Luiz Vassallo e Rafael Moraes Moura, O Estado de São Paulo
‘Ele disse que acordaram 50’
A denúncia por supostas propinas de US$ 40 milhões da Odebrecht para o PT, apresentada pela procuradora-geral, Raquel Dodge, ao Supremo, é corroborada por e-mails internos de executivos da empreiteira. Na peça, são acusados o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os ex-ministros Antônio Palocci e Paulo Bernardo, e a presidente do partido, Gleisi Hoffmann. Os valores teriam sido acertados em 2009 e teriam como contrapartida intervenção do governo no BNDES para beneficiar a construtora.
Documento
Segundo a procuradora, os US$ 40 milhões da Odebrecht foram repassados ao PT ‘para que o então presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, e seu ministro do Planejamento, Gestão e Orçamento, Paulo Bernardo, além de outros integrantes da cúpula do Partido dos Trabalhadores, à época o partido governante do país, satisfizessem com decisões políticas os interesses econômicos do grupo Odebrecht, entre eles um aumento na linha de crédito no BNDES entre Brasil e Angola para financiar exportação de bens e serviços entre os dois países’.
A denúncia crava que a contrapartida teria ocorrido ‘na forma de um protocolo de entendimento assinado pelo então presidente e depois referendado pela aprovação do Conselho de Ministros da Câmara de Comércio Exterior – CAMEX3, órgão integrado por Paulo Bernardo’.
A acusação traz e-mails de executivos da Odebrecht. A procuradora sustenta que, em 2009, os executivos da empreiteira ‘cogitaram de 40 e 50 milhões de dólares (e-mails de 02/03/2009 e 09/03/2009), sempre em interlocução com Palocci e Paulo Bernardo’.
Em parte das mensagens, em março de 2009, Marcelo Odebrecht conversa com os executivos Luiz Mameri e Ernesto Sá. “Acabei de estar com o italiano [Palocci]. Ele vai estar com PB [Paulo Bernardo] na 4a cedo para reforcar. Lembrei a ele que precisam fechar o valor (acho que vao pedir entre 40 e 50) a ser incluído nos nossos contratos. Eu disse que uma expectativa razoável eh de aprovar 500 agora e mais algo daqui a uns 6 meses”.
Dias depois, Mameri responde: “Ele disse que acordaram 50 (pareceu-me que era para ver se colava). Quando eu disse que não, que estivemos com AM depois das conversas e que o homem nos passou 40, reagiu: “ok, vamos deixar pelos 40 e mais a frente eu converso com eles para considerarem 50”.
Raquel Dodge pontua que, em 2010, último ano de Lula no governo, o valor ainda não estaria definido. “Ir no PB [Paulo Bernardo] é complicado por causa do rebate não confirmado… Ele vai me cobrar e não sei o que dizer mais. Sugestão: peça para Feijó recorrer ao PB. Se der tempo, me avise antes que deixo o PB melhor capacitado”.
“Feijo me pediu apoio para fechar no mínimo em USD 1 bi. Me disse também que a operação do CS eles não vão aceitar por agora. Vou avisar a Italiano [Palocci] que se querem algo, eles precisam agir”, diz Marcelo Odebrecht a outros executivos.
Raquel explica na denúncia que outro e-mail ‘trouxe anexo o protocolo de entendimento firmado após reunião das delegações dos dois países entre 10 e 22 de junho de 2010’.
“A Cláusula 3 consolidou o objetivo e a 18 condicionou seus efeitos à aprovação do Conselho de Ministros, órgão integrado por Paulo Bernardo na condição de Ministro do Planejamento”, sustenta a procuradora.
“Governo do Brasil concederá à República de Angola um crédito de USD 1,0 bilhão, (hum bilhão de dólares norte-americanos), para o financiamento de exportações brasileiras de bens e serviços. O referido crédito será concedido com recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES”, afirma.
A procuradora-geral demonstra que ‘o sucesso (aumento da linha de crédito) teve seu preço ilícito pago sob a forma de vantagem indevida aos denunciados e a integrantes do Partido dos Trabalhadores’.
“Os e-mails de 30/06/2010 e 05/07/2010 revelaram o ‘rebate’ (vantagem indevida) de US$ 40 milhões”, ela afirma
Em um email, com assunto ‘Italiano’, Marcelo detalha a operacionalização do ‘rebate’.
“Dentro desta linha acertei/ratifiquei com ele:”
“• R 20 até out (incluindo últimos 10 que vc acertou com JD até agosto, ou
seja estes 10 até agosto, mais 10 até outubro): via JD
• R 20 onde somos agentes do aço: acertar com JD como entregaremos
para não misturar com o fluxo acima, entupindo os canais (ele sugeriu
alguns prestadores de serviço). Vou passar para BJ como seremos
reembolsados (ou passados para trás…)
• Depois ele vai me passar um saldo do Feira.
• R 2-3 camisas oficiais (por isto que disse que nem tudo de agora é Vaca),
para isto tem que avisar ao ‘filho’ de JP”
seja estes 10 até agosto, mais 10 até outubro): via JD
• R 20 onde somos agentes do aço: acertar com JD como entregaremos
para não misturar com o fluxo acima, entupindo os canais (ele sugeriu
alguns prestadores de serviço). Vou passar para BJ como seremos
reembolsados (ou passados para trás…)
• Depois ele vai me passar um saldo do Feira.
• R 2-3 camisas oficiais (por isto que disse que nem tudo de agora é Vaca),
para isto tem que avisar ao ‘filho’ de JP”
COM A PALAVRA, GLEISI
Mais uma vez a Procuradoria Geral da República atua de maneira irresponsável, formalizando denúncias sem provas a partir de delações negociadas com criminosos em troca de benefícios penais e financeiros.
O Ministério Público tenta criminalizar ações de governo, citando fatos sem o menor relacionamento, de forma a atingir o PT e seus dirigentes.
Além de falsas, as acusações são incongruentes, pois tentam ligar decisões de 2010 a uma campanha eleitoral da senadora Gleisi Hofmann em 2014.
A denúncia irresponsável da PGR vem no momento em que o ex-presidente Lula, mesmo preso ilegalmente, lidera todas as pesquisas para ser eleito o próximo presidente pela vontade do povo brasileiro. Assessoria do PT
COM A PALAVRA, LULA
A ausência de qualquer materialidade e a repetição de imputações descabidas ao ex-presidente Lula se sobressaem na denúncia apresentada ontem (30/04) pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e outros. Sobre essa nova investida do MPF contra Lula é preciso esclarecer ainda que:
1- A denúncia não procura esconder que mais uma vez Lula foi denunciado por ato legítimo praticado no cargo de presidente da República — no caso a assinatura de Protocolo de Entendimento entre Brasil e Angola em 23/06/2010, com o objetivo de fortalecer os laços entre esses países e, ainda auxiliar o fortalecimento da recente democracia instaurada no país africano;
2 – A denúncia não aponta – porque não existe – qualquer fato que possa indicar que Lula assinou o citado protocolo de entendimentos com Angola objetivando promover interesses escusos da Odebrecht ou de qualquer outra empresa ou empresário. Alguns membros do MPF, da menor e da maior hierarquia, simplesmente buscam criminalizar todo e qualquer ato de governo praticado por Lula mediante a aplicação da teoria do domínio do fato sem a presença dos elementos de responsabilidade necessários para essa finalidade, violando as bases do Estado de Direito e da própria democracia;
3- A aplicação da teoria do domínio do fato como pretende o MPF permite responsabilizar qualquer governante apenas por ter ocupado o cargo, o que é inaceitável e incompatível com a jurisprudência do STF;
4- A denúncia foi baseada no Inquérito 4.342, que tramitou perante o STF, no qual Lula jamais foi chamado ou teve a oportunidade de prestar qualquer esclarecimento;
5- A denúncia está baseada exclusivamente nas delações premiadas de Marcelo Odebrecht e de Emílio Odebrecht e em uma planilha no formato Excel que foi apresentada pelo primeiro fora dos padrões dos sistemas utilizados pela contabilidade formal ou informal daquele grupo empresarial e que não poderá ser comparada com os dados do sistema MyWebDay (contabilidade paralela da Odebrecht) — diante do fato de a Polícia Federal haver constatado a impossibilidade de abri-lo;
6- O STF tem firme o entendimento de que delação premiada não tem o condão de provar qualquer fato e tampouco pode ser utilizada para fundamentar uma denúncia;
7- A denúncia também ignora pedido de investigação sobre os mesmos fatos que havia sido veiculado originariamente pela PGR na PET. 6.738 e que atualmente tramita na Justiça Federal de Brasília após acolhimento de recurso (agravo regimental) interposto pela defesa do ex-presidente — que reverteu decisão proferida pelo ministro Edson Fachin, que havia determinado a remessa do caderno investigatório para a 13ª. Vara Federal Criminal de Curitiba;
8- O MPF, portanto, reforça a prática de abrir inúmeros processos e procedimentos investigatórios contra Lula sobre os mesmos fatos e sem qualquer materialidade, tratando-o como inimigo que precisa ser derrotado a qualquer custo, inclusive pela impossibilidade de se defender;
9- A pedido do MPF, a 13ª. Vara Federal Criminal de Curitiba bloqueou todos os bens e recursos de Lula, impedindo que ele possa se defender nesses processos e procedimentos, fazendo letra morta das garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa (CF/88, art. 5º, LV), com a consequente nulidade de todos os atos;
10- A denúncia reforça que Lula é vítima de “lawfare”, que consiste no mau uso e no abuso das leis e dos procedimentos jurídicos para fins de perseguição política;
11- Lula jamais solicitou ou recebeu vantagem indevida da Odebrecht ou de qualquer outra empresa ou empresário, tampouco interferiu na abertura de linhas de crédito do BNDES que pressupõe a intervenção e a existência de decisões colegiadas de diversos profissionais qualificados, além da observância de regras pré-estabelecidas;
12- Espera-se, diante de todos esses relevantes fatos que acompanham a denúncia, que ela seja sumariamente rejeitada pelo STF, a fim de preservar a ordem constitucional e o Estado de Direito.
Cristiano Zanin Martins e Valeska Teixeira Martins