
Scott Wilson, Washington Post
SAN CLEMENTE, CALIFÓRNIA — A equipe de busca saiu de um estacionamento do McDonald's: uma coleção de homens e mulheres desabrigados e seus defensores se espremendo em velhos carros utilitários. Eles procuraram um pedaço de terra ou um edifício vazio, um lugar — qualquer lugar — onde dezenas de pessoas possam viver por um tempo.
Os carros passam por bairros de casas de dois andares ao longo de uma colina com vista para as ondas do Oceano Pacífico e, em seguida, passam por um parque empresarial. Eles param ao lado de um campo de grama alta que o guia adverte estar fora dos limites por causa de cascavéis.
Os carros passam por bairros de casas de dois andares ao longo de uma colina com vista para as ondas do Oceano Pacífico e, em seguida, passam por um parque empresarial. Eles param ao lado de um campo de grama alta que o guia adverte estar fora dos limites por causa de cascavéis.
Não há linha de ônibus aqui e o supermercado mais próximo está a uma caminhada de três quilômetros. A única virtude real do lote de um hectare é que, enquanto as pessoas trabalham nos armazéns tecnológicos vizinhos, ninguém mora em qualquer lugar por perto.
— Precisamos de nossa própria área sem muitas pessoas por perto — diz Jennifer Juarez, que foi diagnosticada com esquizofrenia e está desabrigada há anos, enquanto estuda o campo. — Mas isso? Sei lá.
O fato de esse lote remoto ser uma opção de moradia temporária para alguns dos 5 mil desabrigados do condado de Orange County expõe o crescente problema que a Califórnia está enfrentando. Frustrados com o ritmo lento da política e exigindo ações imediatas, os moradores dos condados mais ricos da costa da Califórnia vêm providenciando uma solução — o que significa empurrar os sem-teto cada vez mais para longe. O prefeito de Los Angeles, Eric Garcetti, a chamou de "maior crise moral e humanitária do nosso tempo".
Nas últimas semanas, os governos locais de São Francisco a Orange County esvaziaram os campos de desabrigados, alguns deles com anos de funcionamento e há muito considerados questões de segurança pública e saúde. As regiões têm pouco em comum politicamente, mas compartilham uma característica: habitações extraordinariamente caras, que, em março, atingiram valores recordes em Orange County. Nos centros de muitas cidades, os acampamentos de tendas tornaram-se seus próprios bairros, muitas vezes dentro de áreas que foram refeitas com dinheiro público e investimento privado.
Muitas das cidades do estado estão prosperando. Mas a gentrificação que está ocorrendo ao longo da costa tornou muito mais difícil para os governos locais oferecerem opções de moradia para aqueles sem casa. Centenas de pessoas desabrigadas, agora isoladas em bairros urbanos ricos, testaram a paciência dos novos moradores, que gastaram pequenas fortunas nos condomínios e casas nos centros das cidades.
— As pessoas estão cansadas dos políticos não quererem enfrentar esse problema — explica Dennis Ettlin, economista e engenheiro aeroespacial aposentado voluntário do grupo sem fins lucrativos Interfaith Homeless Outreach Project for Empowerment.
Ettlin está ajudando a procurar abrigos em South Orange County, recomendações que ele passará para autoridades municipais.
— Todo mundo quer alimentar os sem-teto — diz ele. — Mas a comida não é o problema aqui. Moradia é a questão.
Quase um quarto da população desabrigada do país mora na Califórnia — cerca de 134 mil pessoas ocupando trechos de calçada, leitos de rio, parque públicos ou praças da cidade. A Califórnia tem a maior porcentagem de sem-teto que vivem nas ruas ou em carros — os defensores os consideram desamparados. Oito em cada dez moradores de rua têm menos de 21 anos, quase o dobro da taxa em outros estados.
Apesar de bilhões de dólares em fundos públicos terem sido aprovados para a construção de moradia para os sem-teto nos últimos anos, o dinheiro se mostrou difícil de ser gasto tão rapidamente quanto necessário. O auditor da Califórnia recomendou em abril que uma única agência supervisione o dinheiro e as ideias para resolver o problema, que muda diariamente nos limites da cidade e e do condado.
— A crescente resistência aos sem-teto é pequena, mas barulhenta — disse Tim Houchen, um ex-sem teto que agora luta pela causa. — O problema é que há muitas pessoas que não querem novos abrigos, mas sim que os sem-teto vão para outro lugar.

FADIGA PÚBLICA
O cansaço público, manifestado em audiências, nas ruas e em novas políticas, vem aparecendo em todo o estado há meses.
Em janeiro, a cidade de El Cajon, no condado de San Diego, onde o maior surto de hepatite A da História do país emergiu dos acampamentos de desabrigados no ano passado, prendeu uma dúzia de pessoas acusadas de violar uma nova lei municipal que tornava crime alimentar os desabrigados. O decreto foi rescindido um mês após os protestos.
No mesmo mês, uma equipe de trabalho da cidade de San Diego quase matou um morador de rua. Ao limpar um acampamento no centro da cidade, os trabalhadores pegaram uma barraca sem olhar o que tinha dentro, colocando-a no caminhão de lixo. O sem-teto conseguiu escapar antes de ser esmagado.
Em Malibu, cidade a oeste de Los Angeles que inclui um bairro apelidado de Praia dos Bilionários, os moradores pediram a uma igreja que suspendesse os jantares semanais que oferecia para os desabrigados. Eles argumentaram que oferecer ajuda atrai mais sem-teto.
O mesmo aconteceu na menos luxuosa Riversidade, também a oeste de Los Angeles.
A preocupação da comunidade começou após alguns eventos recentes: um incêndio no último outuno que colocou em risco o Getty Museum e o bairro de Bel-Air começou em um acampamento de moradores de rua, levando a pressão de alguns dos bairros mais ricos de Los Angeles para que o governo se esforçasse mais para resolver o problema. Empresas também queimaram como resultado de fogueiras que saíram do controle nos enclaves dos desabrigados.
Um sem-teto de 51 anos foi preso em abril e acusado após invadir a mansão do governador de Sacramento por uma janela lateral. O governador Jerry Brown não estava em casa, mas sua mulher, Anne Gust Brown, sim.
Dias depois, um mendigo entrou em uma churrascaria em Ventura, ao norte de Los Angeles, e esfaqueou um homem de 35 anos enquanto ele jantava com a filha de 5, no colo. "Basta. Estamos tomando nossas ruas de volta", dizia um cartaz carregado por um dos manifestantes que marcharam até a prefeitura de Ventura dias mais tarde.
O prefeito de São Francisco, Mark Farrell, começou a fazer isso na última semana de abril.
Ele encomendou tendas na Mission District — marco zero para a gentrificação da cidade movida pelo dinheiro da tecnologia e zona limpa dos moradores de rua. A cidade também dobrou a equipe de limpeza dedicada coletar agulhas hipodérmicas descartadas nas ruas.
DIVISÕES
Em Orange County, o processo se tornou particularmente amargo e acabou no tribunal. Ele dividiu o populoso norte urbanizado do município, onde a população de rua se concentra há anos, e o sul mais rico, que recebeu a ordem de carregar com a maior parte do fardo.
Por uma década, cerca de 1.400 pessoas viviam em tendas ao longo de um trecho de 2,5 quilômetros do rio Santa Ana, principalmente em um canal seco e cheio de cimento que corria entre rodovias, à vista do estádio Angel of Anaheim.
O acampamento afastou corredores, transeuntes e ciclistas, muitos ressentidos com o fato de que uma fatia destinada a eles foi agarrada por outros. Mais de 11 mil pessoas assinaram uma petição este ano, pedindo que as autoridades liberem a faixa. Em janeiro, funcionários locais aceleraram os planos de limpar o campo. Mas um grupo de defesa dos sem-teto entrou com uma ação federal contra o condado e várias cidades para impedir a ação. As autoridades se defenderam citando leis anti-ocupação que, segundo eles, proibiam as tendas.
O juiz da Corte Distrital dos EUA, David O. Carter, um fuzileiro naval aposentado que serviu no Vietnã, disse entender o risco à segurança pública representada pelo acampamento. Ele também deu um passo incomum ao visitar leito do rio, vendo por si mesmo a miséria e o desafio. Ele declarou que qualquer despejo deveria ser feito "humanidade e dignidade".
O condado concordou em arcar com camas extras em vários abrigos e financiar vouchers de 30 dias de motéis para centenas de desabrigados. O Conselho de Supervisores planeja gastar quase US$ 100 milhões para acomodar e tratar os deslocados pela higienização ao longo do leito do rio e na Praça das Bandeiras, um acampamento no coração do condado.
— O sistema aqui simplesmente não tem capacidade — afirma o supervisor Andrew Do, presidente do conselho que trabalhou na década de 80 como um defensor dos sem-teto enquanto cursava Direito em São Francisco. — A verdade é que a capacidade total foi atingida antes mesmo de começarmos.
O processo de limpeza começou em fevereiro com pouca resistência em campo. Mas a polícia encontrou centenas de bicicletas roubadas, munição e outras evidências do que Do chamou de "elementos criminosos".
Como parte do processo, as autoridades locais receberam ordens de encontrar novos locais para os desabrigados após os campos serem limpos. Os lugares mais lógicos ficavam no sul menos populoso do condado, mas logo a forte resistência das comunidades de lá chegou.
Depois que os supervisores aprovaram um plano de instalção de moradias temporárias — seja em barracas financiadas pela cidade ou em tendas de plástico resistente da Tuff Sheds — representantes eleitos de várias cidades ameaçaram bloquear a ação com medidas legais.
O supervisor Todd Spitzer, que se referiu aos sem-teto como "criminosos sexuais e viciados em drogas", se colocou à disposição para enfrentar a resistência.
Os sem-teto, declarou ele a uma rádio local, não devem morar onde "bons cidadãos da Califórnia estão tentando criar suas famílias, pagar seus impostos e apenas desfrutar de uma vida com qualidade". Para ele, a população de rua do seu distrito deve ser mandada para o deserto de San Bernadino e, de lá, o auxílio deve ser providenciado.
— Estamos mais uma vez nessa situação onde apenas duas cidades assumem a maior parte do problema — reclama Do, cujo escritório tem vista para uma estação de ônibus que foi transformada em abrigo para centenas de moradores de rua. — A retórica e a imagem criadas internacionalmente fizeram com que as comunidades reagissem desse jeito que estamos vendo.
Juarez, que se ofereceu para ser guia local, viveu ao longo do rio Santa Ana por anos. Desde a sua liberação, ela passou noites em um motel de estada prolongada com a ajuda de um voucher do condado que já expirou.
Hoje, com 51 anos, Juarez é uma nativa de Orange County que caracteriza a atual resistência em receber os sem-teto como "as mesmas pessoas que sempre estiveram contra nós e ainda estão contra nós". Ela acrescenta que entende algumas das preocupações, especialmente as afirmações de que "os sem-teto trazem drogas e crime."
Intitulando-se como uma maníaca por limpeza, Juarez não teria um cachorro enquanto morasse ao longo do rio por medo de ele ficar muito sujo. (Agora ela tem Joe, um vira-lata resgatado.) Ela vivia na própria barraca e, como afirma, "respirava meu próprio ar". Ela busca algo similar, um lugar para viver nos mesmos termos.
— Mas é um pedaço de terra tão pequeno que, quando for reservado um espaço para todos os cães, não será muito — diz Juarez enquanto observa a grama de um terreno em San Clemente. — É desolador.