domingo, 10 de junho de 2018

"É tudo fake", por Mary Zaidan

Mentir em campanhas – e fora delas – é algo habitual no mundo político. Notícias falsas sempre existiram, só não eram difundidas com velocidade tão galopante quanto à patrocinada pelas redes sociais e muito menos tratadas como “fake”, palavrinha inglesa que conferiu certo charme à profusão de invencionices.
Mas tão grave quanto divulgar falsidades sobre o adversário é a prática de ludibrio ao eleitor, popularíssima entre nós. Mente-se descaradamente, sem qualquer pudor.
E contra isso não há salvaguarda. Do Tribunal Superior Eleitoral, que promete combate feroz contra as fake news, jamais se viu qualquer posicionamento sobre os sucessivos estelionatos eleitorais do passado e dos que já se anunciam por aí.
Revisitar discursos de campanha e de posse são úteis para ilustrar o descaso com o tal do povo que todos juram defender. Imperam generalidades, frases de efeito (não raro duvidoso) e convocações a lutas ficcionais que candidato algum vai travar. Pouco do que se diz é verdade e possível de ser feito. E quase nada vai além do dizer.
Alguns exemplos são didáticos. Fernando Collor se elegeu como caçador de marajás e era um califa entre eles. No final de seu primeiro mandato, Fernando Henrique Cardoso começou a entregar exatamente o oposto do que prometia para, assim, garantir sua reeleição. Luiz Inácio Lula da Silva foi ainda mais hábil: com discurso anti-elite assegurou seu lugar no banquete dos milionários. Lambuzou-se das delícias do poder, conseguiu se safar do mensalão, e, à la Al Capone, só acabou na cadeia por um crime menor.
Sua afilhada e sucessora Dilma Rousseff quase o venceu no quesito engodo. Em seu governo, enquanto o país se esfarelava em uma crise sem precedentes, ela insistia em lorotas esfuziantes sobre eliminação da miséria, pleno emprego e melhoria de renda.
Propalava a “fake reality”, algo em que o PT, Lula e os seus são experts.
Quer algo mais fake do que a candidatura Lula, lançada pelo PT na sexta-feira, com direito a leitura de um manifesto escrito pelo ex-presidente condenado e preso, e portanto impedido legalmente de disputar a eleição? Ilusionismo puro que o PT pretende manter diante dos fiéis enquanto desfia saídas na sacristia.
No manifesto, Lula renova o arsenal de interpretações particulares da História, referindo-se ao “golpe de 2016” e ao conluio de forças da mídia e do capital para impedir sua candidatura. Nada fala da escandalosa roubalheira e do fracasso de Dilma, limitando-se a citar datas dos mandatos do PT. E ilustra feitos com “fatos alternativos”.
No cerne de sua mensagem, Lula entoa a mesma falseta de Getúlio Vargas em sua carta-testamento: “Precisam sufocar a minha voz e impedir a minha ação, para que eu não continue a defender, como sempre defendi, o povo e principalmente os humildes”. Parece não saber que os ardis getulistas têm sido desmascarados pela História, desmistificando o “pai dos pobres”, ele também um genial ilusionista.
Mary Zaidan é jornalista
Com Blog do Noblat, Veja