sexta-feira, 1 de maio de 2015

"Renan e o fisiologismo", por Bernardo Mello Franco

Folha de São Paulo


Em um Congresso praticamente vazio, que manteve a tradição de se antecipar aos feriados, o senador Renan Calheiros surpreendeu nesta quinta ao incluir o vice-presidente Michel Temer na mira de sua metralhadora giratória.

Renan bateu duro no novo coordenador político do governo, responsável pela partilha da máquina entre aliados. O senador acusou Temer de atuar como "articulação de RH, para distribuir cargos e boquinhas". "O pior papel que o PMDB pode fazer é substituir o PT naquilo que ele tem de pior, que é o aparelhamento do Estado", disparou.

Toda crítica ao fisiologismo é bem-vinda em um país cujo governo mantém 38 ministérios e mais de 22 mil cargos comissionados para saciar o apetite de políticos. O curioso é ouvir esse discurso da boca de Renan, reconhecido como um exímio praticante do toma lá, dá cá.

O alagoano sempre esteve próximo do Planalto. Foi líder de Collor, ministro da Justiça de FHC e presidente do Senado nas gestões Lula e Dilma. Atuou como fiel escudeiro dos petistas, que retribuíram a fidelidade com favores e nomeações.

O fim da lua de mel coincidiu com a demissão de seu afilhado Vinicius Lages do Ministério do Turismo, há duas semanas. Ele perdeu o cargo para dar lugar a outro peemedebista, Henrique Eduardo Alves, próximo ao deputado Eduardo Cunha.

Inconformado com a troca, Renan recusou ofertas no segundo escalão e empregou Lages no Senado. Foi como assessor parlamentar que o ex-ministro ouviu nesta quinta, discretamente, o novo discurso do chefe.
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Até outro dia, a oposição acusava Dilma de abusar dos pronunciamentos em cadeia nacional. Neste 1º de Maio, devia mudar de tática e constrangê-la a mostrar a cara na TV.

Nessa, Renan tem razão: a presidente só cancelou o pronunciamento porque teme outro panelaço e não tem nada a dizer aos trabalhadores.