Criadores de conteúdo estão atraindo o interesse de grandes empresas de capital de risco; dinheiro de verdade está sendo investido em ferramentas digitais, não nas personalidades da internet
Ao focar nos influenciadores, o TikTok impôs mudanças nas redes sociais tradicionais
Geralmente jovens e nativos digitais, os criadores de conteúdo são pessoas que conquistam público na internet e encontram uma maneira de ganhar dinheiro com essa audiência. A atividade aos poucos virou profissão, e os grandes investidores do Vale do Silício cada vez mais veem os influenciadores como a próxima fonte financeira a ser explorada na internet.
A chamada economia do criador, que oferece ferramentas digitais para influenciadores e os ajuda a administrar seus negócios, é um mercado enorme e pouco explorado. A empresa de capital de risco SignalFire estima que 50 milhões de pessoas no mundo se consideram criadores de conteúdo, enquanto o site de notícias de tecnologia The Information calcula que as empresas de capital de risco investiram US$ 2 bilhões em 50 startups focadas em criadores de conteúdo até agora.
Em meados de julho do ano passado, Tucker Schreiber, 28, cofundador de uma startup chamada Combo, sentiu esse movimento. A empresa trabalhava no desenvolvimento de uma plataforma de edição de vídeo, e Schreiber percebeu que estavam chegando mais e-mails em sua caixa de entrada. Embora sua empresa não tivesse funcionários ou produtos, e nem tivesse dito que estava precisando de dinheiro, investidores estavam enviando uma enxurrada de mensagens. “Comecei a receber de cinco a dez e-mails por dia, durante várias semanas, diretamente de investidores”, disse.
O crescimento da economia do criador mostra uma renovação no interesse pelas redes sociais entre os investidores de risco, que durante anos pensaram não haver sentido em procurar novas apostas frente ao sucesso de plataformas como o Facebook e a Snap, que dominaram completamente o mercado.
O interesse pode oferecer legitimidade ao que alguns ainda pensam ser um negócio marginal. Isso também pode contribuir para a noção de que este mundo crescente de dancinhas, bate-papo e comédia é mais do que uma cultura jovem efêmera.
Apostas
Mas, como diz o ditado, em vez de dar o peixe, é melhor dar instrumentos para pescar. O Vale do Silício parece muito mais interessado nas ferramentas e plataformas digitais usadas pelos criadores de conteúdo do que em investir diretamente neles.
No mês passado, por exemplo, a empresa de capital de risco Founders Fund liderou uma rodada de investimentos de US$ 15 milhões na Pietra, uma startup que tem como objetivo ajudar influenciadores a lançar linhas de produtos. Em abril, a Seven Seven Six, uma empresa de capital de risco dirigida por Alexis Ohanian, cofundador do Reddit, e a Bessemer Venture Partners, anunciaram um investimento de US$ 16 milhões na PearPop, uma plataforma que ajuda os criadores a monetizar suas colaborações e interações nas redes sociais.
A lista é longa. Em fevereiro, a conhecida empresa de capital de risco Andreessen Horowitz liderou um investimento na Stir, uma plataforma que auxilia os criadores a gerenciar como eles ganham dinheiro – o aporte fez a empresa chegar ao valor de mercado de US$ 100 milhões.
O Dispo, um aplicativo de compartilhamento de fotos que imita a experiência de câmeras digitais, recebeu US$ 4 milhões em uma rodada de financiamento liderada pela Seven Seven Six e uma rodada de investimento adicional de US$ 20 milhões liderada pela Spark Capital. O Benchmark liderou uma rodada de investimentos, de acordo com relatos, no valor de US$ 20 milhões para o Poparazzi, um aplicativo que permite aos amigos dos usuários postar fotos em seus perfis, transformando essas pessoas, na prática, em seus "paparazzi".
E, em seguida, temos o Clubhouse, o peso-pesado desse mercado jovem, dando muito o que falar no Vale do Silício, na imprensa e no mundo do entretenimento. A rede social é construída em torno de salas de bate-papo apenas de áudio. Em abril, a plataforma arrecadou US$ 200 milhões em uma rodada de financiamento liderada pela Andreessen Horowitz, levando sua avaliação para cerca de US$ 4 bilhões.
“Quando comecei no capital de risco em 2016, havia essa crença disseminada de que seria muito difícil outra grande rede social surgir”, disse Li Jin, fundador da Atelier, empresa de capital de risco focada no mundo dos criadores da internet.
O TikTok derrubou completamente essa crença. Ao focar nos influenciadores, o aplicativo impôs mudanças nas redes sociais tradicionais, como Instagram e Twitter, que se esquivavam de atender as necessidades das pessoas que estavam criando conteúdo popular em suas plataformas.
O TikTok permitiu que personalidades talentosas das redes sociais fossem descobertas mais facilmente e deu a elas um caminho mais direto para ganhar dinheiro por meio do Fundo para Criadores, que paga uma determinada quantia a criadores com base no número de visualizações.
“As plataformas de redes sociais mais antigas envolviam mais interações entre amigos na internet”, disse Linus Walton, vice-presidente do Chernin Group, empresa de consultoria de investimentos focados no setor de criadores. Agora “é tudo para se tornar aquele influenciador ou a nova estrela do TikTok que todos os seus amigos estão assistindo.”
Serviços de assinatura como OnlyFans e Patreon, nos quais os fãs pagam aos criadores pelo acesso ao conteúdo premium, também ajudaram os investidores a perceber que existia um grande espaço para o negócio de criar ferramentas para criadores. Agora a palavra “criador” se transformou em um termo da moda e é anexado a todos os tipos de negócios para atrair investidores.
“Existem mais startups do que criadores na economia do criador”, brincou no Twitter, em abril, Turner Novak, fundador da Banana Capital, que investe em startups de tecnologia em estágio inicial.
Rex Woodbury, 27 anos, diretor da empresa de investimentos Index Ventures, em São Francisco, representa um pouco dos dois mundos. Ele começou como um influenciador, construindo uma audiência de mais de 237 mil seguidores no Instagram com suas postagens sobre estilo de vida. Depois de se formar na faculdade, ele se dedicou em tempo integral aos investimentos, onde conquistou um nicho como autoridade na economia do criador.
Ele entrou na Index Ventures em dezembro, justo quando os investidores de risco estavam começando a ficar interessados nos criadores e procuravam a ajuda de pessoas que entendiam o cenário. “Muitos jovens investidores têm confiança nisso porque somos nativos digitais”, disse Woodbury. “Este é o mundo no qual crescemos.”
Atualmente, grandes plataformas como Spotify, Twitter e Facebook estão correndo para alcançar as startups, especialmente o Clubhouse. O Spotify anunciou recentemente seu novo aplicativo para conversas de áudio ao vivo, o Greenroom, um concorrente do Clubhouse que o Spotify desenvolveu após adquirir a startup de bate-papos por áudio Locker Room. O Twitter já adicionou à sua plataforma sua aposta para concorrer com o Clubhouse, o Espaços. E tanto o Twitter quanto o Facebook estão se lançando nos serviços de newsletter para competir com o sucesso do Substack, que permite aos usuários configurar facilmente assinaturas para o que eles escrevem.
Entretanto, embora os investidores estejam correndo para colocar seu dinheiro em startups voltadas para as redes sociais, não é tão óbvio se alguns dos aplicativos no mercado irão durar. O Dispo enfrentou uma reação negativa em março após um de seus cofundadores, a estrela do YouTube David Dobrik, ser envolvido em uma polêmica por acusações de abuso sexual contra uma integrante do “Vlog Squad", grupo de pessoas que participavam dos vídeos produzidos por ele. Logo em seguida, a Spark Capital disse que cortou todos os laços com a empresa. Já a Seven Seven Six não rompeu os laços, mas disse que doaria os lucros a uma organização que trabalha com vítimas de abusos sexuais. / TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA
Por Taylor Lorenz e Erin Woo - The New York Times