terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

De porteiro de cursinho a dono de grupo multinacional de educação: a história de Chaim Zaher

Na quinta-feira, 12, Chaim Zaher recebeu a imprensa na entrada do auditório de um hotel em São Paulo para dar detalhes da compra de 70% da rede de escolas bilíngues canadense Maple Bear pelo Grupo SEB, que fundou e preside. Ao lado da filha Thamila, diretora-executiva do grupo, Zaher poderia estar numa posição que lembrava um pouco suas origens. Nascido no Líbano, ele começou na área como porteiro do cursinho Brasília, em Araçatuba, há mais de 50 anos. Na semana passada, porém, ele estava à frente de um dos maiores grupos de educação do Brasil que, a partir da aquisição da Maple Bear, estendia seu alcance a 20 países, entre eles, México, Marrocos, Bulgária e China.
O presidente e fundador do grupo SEB, Chaim Zaher. Foto: Divulgação

Números não foram o forte da divulgação da compra. Segundo Zaher, Rodney Riggs, o fundador da Maple Bear, pediu segredo quanto ao montante. “Sei que vocês gostam de valores, eu gosto também”, disse ele. “Mas é coisa de canadense.” Ao que Riggs respondeu: “Bom, o que posso dizer? Obrigada.” Ao ser questionado sobre números do SEB, Zaher passou a palavra para Thamila, que discorreu sobre a estratégia da companhia. “Essa é a mãe dos meus netos”, brincou.
Em resumo, o SEB tem 44 escolas no Brasil que, juntas, somam 45 mil alunos. A empresa também possui marcas como a Escola Paulista de Direito (EPD), em São Paulo, o Centro Universitário UniDomBosco, em Curitiba (PR). A companhia estima faturamento acima de R$ 1 bilhão para 2019, excluindo as receitas das franquias latino-americanas da Maple Bear, que Zaher adquiriu por R$ 160 milhões em 2017.
Superação. Nascido no Líbano, Chaim Zaher veio para o Brasil ainda criança com a família e trabalhou como mascate com o pai. Aos 18 anos, começou como porteiro, mas foi escalando a carreira no cursinho Brasília. Se tornou bedel e vendedor. Ao perceber o crescimento da concorrência na cidade com a chegada de grandes empresas do ramo, Chaim sugeriu uma parceria ao patrão. Foi demitido. Decidiu então procurar um grupo rival, com quem firmou uma parceria e criou o Convequipe de Araçatuba. Em 1976, lançou o Thathi Araçatuba.
Foi quando decidiu se aliar ao grupo Objetivo, que já era o maior do País. Após várias tentativas frustradas de reunião com João Carlos Di Gênio, dono da Unip e do Objetivo, Zaher resolveu o problema de maneira simples: dormiu no banheiro da escola para conseguir contato com um professor próximo de Di Gênio. Conseguiu a parceria e assumiu a administração de várias franquias do Objetivo no interior de São Paulo e, em 1984, se tornou sócio de Di Gênio. Em 1986, o empresário comprou o COC Ribeirão Preto e, no ano seguinte, lançou o Sistema de Ensino COC. Durante os anos, as aquisições continuaram e o grupo se expandiu para estados como Alagoas, Espírito Santo, Salvador e Minas Gerais.
O tamanho do grupo de Zaher foi percebido em julho de 2010, quando ele vendeu as marcas COC, Dom Bosco, Pueri Domus e Name para a britânica Pearson por R$ 600 milhões. Em outubro de 2007, havia aberto do capital da empresa, quando captou R$ 400 milhões. Com a venda, que incluiu a editora, o material didático e o sistema de marcas, o capital da empresa foi fechado. Em meio aos boatos sobre o futuro, Zaher reuniu os funcionários e começou seu discurso afirmando que estaria “Back to game”.
O dinheiro foi utilizado em novas aquisições e, em 2013, o braço de ensino superior do grupo foi vendido à Estácio. A empresa voltou-se, então, à educação básica. Três anos depois, foram lançados a Escola Concept e Conexia, hub de soluções educacionais. O projeto seguiu com a reaquisição do Pueri Domus em 2017, entre outros negócios.
Em 2013, analistas apontavam uma onda de fusões e aquisições no ensino básico. Zaher, com os R$ 615 milhões levantados com venda da instituição de ensino superior Uniseb, fundada por ele, para a Estácio, avançou na tendência. “Quero fazer na educação básica, o que já aconteceu no ensino superior, e estou bem perto disso”, afirmou. À época, o empresário disse ao Estadão/Broadcast que tinha interesse em uma rede de escolas bilíngues própria, o que foi concretizado anos depois.
No mesmo ano, Zaher teve seu nome envolvido em uma suspeita de corrupção envolvendo Gabriel Chalita, então secretário de Educação do governo Geraldo Alckmin (PSDB). Zaher supostamente teria pagado uma reforma do apartamento de Chalita, em troca de vantagens. O empresário sempre negou as acusações. Anos depois, o Tribunal de Justiça de São Paulo arquivou a ação cível, enquanto o Supremo Tribunal Federal (STF) arquivou a investigação criminal por falta de provas.
A abertura de capital volta e meia retorna à pauta da empresa. No início de 2017, Zaher afirmou que esperava janela para uma nova abertura de capital. Já em janeiro de 2018, ele se encontrou com executivos do Morgan Stanley para discutir uma oferta inicial. “Não tenho necessidade de capital. Só vou abrir capital se sentir que existe chance de expandir meu grupo”, afirmou à época. O discurso foi reforçado por Thamila no evento desta quinta-feira: embora não descartem a abertura de capital, a diretora executiva reiterou que o grupo está “altamente capitalizado e com baixo endividamento”.
Mesmo sem ter capital aberto, o SEB incomoda a concorrência da área que disputa investidores em Bolsa. Para o BTG Pactual, a aquisição da Maple Bear representa uma “oportunidade excepcional de crescimento” para a companhia brasileira. O analista Samuel Alves disse que o SEB é a “primeira empresa brasileira relevante a assumir o risco” da internacionalização de suas atividades.
Segundo Alves, o SEB já era o maior franqueado da Maple Bear no mundo devido às operações na América Latina e que dobrou as operações da marca no Brasil. “Uma das principais vantagens competitivas das escolas particulares de ensino fundamental e médio é a percepção de alta qualidade, o que leva a custos de troca mais altos, enquanto a elasticidade dos preços diminui”, afirma o analista.
O relatório falou  ainda os planos de Zaher, de expandir “agressivamente” em escala global, destacando mercados emergentes como a Índia como locais potenciais. Nada mal para quem começou em uma portaria de cursinho.

Ana Luiza de Carvalho, O Estado de São Paulo