Evaristo Sá - 9.jun.2017/AFP | |
O ministro do STF Gilmar Mendes, que teve pedido de suspeição pelo procurador-geral Rodrigo Janot |
LETÍCIA CASADO - Folha de São Paulo
"Não falo sobre isso. Em relação a esse rapaz, não falo", disse o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Marco Aurélio Mello, quando questionado sobre a situação de Gilmar Mendes.
A presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, pediu nesta segunda-feira (28) que o colega Gilmar se manifeste sobre pedido de impedimento e de suspeição em casos envolvendo Jacob Barata Filho, um dos maiores empresários do setor de transporte coletivo no Rio.
Já o ministro Alexandre de Moraes afirmou que a determinação de Cármen Lúcia para que Gilmar se manifeste é "normal". "Esse procedimento é normal, a presidente dá [a possibilidade de se manifestar] em todos os casos. No meu caso, alegaram dois impedimentos. Ela ouve e depois decide."
Gilmar Mendes concedeu habeas corpus e decretou medidas alternativas à prisão a Barata Filho e a outros oito investigados na Operação Ponto Final, que apura esquema de corrupção envolvendo o ex-governador Sérgio Cabral (PMDB).
O ministro está em viagem e deve retornar ao Brasil em 7 de setembro. Só então ele vai responder ao pedido de informações.
Caso Gilmar não se considere impedido, ele continua como relator dos casos até que o impedimento seja eventualmente julgado no Supremo. Ele já disse publicamente que não se considera suspeito.
Não há prazo para que o ministro manifeste sua posição. Em outro pedido de impedimento feito pela PGR (Procuradoria-Geral da República), relativo a casos envolvendo o empresário Eike Batista, Gilmar se manifestou contra a sua suspeição. O pedido aguarda decisão de Cármen Lúcia.
Se considerar algum desses pedidos improcedentes, Cármen Lúcia pode mandar arquivar o procedimento.
A Folha apurou que a ministra está estudando o caso e não descarta dar prosseguimento ao pedido. Nos bastidores, Cármen Lúcia tem ouvido colegas do tribunal reclamarem da postura de Gilmar Mendes de entrar em embates públicos com o procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
Ela também tem conversado com o próprio Gilmar ao longo dos últimos meses sobre as polêmicas em que o ministro se envolve, disse uma pessoa a par do assunto.
Se admitir o pedido, a presidente tem de ouvir o ministro e as testemunhas indicadas, "submetendo o incidente ao tribunal em sessão secreta", informa o regimento interno do Supremo.
Caso a suspeição seja aceita –por Gilmar ou pelos colegas do tribunal–, os atos do ministro relativos ao evento serão considerados nulos.
O tribunal nunca julgou pedido de impedimento ou de suspeição de ministro.
Por meio de nota, a assessoria de Gilmar Mendes disse que "as regras de impedimento e suspeição às quais os magistrados estão submetidos estão previstas no artigo 252 do CPP, cujos requisitos não estão preenchidos no caso".
Janot pediu o impedimento, a suspeição e a incompatibilidade do ministro Gilmar em casos envolvendo Barata Filho. O impedimento é analisado com base em caso concreto e definido por regras; a suspeição tem caráter subjetivo, e, portanto, diferentes fatores poderiam levar à alegação de suspeição de um ministro.
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Gilmar Mendes no casamento da filha de Jacob Barata, em 2013 |
SUSPEIÇÃO
Em agosto, Gilmar concedeu habeas corpus a Jacob Barata Filho. Pouco depois, o juiz federal Marcelo Bretas determinou nova prisão preventiva contra o empresário. Depois, o ministro deu nova decisão e soltou Barata Filho. Depois, o ministro estendeu os benefícios a outros oito investigados na Ponto Final.
Segundo a Procuradoria, Gilmar foi padrinho de casamento da filha do empresário, Beatriz Barata, em 2013. Gilmar nega e afirma que apenas acompanhou sua mulher, Guiomar Mendes, no evento –o noivo, Francisco Feitosa Filho, é sobrinho dela.
O Ministério Público Federal também aponta vínculos na relação de sociedade entre Barata Filho e o cunhado do ministro.
"Conforme apuração do Ministério Público Federal, Jacob Barata Filho integra os quadros da sociedade Autoviação Metropolitana Ltda, ao lado, entre outros sócios, da FF Agropecuária e Empreendimentos S/A, administrada por Francisco Feitosa de Albuquerque Lima, cunhado do ministro Gilmar Mendes", informa a PGR (Procuradoria-Geral da República).
Além disso, Guiomar Mendes trabalha no escritório de advocacia Sergio Bermudes, ligado a alguns dos investigados.
"Nas cautelares penais, foram decretadas constrições em prejuízo de pessoas jurídicas diretamente relacionadas a Jacob Barata Filho e Lélis Teixeira, que foram processualmente representadas pelo escritório de Sérgio Bermudes: Fetranspor, Riopar, Alpha Participações e Guanabara Participações e Empreendimentos Imobiliários", aponta a PGR.
Para Janot, a isenção e a imparcialidade de Gilmar ficam comprometidas por causa dessas relações.
A operação apura pagamento de R$ 260 milhões em propina entre 2010 e 2016 de empresários a políticos e funcionários de departamentos públicos de fiscalização ligados ao setor de transportes.
O ex-governador Sérgio Cabral obteve R$ 122 milhões no esquema, segundo a investigação.