quinta-feira, 23 de abril de 2020

General Braga Netto assume definitivamente articulação política do governo Bolsonaro. E com carta branca

O ministro da Casa Civil, Walter Braga Netto, ganha força e emerge como o principal articulador político do governo Bolsonaro em meio à crise provocada pelo vírus chinês.
General da reserva, ele reformulou a estratégia do combate à pandemia em três eixos: dissolver o conflito interno, reconquistar o controle da comunicação sobre a administração da crise e reduzir o poder de fogo de opositores.
Ao mesmo tempo, atuou numa aproximação de Bolsonaro e partidos políticos com influência no Congresso.
Nesta quarta-feira (22), por exemplo, anunciou um plano de retomada da economia, chamado de Pró-Brasil, em que assumiu o protagonismo, em movimento de isolamento do ministro da Economia, Paulo Guedes.
Da confiança de Jair Bolsonaro, Braga Netto defendeu em reuniões internas que, para ganhar a guerra contra o coronavírus, era preciso, primeiro, vencer as batalhas dentro do próprio governo. Sob seu chapéu, foi criado o gabinete de crise para acabar com o que chamava de “disse-me-disse’’.
Braga Netto assumiu a Casa Civil em fevereiro, se tornando o nono militar no primeiro escalão e o primeiro fardado desde a ditadura militar na função.
O último havia sido o general Golbery do Couto e Silva, um dos ideólogos do regime e comandante do Gabinete Civil, que tinha as mesmas atribuições.
No Exército desde 1974 e general de quatro estrelas, Braga Netto foi observador das Nações Unidas no Timor Leste e adido na Polônia e nos Estados Unidos.​​
Como interventor no Rio de Janeiro em 2018, teve atuação marcada pela discrição e por não tomar decisões tempestivamente. Da mesma maneira, vem conduzindo as ações na Casa Civil e ganhando espaço no governo.
A primeira batalha de Braga Netto foi no Ministério da Saúde. O militar tentou contornar a crise provocada pelo ex-ministro Luiz Henrique Mandetta (Saúde)
O ex-deputado do DEM assumiu o pepel de protagonista, contestando a liderança do presidente da República. Depois de inúmeras trapalhadas e shows diários para a 'mídia amiga', acabou demitido.
Mandetta chegou a sugerir que os brasileiros deixassem de assistir o 'show de horrores' promovido pelo Jornal Nacional da TV Globo. 
Para surpresa de ninguém, o ministro, na coletiva do dia seguinte, pediu desculpas à Globo. Como que recomendando que o terrorismo da antiga 'vênus platinada' deveria constar da agenda dos brasileiros. Quer dizer, o sensacionalismo descarado atrás de audiência, e sobretudo, para demonizar o governo do Brasil era defendido pelo ministro da Saúde.
Insatisfeito, Mandetta, que se recusava a dar entrevistas exclusivas, foi personagem central do 'Fantástico', da Rede Globo, ao perguntar se o cidadão deveria seguir a orientação dele, Mandetta. ou do presidente da República. 
Demitido, está sendo investigado em face de negócios suspeitos fechados durante a sua gestão. 
Depois de Mandetta criticar o presidente em entrevista à TV Globo, Bolsonaro reclamou, e o militar lavou as mãos, abrindo espaço para a queda do então ministro.
O afastamento da crise interna foi vista como a primeira de três etapas planejadas por Braga Netto para tirar o presidente –e o governo– do paredão. O segundo movimento é reconquistar a guerra da comunicação.
Antes das mudanças na Saúde, Braga Netto começou a trazer para o Planalto o controle sobre a divulgação das ações do governo. Durante uma coletiva, falava em nome do governo e chegou a impedir que Mandetta respondesse sobre seu futuro quando questionado se ficaria no cargo.
Após a queda do ministro, Braga Netto aproveitou para mudar de vez a divulgação das informações oficiais. A avaliação feita por ele e seus assessores é que as entrevistas coletivas feitas pelo Ministério da Saúde estavam se tornando munição para atacar o governo.
A interlocutores ele disse que pretende conter o que chama de "contágio’’ da crise dentro do governo e, agora, estaria na fase de "tratamento" interno.
Por ordem do general da reserva, o foco dessas entrevistas passaria a ser positivo, como já ocorreu nesta quarta, com o novo ministro da Saúde, Nelson Teich, e sem a presença dos técnicos da pasta.​
O ministro convenceu o presidente Bolsonaro de que era preciso tornar os canais de informações propositivos e que não fossem usados para ataques a adversários.

A estratégia de comunicação também afastou outro ponto de tensão interna: o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do presidente.
Braga Netto usou como exemplo o vídeo produzido pela Secom (Secretaria de Comunicação) no início da crise. No material, o Planalto pede o fim do isolamento, e Bolsonaro incentiva protestos anticonfinamento. Após a publicação do vídeo, a Secom divulgou nota afirmando que o material era “em caráter experimental” e que não passou pelo “crivo” do governo.
Com a ajuda do chefe da secretaria, Fabio Wajngarten, que estava afastado na época do vídeo por causa da Covid-19, Braga Netto reformulou a estratégia abrindo espaço para entrevistas em emissoras e veículos que priorizam o jornalismo, o que não é exatamente o que fazem o grupo Globo, a Folha, a Veja, o Estadão...
Braga Netto passou a exercer de fato a coordenação entre as pastas, o que foi uma demanda de Bolsonaro, que entende a Casa Civil como ponto de interlocução entre os ministérios.
No governo, também chama a atenção o fato de que agora os ministros e técnicos frequentam mais o quarto andar do Palácio do Planalto, onde fica a Casa Civil, do que faziam quando a gestão estava nas mãos do ex-titular Onyx Lorenzoni (hoje, no comando da Cidadania).
O militar passou a cobrar planejamento, cronograma e ação. Um dos primeiros ministros a sentir de perto a mão dura foi o próprio Onyx. Braga Netto o cobrou sobre os problemas enfrentados no cadastramento da população para o pagamento dos R$ 600 e pediu resultados.
A ideia do plano de recuperação da economia em curto prazo também foi uma demanda do general.
Ciente de que o projeto apresentado pelos seus pares na Esplanada mirava o longo prazo, o ministro sentou com Tarcísio de Freitas (Infraestrutura) e Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional) e pediu ações e listas de obras que poderiam ser tocadas assim que passasse a pandemia.
Em outra frente, o ministro, ao lado do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), é o responsável também pela estratégia de atrair partidos para o governo e, de quebra, distensionar a relação com o Congresso.

Com informações de Renato Onofre e Julia Chaib, Folha de São Paulo