sábado, 4 de abril de 2020

Transporte no Brasil perde 62% dos passageiros com vírus chinês; queda na Europa chega a 90%

Com a escalada do vírus chinês, chega a 62% a queda na circulação dos brasileiros no transporte público. É um percentual abaixo de países europeus mais afetados até aqui pela doença, como Itália (87% de perda) e Espanha (88%), mas acima dos Estados Unidos (51%).
Em todo o mundo, houve queda drástica também em atividades como visita a parques e restaurantes/bares/museus (reduções de 70% e 71% no Brasil, respectivamente).
As conclusões são fruto da análise de dados anônimos de localização divulgados pelo Google, obtidos a partir de aparelhos dos usuário. O levantamento traz números de 131 países nos meses de fevereiro e março, quando a epidemia provocada pelo vírus chinês, a Covid-19, até então concentrada na China e em alguns locais da Ásia, se disseminou pelos cinco continentes.
O levantamento considera o movimento nos países registrado entre 16 de fevereiro e 29 de março, para comparar com a atividade entre 3 de janeiro e 6 de fevereiro. Foram avaliadas seis categorias: residências, locais de trabalho, estações de transporte público, mercados e farmácias, parques (inclui praças, praias e jardins públicos) e lazer (restaurantes, shoppings, cafés, bares, cinema, museus e teatros).
Na Itália, Espanha e França, locais mais afetados pelo vírus chinês na Europa, há reduções de cerca de 90% no fluxo de cidadãos em estações de transporte e locais de lazer.
No Brasil, houve aumento de quase 20% no volume de pessoas em suas casas na semana passada. O transporte ficou 62% mais vazio, e os shoppings e cinemas perderam 71% do público.
Segundo dados do Ipea, 65% dos brasileiros usam transporte público nas capitais. Nas maiores cidades da Europa, cerca de 60% dos cidadãos usam esse meio para ir trabalhar, de acordo com levantamento da União Europeia —17% usam carro particular.
Por aqui, o fluxo de pessoas nos espaços comuns começou a cair na semana do dia 8 de março.
O esvaziamento dos locais de circulação ganhou força a partir da semana seguinte, quando governadores começaram a anunciar medidas como a suspensão de aulas e restrições ao comércio.
O movimento foi iniciado por São Paulo e Rio, estados mais atingidos pela epidemia, e foi acompanhado por outras unidades da federação nos dias seguintes, à medida que o vírus se espalhava pelo país.
No domingo passado, Santa Catarina registrava 80% menos pessoas nos locais de lazer, maior redução entre os estados.
Em relação ao transporte público, Sergipe é o que teve maior queda no volume de pessoas nas estações (86%).
Já Rio e São Paulo tiveram redução de 37% na frequência a locais de trabalho.
Nos Estados Unidos, os dados mostram que o isolamento social ainda não tem a mesma abrangência da registrada entre os europeus e brasileiros. Segundo o Google, a diminuição do público em locais de lazer e no transporte girou em torno 50% —percentual semelhante ao visto na Austrália, que tem menos de 1% dos mortos dos EUA.
Os americanos têm o maior número de casos do mundo (quase 259 mil, com 6.000 mortes).
Os efeitos são maiores em estados como Nova York, que tem mais de 100 mil doentes e onde houve redução de 62% na frequência a locais de lazer. Já em Nebraska (281 casos), a queda foi de 34%.
Nos dois países com maior números de mortes até o momento, Itália e Espanha, a movimentação nos parques, praças e jardins públicos indica que a população não adotou o isolamento voluntário de forma muito abrangente. Os cidadãos só passaram a ficar em casa quando isso foi imposto pelo governo.
No início da crise, em fevereiro, houve aumento na frequência a parques, com mais pessoas aproveitando ao ar livre os dias de sol no fim do inverno.
Na Itália, a queda no movimento só se torna constante a partir da primeira semana de março, quando o país já registrava milhares de casos confirmados e as mortes já chegavam às centenas.
Na Lombardia, região mais afetada pelo vírus chinês, houve pico de movimento pouco antes do dia 8 de março, domingo em que se comemorou o Dia Internacional da Mulher e houve marchas e manifestações em cidades de todo o mundo.
Naquele dia, a Itália contabilizava 366 mortos. Os casos confirmados ultrapassavam os 7.000, com mais de 3.000 só na Lombardia.
Também naquele domingo o governo italiano decretou quarentena na região, medida que restringiu a movimentação de 16 milhões de pessoas.
Na Espanha, houve aumento do movimento em parques durante todo o mês de fevereiro —no fim de semana dos dias 22 e 23, a frequência cresceu quase 50%.
Por lá, só houve queda consistente a partir da segunda semana de março, quando o governo decretou quarentena.
Já a Coreia do Sul, considerada um exemplo em relação ao controle interno da epidemia e que registrou auge de contágio em fevereiro, deu sinais de que começou a retomar as atividades normais em março.
Ainda há redução no volume de pessoas em shoppings, restaurantes, estações de transporte público e locais de trabalho, mas os percentuais são bem mais modestos que na Europa e nas Américas, e já se nota aumento no fluxo em mercados, parques e farmácias.
O Japão, que assim como a Coreia não adotou medidas mais rígidas de confinamento, ainda tem menos movimento, especialmente em relação ao transporte público.
O levantamento do Google mostra queda na circulação de pessoas a partir da semana passada, em meio ao aumento de novos casos e o receio de que o vírus se propague. O primeiro-ministro, Shinzo Abe, tem sido pressionado por políticos locais a declarar estado de emergência e ampliar as restrições à circulação de pessoas.
Não há dados para a China, onde o vírus surgiu e onde o Google opera com restrições.
Argentina e África do Sul, por sua vez, são alguns dos países com maior aumento do volume de pessoas que se mantêm em casa (27% e 24%, respectivamente). As duas nações impuseram medidas duras de isolamento social, com controle do Exército entre os sul-africanos e multas aos argentinos que infringirem as regras.


Com Flávia FariaDiana Yukari e Leonardo Diegues, Folha de São Paulo