sexta-feira, 20 de abril de 2018

"Senhores do vento", por Claudio Sales e Alexandre Uhlig

O Globo

Exploração da energia eólica não exige compensação financeira



A voracidade arrecadatória dos políticos acaba de ultrapassar os maiores absurdos já registrados em Brasília, terra que parece viver em realidade diferente da que vivemos no resto do Brasil.

Num ramo que já sofre com uma carga de tributos e encargos equivalente a 51% da receita bruta operacional das empresas do setor elétrico, tramita na Câmara dos Deputados a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 97 de 2015, de autoria do deputado federal Heráclito Fortes (PSB-PI), que prevê a participação no resultado ou compensação financeira (royalties) pela exploração de recursos eólicos aos estados, Distrito Federal, municípios e órgãos da administração direta da União.

Essa iniciativa parlamentar não deixa dúvidas: a motivação de alguns legisladores não é criar um ambiente previsível para quem investe no país e para quem depende de eletricidade para sua produção ou consumo final. A motivação é inventar as piores formas para aumentar a arrecadação que financia a ineficiência do Estado.

Os congressistas que se animaram com a ideia acima precisam saber que a origem da cobrança dos royalties estava ligada à intenção de prover alguma compensação para a extração de recursos naturais finitos nas terras “pertencentes ao rei”, tais como madeira, água e recursos minerais. A palavra royalty deriva de royal, ou “aquilo que pertence ao rei”.

Na atualidade, royalty é o termo que designa o valor pago ao detentor de recurso natural finito, produto, marca, patente de produto, processo de produção, ou obra original, pelos direitos de exploração, uso, distribuição ou comercialização do referido produto ou tecnologia. Este definitivamente não é o caso dos ventos, que não têm nada de “finitos”.

A exploração da energia eólica tampouco remete à necessidade de compensação financeira, modelo usado para energia hidráulica. No caso de usinas hidrelétricas — embora não conste da lei que criou a Compensação Financeira pelo Uso de Recurso Hídrico (CFURH) —, a motivação foi compensar a perda de renda gerada pela área inundada com a formação dos reservatórios. Portanto, o objetivo da lei que criou a CFURH foi compensar estados e municípios pelos tributos que deixaram de ser arrecadados pela exploração econômica da área que foi inutilizada. Este também não é o caso da energia eólica: as instalações eólicas não inviabilizam o uso da área onde elas são instaladas.

Se não bastassem os argumentos puramente racionais acima — o uso dos ventos não exige pagamento ou “compensação” a quem quer que seja —, não existe registro de cobrança de royalties por geração eólica em nenhuma parte do planeta.

Permitiremos que nossos políticos criem mais uma das nossas “jabuticabas”, que só geram ineficiência para o setor elétrico e para a economia do país? Uma ineficiência que passará a ser paga de forma permanente pelos consumidores de energia elétrica?

Claudio Sales e Alexandre Uhlig são presidente e diretor do Instituto Acende Brasil