O governo vai depender mais uma vez de receitas extraordinárias para fechar
suas contas e entregar o resultado fiscal prometido para este ano, um superávit
primário de R$ 80,8 bilhões no balanço conjunto do Tesouro Nacional, do Banco
Central e da Previdência. O superávit primário é o dinheiro separado para o
pagamento de uma parte das obrigações da dívida pública.
Sem disposição para economizar e racionalizar os gastos, a equipe econômica
tem recorrido, nos últimos anos, a soluções heterodoxas para atingir a meta
oficial. Essa disposição é ainda mais duvidosa em ano de eleição. Mas o
compromisso tem sido reafirmado. A promessa, no entanto, vai além daqueles R$
80,8 bilhões. A economia total fixada para o ano, de R$ 99 bilhões, dependerá,
segundo o plano original, da contribuição de Estados, municípios e empresas
controladas pela União. Se a contribuição efetiva ficar abaixo da programada, a
diferença será coberta por um esforço maior das entidades federais, segundo
anunciou há meses o ministro da Fazenda, Guido Mantega.
O uso de dinheiro extraordinário para fechar o balanço foi confirmado no
relatório de avaliação orçamentária do segundo bimestre, divulgado na
quinta-feira pelo Ministério do Planejamento. A cada reavaliação o governo
atualiza a programação de receitas e de despesas, com base na evolução recente
das contas públicas e nas últimas projeções econômicas. As projeções incluídas
no relatório mantêm a perspectiva de crescimento de 2,5% para o Produto Interno
Bruto (PIB) e elevam a inflação de 5,3% para 5,6%.
O ritmo da atividade pouco deverá contribuir, portanto, para a geração de
receitas. Além disso, a expansão projetada de 2,5% está acima das previsões do
mercado, em geral inferiores a 2%, mas esse detalhe é desconsiderado,
obviamente, nas estimativas oficiais. A inflação poderá elevar a receita
nominal, a curto prazo, mas isso dependerá da confiança de empresários e
consumidores, neste momento em deterioração.
Por enquanto, pioram as projeções da receita tributária normal. Diminuíram na
segunda revisão os valores previstos para os Impostos de Renda, de Importação e
sobre Produtos Industrializados. Aumentou a dependência de recursos
extraordinários, mas as contas mostram um resultado final ajustado. O valor
estimado para a arrecadação extraordinária de impostos passou de R$ 18,7 bilhões
para R$ 30,2 bilhões em todo o ano. O aumento inclui o ganho previsto como
resultado de uma reabertura do Refis, o programa de refinanciamento de tributos
em atraso.
No ano passado o Refis também foi reaberto - mais uma vez - e os primeiros
pagamentos ajudaram a ajeitar as contas de 2013. Em geral, a arrecadação
proporcionada por esse programa tende a decrescer em pouco tempo e boa parte das
empresas beneficiadas simplesmente deixa de cumprir as obrigações.
As receitas extraordinárias incluem também um bom volume de bônus de
concessões de infraestrutura e dividendos de estatais. As estimativas indicam R$
13,5 bilhões de bônus de concessões e R$ 23,9 bilhões de dividendos.
De janeiro a março, os dividendos, no valor de R$ 5,9 bilhões, foram 667,6%
maiores que os de um ano antes. O governo está obviamente cobrando um esforço
especial das estatais para ajeitar as contas do Tesouro. No ano passado essa
contribuição, somada à receita das concessões, foi fundamental para a
apresentação final das contas. O trabalho de maquiagem, também conhecido como
contabilidade criativa, foi apontado pela imprensa e por analistas do mercado.
Já havia ocorrido no ano anterior e comentários sobre o assunto apareceram na
imprensa internacional.
Em resumo: pelo novo relatório de avaliação bimestral, ninguém deve esperar
cortes adicionais de despesas nos próximos meses. Além disso, falta o governo
esclarecer alguns mistérios. Não há referência, no documento, ao déficit
projetado para a Previdência nem ao custo do subsídio às contas de luz. A
melhora das contas públicas, têm dito dirigentes do Banco Central, seria uma
contribuição importante para o combate à inflação. Eles terão de continuar
esperando essa contribuição.