quinta-feira, 26 de junho de 2014
"Com vocês, a corrupção digital", por Marcelo S. Tognozzi
O repórter Nick Bilton, do The New York Times, decidiu ir às compras. Com menos de US$ 10 comprou 4 mil amigos para incrementar sua conta do Twitter e outros 4 mil para rechear seu Facebook. Nick também descobriu ser possível ter 1 milhão de amigos no Instagram por “meros” US$ 3.700 e que com mais US$ 40 obteria milhares de curtidas nas suas fotos do pôr do sol.
Nick Bilton prestou um serviço ao destampar o bueiro de imundices e jogar luz no esgoto que corre por baixo das redes sociais (a imprensa em geral deveria se dedicar mais a este assunto). Descobriu que amigos e influência estão à venda e o preço varia de acordo com o tamanho da ambição e/ou da armação do freguês. Os amigos “comprados” pelo repórter do NYT vivem quase todos fora dos Estados Unidos. Uns habitam lugares como a Rússia, outros Bangladesh, Índia, países árabes ou Romênia. E, pior, não são humanos. São bots (ou robôs, bot vem de robot) programados para agir e reagir como se gente fossem, postando durante o dia e saindo de cena à noite para "dormir", curtindo e soltando frases de efeito. Usam nomes como Jen934107 e são chamados de social bots.
É claro que os social bots se tornam eleitores. Aqui no Brasil estão a mil na situação e oposição. No último pleito do México, por exemplo, o PRI foi acusado de usar milhares de bots para disseminar mensagens no Twitter e no Facebook denegrindo adversários. Na Síria, foram usados para ameaçar apoiadores dos protestos contra o governo de Assad e na Turquia uma investigação apurou que todos os partidos políticos tinham seu exército de bots. Um dos mais populares programas para criar e controlar hordas de bots é o Zeus, vendido por US$ 700.
Este submundo das redes sociais vem engordando e subvertendo redes de governos, empresas, artistas, políticos, celebridades, jogadores de futebol, times, produzindo a ilusão de que são populares, têm prestígio e influência. Tudo o que representa controle, poder e dinheiro. Geram bilhões para uma máfia digital sem limites. Produzir ou gerenciar bots não é ilegal. Mas o uso que se faz deles quase sempre é.
Estamos diante de uma nova modalidade de corrupção, meio legal, meio ilegal, capaz de enganar nações inteiras. Diante disso, o que nos faz crer que o post a fovor desta ou daquela bela proposta foi escrito por alguém de carne e osso com ideologia, convicção? Até onde chegarão as batalhas eleitorais, como a que teremos logo após a Copa e que já se anuncia bruta?
Está em jogo a credibilidade das redes sociais como ferramenta de liberdade de expressão dos seres humanos. Será este o início da decadência da social media? Crer ou não crer? Occupy Wall Street, Indignados, Jornadas de Junho foram movimentos espontâneos, com pessoas por trás dos posts.
Como seria se estes movimentos estivessem contaminados por bots? E se eles não estiveram imunes? Isso não é uma mera hipótese, mas dura realidade: dois alunos do Instituto de Tecnologia de Israel desenvolveram bots capazes de imitar celulares Android no Wase. Falsos humanos, com falsos celulares dirigindo carros falsos, mas tudo como se fosse verdade. Daí ao Viber, WhatsApp ou o Fousquare é um nada. Para o bem ou para o mal, alguma coisa começará a mudar nas relações entre as pessoas e as redes sociais.
Quem quiser pode ler a a reportagem de Bilton na íntegra: http://bits.blogs.nytimes.com/2014/04/20/friends-and-influence-for-sale-online/?_php=true&_type=blogs&_php=true&_type=blogs&_r=1&