Mariana Sanches e Sérgio Roxo - O Globo
Ex-senadora e ex-presidente tucano têm conversado sobre a crise
Sem partido, sem mandato e distante de Lula, aquele que, por muitos anos, foi sua principal referência na política, a ex-senadora Marina Silva tem se aproximado do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Em entrevista ao GLOBO, ela confirmou que conversou com o tucano sobre a crise política e econômica do país “duas ou três vezes” neste ano.
Já com Lula, seu último contato foi durante o tratamento contra o câncer a que o ex-presidente se submeteu entre 2011 e 2012. Marina encerrou a campanha eleitoral do ano passado com queixas à estratégia de ataques adotada pelo PT para desconstruir sua candidatura. No segundo turno, declarou apoio a Aécio Neves (PSDB-MG) contra Dilma Rousseff (PT).
A ex-senadora afirmou que os contatos com Fernando Henrique não visam a alianças políticas futuras:
— Temos conversado sobre o momento, quais as melhores maneiras de caminhar com a responsabilidade que o país exige, sem a ansiedade de instrumentalizar a crise em benefício próprio ou com agendas ocultas eleitorais.
Marina também tem feito elogios públicos ao tucano. Em artigo em sua página na internet há um mês, destacou “o exemplo de lucidez e responsabilidade republicana de Fernando Henrique”.
MARINA LUTA CONTRA ISOLAMENTO PARA MONTAR REDE
Sete meses depois da eleição, Marina Silva ainda busca um espaço para sua atuação política. O partido que ela tenta viabilizar desde 2013, a Rede Sustentabilidade, aguarda que os cartórios eleitorais validem 5 mil assinaturas para que o pedido de registro possa ser enviado ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Recentemente, a legenda embrionária sofreu mais um revés: uma lei aprovada no Congresso impede partidos novos de ter acesso a cotas do Fundo Partidário e a tempo de televisão, mesmo com adesão de parlamentares. Se antes integrantes da Rede cogitavam atrair entre seis e nove parlamentares, agora a expectativa é que apenas dois ou três deputados federais ingressem no novo partido.
Formalmente, Marina é ligada ao PSB, mas não se considera filiada ao partido no qual ingressou apenas para ser vice na chapa de Eduardo Campos, depois que a Rede teve o registro negado. A ex-senadora diz que seu desligamento da legenda é certo, mas sem data para acontecer. Enquanto isso não acontece, ela desidrata junto ao eleitorado. Uma sondagem feita pelo Instituto Datafolha em abril aponta que sua atração sobre o eleitor diminuiu ainda mais desde o pleito de 2014: ela aparece com apenas 14% das intenções de votos. Na eleição, ela obteve 21,3% dos votos válidos. Eleitores e correligionários reclamam da timidez de suas manifestações contra o governo — restritas a posts de internet e entrevistas. Com poucos eventos públicos, sua primeira aparição no Congresso Nacional aconteceu apenas seis meses depois da eleição. Acompanhada por caciques indígenas, Marina teve dificuldade para encontrar políticos que a ciceroneassem nos corredores da Câmara, segundo quem acompanhou a visita.
Marina, no entanto, minimiza parte dos problemas que enfrenta. Afirma que não é possível medir queda de voto fora do período eleitoral:
— Não estou no lugar de candidata e não quero ficar preocupada com oscilação de pesquisa.
Mas reconhece que mesmo aliados próximos podem desistir de cerrar fileiras na Rede.
— Há níveis e níveis de engajamento. Tem pessoas que estavam engajadas solidariamente, que não vão sair de seus partidos mas estavam nos ajudando — afirmou Marina, que completou: — Mesmo antes da mudança da lei nós não fazíamos um esforço de ficar recrutando parlamentares por causa de tempo de TV.
Diante das dificuldades de competição impostas pela nova legislação, Marina se mostrou disposta a recorrer à Justiça para ter os mesmos benefícios dos demais partidos.
— Nosso processo teve início ainda com as regras anteriores e está em aberto. Os advogados saberão melhor como lidar com essa questão — disse.
Marina afirmou ainda que sua atuação é condizente com aquela de uma política sem mandato, avaliou que sua decisão de apoiar Aécio no segundo turno de 2014 foi acertada, mas se recusou a falar sobre o comportamento do tucano diante da crise do governo Dilma.
E afirmou não ter conversado com ele sobre a situação política após as eleições.
A respeito do governo petista, ela voltou a afirmar que Dilma vive uma “cassação branca” e o país passa por um momento “dramático” de sua história.
— A maior gravidade da crise é a falta de reconhecimento da crise por parte do governo. O governo toma medidas dramáticas sem reconhecer que existe uma crise — afirmou, em referência aos cortes do ajuste fiscal.