Blog Reinaldo Azevedo - Veja
Tudo indica que o magnata Petro Poroshenko, conhecido
como o “Rei do Chocolate”, venceu a eleição na Ucrânia no primeiro turno.
Pesquisas de boca de urna lhe dão em torno de 56% dos votos.
É o fim da crise?
Ainda não. Embora tenha experiência política e trânsito — já foi ministro da
Economia e das Relações Exteriores e é dono da cadeia de confeitarias Roshen e
de um canal de televisão —, Poroshenko deve ser eleito apenas pela população da,
digamos assim, Ucrânia ocidental, muito especialmente Kiev, e isso será fonte
permanente de dor de cabeça. Nas cidades rebeladas do Leste, que são pró-Rússia,
praticamente não houve eleição. Os separatistas não deixaram e não reconhecem o
pleito. É o caso de Donetski, por exemplo, onde está o epicentro do
separatismo.
Assim, é evidente que os separatistas vão acusar a
ilegitimidade do presidente eleito e tentarão manter seu movimento de
“resistência”. Poroshenko conseguirá estabelecer alguma forma de negociação? É o
que se espera. E é possível que, sob certas condições, Vladimir Putin esteja
disposto a ouvir. Parece sandice supor que a Rússia pretenda manter uma presença
militar na Ucrânia. O que ele quer ali é um aliado — ou, vá lá, um governo que
não seja hostil.
Poroshenko é pró-Ocidente e defende a integração do país
à Europa — raiz do conflito. Mas sob quais condições? Eis a questão. A elite
ucraniana, até agora, tem protagonizado desastres em série. Quem opera política
externa sabe que e preciso que os países se preocupem também com o vizinho. E a
Ucrânia parece ter esquecido quem estava logo ali, do outro lado da
fronteira.
É claro que Putin vai ficar de olho na não-participação
do Leste do país e terá sempre uma carta na manga: a suposta ilegitimidade do
processo eletivo. Mas tendo a achar que ele vai usar essa fragilidade para
negociar uma submissão, digamos, altiva dos ucranianos: o preço de reconhecer a
vitória de Poroshenko deve ser a cobrança da fidelidade a Moscou. Ainda que o
país venha a fechar um acordo com a União Europeia, Putin deve arrancar a
garantia de que não se fará política anti-Rússia por ali. Na retórica ao menos,
o presidente eleito diz que não vai reconhecer a anexação da Crimeia. É conversa
mole. Isso já está fora de questão.
Ainda que os movimentos separatistas gozem de certa
autonomia, é evidente que irão até onde Moscou permitir. Poroshenko na
Presidência da República não terá mais facilidade, por exemplo, para impor uma
solução militar do que tem o atual governo. Esta, Putin já deixou claro, é
inaceitável. O que o presidente russo pode alegar agora é que haverá alguém com
um pouco mais de legitimidade com quem conversar, já que ele se nega a falar com
o governo interino da Ucrânia, que considera golpista.
Putin certamente tentará arrancar de Poroshenko alguma
concessão que justifique um recuo. Duvido que tenha a intenção de manter um
Exército de ocupação no Leste da Ucrânia, ainda que boa parte da população, de
origem russa, pudesse ver a intervenção com bons olhos. O mundo já engoliu a
Crimeia. Não é possível criar outra.
