terça-feira, 31 de julho de 2018

Campeão com o Real Madrid em 60, Canário aconselha Vinicius Jr. na estreia



Vinícius Júnior na apresentação ao Real Madrid - Reprodução


Brasileiro formou um dos grandes ataques da história do Real Madrid: Canário, Del Sol, Di Stéfano, Puskás e Gento. Rivalizava com Garrincha, Didi, Quarentinha, Amarildo e Zagalo. Ou Dorval, Mengálvio, Coutinho, Pelé Pepe.

Sexto filho de oito irmãos de uma família modesta de Realengo, Darcy Silveira dos Santos já tinha 23 anos e um casal de filhos, quando sua mulher, Nilza, foi buscá-lo no treino do América. Ela tinha pressa: um representante de um clube espanhol tinha visitado sua casa e, em 48 horas, sua vida mudaria. Era o ano de 1959.

- Naquele fim de semana, meu técnico, o Martim Francisco, me tirou do jogo contra o Botafogo. Ele me disse: "Você vai para o Real Madrid, não posso me arriscar a ver você se machucar - relembra Canário, o ponta que se tornou o primeiro brasileiro a ganhar uma Copa dos Campeões com o clube espanhol. - Tive 48 horas para arrumar tudo.


A viagem de Canário foi bem diferente da de Vinicius Júnior, que deve estrear pelo Real nesta terça, às 21h, contra o Manchester United – a Fox Sports transmite o amistoso. O SuperConstellation que o levou do Rio não tinha autonomia de voo para chegar até Madri. 

Perdeu um dia em Dacar, no Senegal, antes de chegar à capital espanhola, para onde sua família chegaria pouco mais de um mês depois, quando a caçula, recém-nascida, completaria os dois meses que os médicos recomendavam para viajar.

Aos 84 anos, o filho de sapateiro, nascido em Marechal Hermes, se lembra de ir levar os calçados fabricados pelo pai na rua Uruguaiana, a fim de buscar o ordenado. Seu sonho era ser piloto de corridas, à época. Hoje, mora confortavelmente em Zaragoza, onde foi ídolo do clube local depois de ser dispensado na gestão do presidente Raimundo Saporta. Lúcido e plenamente recuperado de um infarto que sofreu há pouco mais de dois anos, ele ainda mantém laços com o Real Madrid. Faz parte da Associação de Ex-Jogadores do clube, que se reúne uma vez por ano para um evento na capital.



Darcy Canário, ex-jogador do Real Madrid - Reprodução


Ponta-direita legítimo, Canário chegou ao bairro de Chamartín dois meses depois do meia Didi, a quem conhecia dos gramados cariocas.

- Me dá pena que o Didi não tenha se adaptado à Espanha. certa vez, no Santiago Bernabéu, estava nevando muito. Assim que terminou o primeiro tempo, o Didi correu para o vestiário e enfiou as mãos embaixo de uma torneira de água quente. O médico do clube gritou: Nunca mais faça isso!, e nos recomendou uma vaselina. Quando ele tirou as chuteiras, os pés estavam branquinhos, branquinhos de frio, que era muito forte.

Naquele mesmo ano, num ataque com Di Stéfano, o húngaro Puskás e os espanhóis Gento e Del Sol, o Real Madrid conquistou a antecessora da Champions League numa vitória por 7 a 3 sobre o Eintracht Frankurt, em Glasgow. De fala rápida e memórias vivas, Canário emprega expressões da língua espanhola e, muitas vezes, nem percebe que está falando espanhol. Adaptado à Espanha desde os anos 1960, ele não vem ao Brasil há dez anos, desde que Nilza enfrentou algumas enfermidades. Por isso, admite não conhecer o futebol de Vinicius Júnior. Há dois anos, um sobrinho, flamenguista "à morte", lhe disse que havia um menino do Flamengo que se tornaria uma "figura" do Real Madrid. Seu conselho ao adolescente é simples.

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Márvio dos Anjos, O Globo