisiva de todas, qual seja, a luta pelo reconhecimento de um direito constitucional que o STF, tendo juízo, não poderá tolher, que é o direito de votar e ser votado independentemente de filiação partidária, e já em 2018, até porque — insisto em acreditar — existimos e devemos existir, como cidadãos livres, antes, apesar e para além de partidos, razão pela qual essa, repito, é a mais decisiva bandeira que Carvalhosa tem corajosamente arvorado.

Tudo isso, caro leitor, para concluir que o Brasil pode muito mais do que pensa poder quando tem ao seu dispor um homem que já se tornou uma verdadeira instituição.