quinta-feira, 13 de novembro de 2025

Venezuela perde em 9 anos o equivalente a quase toda população de Israel

Opositora María Corina Machado diz que se o governo descobrir onde ela está vai fazê-la desaparecer


Maria Corina Machado venceu o Nobel da Paz | Foto: Reprodução/Wikimedia Commons


Perto de 9 milhões de venezuelanos deixaram o país desde 2015, segundo estimativas da Organização das Nações Unidas (ONU). O número equivale a quase toda a população de Israel, de 9,8 milhões de habitantes. 

Esse êxodo tem como causa o contexto político e social, que, além de gerar crise econômica, persegue opositores como María Corina Machado. Impedida de disputar as eleições pela ditadura e estabelecida em local desconhecido, ela tenta coordenar à distância o movimento de oposição.

“Venezuela será o aliado mais próximo de Israel na América Latina”, afirmou ela, segundo o Israel Hayom, em referência à política externa que pretende adotar em um eventual governo de transição.

 Desde 2009, quando o antecessor Hugo Chávez (1954-2013) rompeu relações diplomáticas com Israel e se aproximou do Irã, a Venezuela se afastou do eixo ocidental. 

María Corina diz que esse alinhamento trouxe consequências duradouras para a economia e para a segurança nacional. “O povo venezuelano não compartilha esse ódio.” 

Há mais de um ano, María Corina vive sob restrições e acusações de terrorismo e conspiração. Disse que o governo tenta “apagar” sua presença pública, impedindo deslocamentos e censurando comunicações. 

Ela diz que está em completo isolamento há 15 meses. “O regime inventou acusações ridículas de terrorismo contra mim”, afirma. “Se me encontrarem, vão me fazer desaparecer, esse é o melhor cenário. Como milhares de outros venezuelanos, sou forçada a me esconder.”

Segundo ela, mais de 900 presos políticos estão trancados em prisões, e milhares de outros foram obrigados a fugir nos últimos meses. 

“Mas, graças à tecnologia, mesmo no isolamento, comunico-me todos os dias com milhares de venezuelanos ao redor do mundo”, observa. 

“Não estou sozinha. Trabalho dia e noite. Tenho certeza de que um dia poderei andar novamente pelas ruas do meu país e abraçar meus filhos e milhões de filhos e filhas da Venezuela.” Apesar de tudo, ela vê enfraquecimento da ditadura Maduro.

“O regime pode controlar as armas, mas não controla a consciência das pessoas”, diz a vencedora do Nobel da Paz de 2025.

 “A transição já começou. O que falta é reconhecê-la oficialmente.” A liderança dela cresceu depois de o Conselho Nacional Eleitoral barrar sua candidatura e validar a de Edmundo González Urrutia, exembaixador apoiado por ela, nas eleições de julho de 2024. O governo anunciou nova vitória de Nicolás Maduro, mas observadores independentes revelaram falhas e inconsistências no processo de apuração. 

Para ela, a disputa eleitoral serviu apenas para revelar a perda de legitimidade do regime.

“O medo mudou de lado.” A líder da coalizão Vente Venezuela afirma que o governo mantém controle institucional, mas perdeu apoio social. “O regime não representa mais a maioria dos venezuelanos.”

“Em diversas cidades, comitês locais organizam reuniões e transmissões virtuais para divulgar informações sobre o processo eleitoral e coordenar manifestações pacíficas.

” Com a repressão interna e o fechamento de espaços públicos, a oposição opera de forma descentralizada. Dirigentes atuam em rotatividade e utilizam canais criptografados. Parte da estrutura funciona a partir do exílio. “Nenhuma prisão ou censura interrompem o trabalho que está sendo feito.”

 O contexto econômico e geopolítico permanece instável. As sanções impostas pelos Estados Unidos (EUA) continuam em vigor, e o governo venezuelano reforçou acordos com Rússia, China e Irã. 

Para María Corina, essa dependência externa agravou a crise e enfraqueceu a capacidade produtiva do país. Ela defende reaproximação com instituições ocidentais e restabelecimento de relações diplomáticas suspensas. 

Protestos depois das eleições na Venezuela 

Nos meses seguintes às eleições, ocorreram protestos em várias regiões. As forças de segurança reagiram, com detenções e repressão. Organizações civis registraram mortos e desaparecidos. 

Sem acesso à imprensa oficial, María Corina tem recorrido a comunicados digitais e transmissões remotas. “O que está em curso não é uma disputa eleitoral, é o colapso de um sistema que perdeu legitimidade.”

Ela diz manter diálogo com militares afastados e funcionários civis que deixaram o governo. Afirma que há divisões internas e perda de comando. “Há pessoas dentro do regime que sabem que isso terminou. A transição não depende de um decreto, mas de uma realidade que já mudou.”

María Corina vê o colapso também como moral e econômico. “A Venezuela deixou de produzir, de exportar e de acreditar em suas próprias regras.” Ela propõe reconstrução gradual, com estabilidade jurídica, investimento externo e descentralização administrativa. O objetivo imediato seria restabelecer segurança, energia e abastecimento, condições mínimas para o retorno de parte dos emigrados. 

O movimento migratório modificou a paisagem social da América do Sul. Venezuelanos formaram comunidades em cidades fronteiriças e redes de trabalho temporário em países vizinhos. Machado diz que recebe mensagens de quem quer voltar. “Eles não saíram por opção. Querem regressar, mas precisam de garantias.” 

Grupos civis, formados por estudantes, médicos e professores, assumem papel crescente na organização comunitária, segundo María Corina. “São eles que seguram o país quando o governo falha.”



Eugênio Goussinsk - Diário do Poder