domingo, 31 de maio de 2015

Após ajuste, Planalto tenta conter ataques do PT contra Levy

Vera Rosa - O Estado de São Paulo

Temor da Presidência é ver congresso do partido, marcado para meados de junho, ser palco de ataques à política econômica

O Palácio do Planalto iniciou uma ofensiva para conter a hostilidade contra o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, no 5.º Congresso do PT, que ocorrerá de 11 a 13 de junho, em Salvador (BA). Preocupados com o tom da resolução política a ser aprovada no encontro, no momento em que o PT e o governo enfrentam sua mais grave crise, ministros petistas procuraram dirigentes do partido e pediram cautela nas manifestações anti-Levy. 
Desde que foram escancaradas as divergências entre o titular da Fazenda e o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, na esteira da divulgação do corte no Orçamento - que ficou em R$ 69,9 bilhões -, a presidente Dilma Rousseff procura abafar os ruídos na equipe. 
Da esquerda para a direita, o presidente do Banco Central Alexandre Tombini, o ministro da Fazenda Joaquim Levy, e o ministro do Planejamento Nelson Barbosa, no salão leste do Palácio do Planalto, em Brasília.
Da esquerda para a direita, o presidente do Banco Central Alexandre Tombini, o ministro da Fazenda Joaquim Levy, e o ministro do Planejamento Nelson Barbosa, no salão leste do Palácio do Planalto, em Brasília.
O receio do Planalto, porém, é que o PT jogue mais combustível na crise durante a reunião de Salvador, provocando desconfianças e agitando novamente o mercado financeiro. Convocado para debater o programa do PT e atualizar o projeto do partido, em meio a sucessivos escândalos de corrupção, o congresso petista deve ser tomado, na prática, por críticas à gestão de Dilma e pressões por mudanças na política econômica. 
Chicago Boy. Nos bastidores, parlamentares do PT chamam Levy de “Chicago Boy”, numa referência à Universidade de Chicago, identificada com a visão neoliberal, onde Levy se graduou Ph.D. Ex-secretário do Tesouro no governo Lula, Levy é considerado pela maioria do PT como a encarnação do mal por causa de suas ideias “ortodoxas”. 
Embora o PT esteja dividido sobre a conveniência de pedir a cabeça do ministro, a avaliação predominante no partido é que o modelo de ajuste fiscal adotado porá a economia nas cordas, tornando o crescimento inviável. O diagnóstico é que a tesourada nos gastos, o corte de programas sociais e as restrições criadas a direitos trabalhistas, como seguro desemprego, travam o desenvolvimento e afastam ainda mais o PT de sua base social. 
A disputa que atiça o PT nesta temporada é pelos rumos do governo Dilma pós-ajuste e por maior protagonismo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na distante relação com o Planalto. Acuado, o partido também tenta reagir para salvar sua imagem, ainda mais abalada após a Operação Lava Jato, da Polícia Federal, que culminou com a prisão do então tesoureiro João Vaccari Neto. 
Nesse cenário, nove entre dez petistas recorrem ao ministro Nelson Barbosa, visto como “desenvolvimentista”, na tentativa de criar um contraponto a Levy. O movimento contraria Dilma - que decidiu prestigiar o titular da Fazenda - e preocupa a equipe de Barbosa. Inflado pelo PT, o titular do Planejamento teme sair enfraquecido do embate. 
Queda de braço. O confronto reedita uma queda de braço travada no primeiro mandato de Lula, tendo à época Antonio Palocci (Fazenda) na linha de tiro. Em novembro de 2005, Dilma, então chefe da Casa Civil, chegou a chamar de “rudimentar” o ajuste fiscal de longo prazo proposto por Palocci. Agora, no entanto, não esconde o aborrecimento com o “fogo amigo”. 
“É possível que existam críticas ao ministro Levy e as divergências são normais, mas o PT deve entender que o próprio projeto do partido passa pelo sucesso do governo Dilma”, disse o líder do governo no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS). “Não podemos, depois de todo o esforço para aprovar as medidas provisórias do ajuste, dar motivos para insegurança.”
Em conversas reservadas, Lula não esconde o desconforto com a inflexão na economia e a demora do governo em virar a página do ajuste fiscal, criando uma agenda positiva.
Lula está aflito por entender que, se a rota não for corrigida a tempo, o PT sentirá ainda mais o peso do desgaste nas eleições municipais de 2016, podendo sucumbir na disputa presidencial de 2018. 
No Planalto, dois ministros fazem hoje a “ponte” entre o governo, a direção do PT e os movimentos sociais. Um deles é Edinho Silva, titular da Secretaria de Comunicação Social. O outro é Miguel Rossetto, que comanda a Secretaria-Geral da Presidência. Próximo a Dilma, Aloizio Mercadante (Casa Civil) distanciou-se da cúpula petista. 
Reinvenção. Assessor especial da Presidência, Marco Aurélio Garcia ajudou a redigir o manifesto da tendência Construindo um Novo Brasil (CNB), que será apresentado no congresso do PT. Assinado pela corrente majoritária, integrada por Lula, o documento faz uma autocrítica, no rastro dos escândalos de corrupção - do mensalão à Petrobrás - e diz que o partido precisa se “reinventar”. O que mais chama a atenção no texto, porém, são os ataques à política econômica conduzida por Levy. 
“Não se pode fazer da necessidade de sanear a situação fiscal a ocasião para a apologia de uma política econômica conservadora, cujas consequências bem conhecemos”, assinala o documento. 
Para o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), a estratégia central do governo tem de ser o crescimento, e não o ajuste fiscal.
“Não podemos ficar nesse samba de uma nota só”, insistiu Lindbergh, após votar contra a MP que dificultou o acesso ao seguro-desemprego. “Não é só o governo Dilma que está em jogo. É o nosso futuro, do PT e da esquerda.”
O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), discorda do colega. “Levy faz o que Dilma pede. Então, quem critica Levy está criticando Dilma”, argumentou Guimarães. “Uma coisa é criticar o ajuste e outra é pedir a cabeça do ministro. Isso não dá para aceitar.”