sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025

O governo das ‘minorias’, por Anderson Scardoelli

Gay, africano, mulheres, filho de cubano e descendente de indiano ganham protagonismo na gestão de Donald Trump 


Mike Waltz, conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, Pete Hegseth, secretário de Defesa, Scott Bessent, secretário do Tesouro, Marco Rubio, secretário de Estado, J.D. Vance, vice-presidente dos EUA, e Susie Wiles, chefe de gabinete, durante reunião entre Donald Trump, presidente dos EUA, e Emmanuel Macron, presidente francês (não retratado), na Casa Branca, em Washington, D.C. (24/2/2025) | Foto: Reuters/Brian Snyder 

No decorrer de 2024, parte da imprensa de dentro e de fora dos Estados Unidos tentou emplacar a versão de que o mundo inteiro correria perigo caso Donald Trump voltasse ao comando da Casa Branca. Afinal, de acordo com os críticos (só para ficar em termos usados pelo norte-americano The New York Times e pelo francês Le Monde) Trump seria o representante máximo de problemas como machismo, homofobia, xenofobia e racismo. Em novembro de 2024, o republicano venceu de lavada a democrata Kamala Harris e a sua assumida pauta woke. Ao reassumir a Presidência dos EUA, ele formou o primeiro escalão de seu governo com destaque a representantes do que a esquerda dita “progressista” insiste em rotular como minorias. Desde 20 de janeiro, Washington D.C. passou a contar com um gay, um africano, mulheres, um filho de cubanos e um descendente de indianos em posições de comando. 

O gay 

Uma música marcou a campanha de Trump no ano passado: Y. M. C. A., do grupo Village People. Tornou-se comum o então candidato arriscar passos de dança ao som da canção, vista como símbolo da comunidade homossexual. Quinze dias depois de vencer a eleição, o republicano demonstrou que a relação com a comunidade LGBT iria além das festividades e anunciou: um gay passaria a comandar o Departamento de Tesouro, órgão equivalente em atribuições ao Ministério da Fazenda no Brasil. Assim, Scott Bessent assumiu a responsabilidade no governo norte-americano. 



Scott Bessent é casado com outro homem há 14 anos e comanda o Departamento do Tesouro dos EUA | Foto: Divulgação/Treasury.gov

Bessent, de 62 anos, foi a escolha de Trump diante de seu histórico profissional — e não pelo fato de ser casado há 14 anos com o advogado John Freeman, com quem tem dois filhos adotivos. O mais novo secretário do Tesouro dos EUA — e primeiro homossexual assumido na função — é formado em ciências políticas pela Universidade Yale e trabalha desde a década de 1980 no mercado financeiro. Foi diretor do fundo controlado por George Soros, e visitou mais de 60 países a trabalho. Em 2015 criou a sua própria empresa de gestão de investimentos, a Key Square Capital Management. Antes de se tornar aliado de Trump, colaborou com o Partido Democrata e ajudou a arrecadar dinheiro para campanhas presidenciais de Al Gore, Barack Obama e Hillary Clinton. 

O africano 

Crítico do Estado inchado e com gastos desnecessários, Trump criou, neste início de seu segundo mandato, o Departamento de Eficiência Governamental (DOGE). Para o comando do órgão, o escolhido foi Elon Musk, que, apesar de contar com nacionalidades norte-americana e canadense, nasceu em Pretória, na África do Sul. 

Africano, Musk é empresário de sucesso nos mais diversificados setores da economia. Seu trabalho vai da indústria de carros elétricos (Tesla) à produção de satélites que fornecem acesso à internet (Starlink). Passa pela fabricação do foguete que dá ré (SpaceX) e pela compra de rede social para amplificar o direito à liberdade de expressão mundo afora (X). São projetos criativos que o colocam no topo da lista de homens mais ricos do mundo, com fortuna avaliada em US$ 400 bilhões – o equivalente a pouco mais de R$ 2,3 trilhões.


Elon Musk e Donald Trump, no Salão Oval da Casa Branca, em Washington, D.C., EUA (11/2/2025) | Foto: Reuters/Kevin Lamarque

Musk dá valor ao dinheiro. Tanto que, em um mês de trabalho à frente do DOGE, identificou que o governo do democrata Joe Biden destinou US$ 200 bilhões para o que classificou como “gastos inúteis” durante a pandemia e empenhou quase US$ 5 trilhões sem transparência. Além disso, o empresário ajudou a abrir a caixa-preta da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID). Revelou, por exemplo, que a USAID financiou faculdade para terrorista da Al-Qaeda e manteve organizações não governamentais com atuação no Brasil em sua folha de pagamento. 

O descendente de indianos 

Inicialmente, uma dupla estaria à frente do conselho do DOGE. Para trabalhar ao lado de Musk, Trump havia escolhido o empresário do setor de tecnologia Vivek Ramaswamy, filho de indianos. Ele chegou a ajudar na criação do órgão, mas desistiu de ter ocupação formal na estrutura da Casa Branca. Elogiado publicamente por Trump, Ramaswamy deve ser o candidato do Partido Republicano na disputa pelo governo de Ohio. 


Vivek Ramaswamy, filho de indianos, é elogiado publicamente por Trump | Foto: Reprodução/Instagram/@vivekgramaswamy

“Vivek Ramaswamy vai concorrer ao cargo de governador do grande Estado de Ohio”, avisou Trump, em postagem na rede social Truth Social. “Ele tem algo especial. É jovem, forte e inteligente! Vivek também é uma pessoa muito boa, que realmente ama o nosso país. Ele será um grande governador.”

O filho de cubanos 

Outro que serve como desmentido de que Trump seria contra estrangeiros é Marco Rubio. Filho de imigrantes cubanos que deixaram a ilha caribenha na década de 1950 (antes da implantação da ditadura comunista), Rubio assumiu como secretário de Estado. A 28/02/2025, 12:57 O governo das 'minorias' - Revista Oeste https://revistaoeste.com/revista/edicao-258/o-governo-das-minorias/ 5/12 função tem responsabilidade diplomática. São os olhos dos EUA, maior potência econômica e militar do planeta, para além das fronteiras.


Marco Rubio é filho de imigrantes cubanos e secretário de Estado dos EUA | Foto: Divulgação/State.gov 

O republicano de origem latina tem histórico na política norteamericana. Durante oito anos, de 2000 a 2008, foi deputado estadual na Flórida, chegando a presidir a Câmara dos Representantes local. Antes de assumir o cargo de secretário de Estado, serviu como senador pela Flórida de 2011 a 2025. Na mais nova função, Rubio já marcou posição contra o terrorismo e regimes totalitários. Chamou a Coreia do Norte de país “delinquente” e firmou apoio aos opositores do ditador da Venezuela, Nicolás Maduro. Avisou também que trabalhará para eliminar o grupo terrorista Hamas. 

A mulher que faz história

 A democracia norte-americana tem mais de 230 anos de história. Mesmo assim, nunca teve uma mulher como chefe de gabinete da Casa Branca. Situação que só mudou graças a Trump. Foi ele quem definiu Susie Wiles, coordenadora de sua vitoriosa campanha contra Kamala, como responsável pela função. Por cuidar da agenda presidencial e definir no dia a dia quem se encontra com o presidente da República, é reconhecida por ser a segunda mais importante de Washington D.C.


Donald Trump ao lado da primeira mulher da história a comandar o gabinete da Casa Branca, Susie Wiles | Foto: Reprodução/X/@susie57 

Consultora política, Susie, de 67 anos, tem longa história de parceria com o Partido Republicano. Em 1980, integrou a equipe da campanha presidencial de Ronald Reagan, que venceu o então detentor do cargo, o democrata Jimmy Carter, de forma humilhante: 489 a 49 no Colégio Eleitoral. Ela também colaborou com lideranças republicanas espalhadas pelos Estados norte-americanos. 


“É uma honra bem merecida ter Susie como a primeira mulher chefe de gabinete na história dos Estados Unidos.” (Donald Trump) 


Susie, ao ser nomeada para o cargo, recebeu elogios do presidente. “É durona, inteligente, inovadora e é universalmente admirada e respeitada”, disse Trump. “Continuará trabalhando incansavelmente para tornar a América grande novamente. É uma honra bem merecida ter Susie como a primeira mulher chefe de gabinete na história dos Estados Unidos. Não tenho dúvidas de que ela deixará nosso país orgulhoso.” A jovem mãe 

Susie não é a única mulher a ganhar protagonismo no atual governo dos EUA. Desde a posse de Trump, a secretária de imprensa da Casa Branca é Karoline Leavitt. Aos 27 anos, ela é casada com o empresário Nicholas Riccio, com quem teve o filho Nicholas Robert, hoje com 7 meses de vida.


Karoline Leavitt: mãe de um sorridente bebê e mulher mais jovem da história a chefiar a comunicação da Casa Branca | Foto: Reprodução/Instagram/@karolineleavitt 

Formada em comunicação e ciência política, Karoline, que é a pessoa mais jovem da história a trabalhar como porta-voz da Casa Branca, foi estagiária do canal de TV Fox News. Durante o primeiro mandato de Trump, ela fez estágio como assessora de imprensa do governo e, posteriormente, trabalhou como redatora presidencial e secretáriaassistente de imprensa. Em 2022, candidatou-se ao cargo de deputada pelo primeiro distrito de New Hampshire, seu Estado natal. Não conseguiu se eleger, mas promoveu uma campanha que atraiu a atenção de Trump — que passou a ser o seu chefe direto em 20 de janeiro deste ano. 

Trump supera Lula 

Tachado de “machista” por boa parte da imprensa, do Partido Democrata norte-americano e pela esquerda mundial, Trump tem, em termos proporcionais, mais mulheres em seu primeiro escalão de governo do que a equipe do presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva. A contar secretarias, departamentos e agências, são 24 pessoas que respondem diretamente ao presidente dos EUA. Dessas, dez são mulheres. 

Além de Susie e Karoline, o governo Trump conta com os trabalhos de Amy Gleason (administradora interina do DOGE e que atua em parceria com Musk), Brooke Rollins (Agricultura), Pam Bondi (procuradora-geral do Departamento de Justiça), Lori ChavezDeRemer (Trabalho), Linda McMahon (Educação), Kristi Noem (Segurança Interna), Tulsi Gabbard (Inteligência Nacional) e Elise Stefanik (representante dos EUA nas Nações Unidas).


Governo Trump tem mais mulheres em postos de comando do que o primeiro escalão do governo Lula | Foto: Reprodução/Instagram/@realdonaldtrump


Dos 39 ministérios do Brasil, nove têm uma mulher no comando — ou seja, 23%, ante mais de 40% do governo dos EUA. A diferença vai além de indicadores proporcionais. Enquanto Trump faz questão de elogiar as mulheres com quem trabalha — Susie Wiles que o diga —, Lula as demite e as troca por homens. Desde o início de seu atual mandato, o petista demitiu Daniela do Waguinho (Turismo), Ana Moser (Esportes) e Nísia Trindade (Saúde). Elas foram substituídas por Celso Sabino, André Fufuca e Alexandre Padilha, respectivamente. A julgar pelos fatos, não é Trump quem deveria ser chamado de machista.

Revista Oeste