domingo, 10 de maio de 2015

"Baterias de futuro", editorial da Folha de São Paulo

O lançamento de nova geração de baterias pela empresa americana Tesla, que já fabrica carros elétricos esportivos, causou agitação há uma semana. O evento publicitário atraiu muita atenção para suas aplicações domésticas, mas é no ramo de geração e distribuição de eletricidade que ela carrega maior potencial para disrupção.

Trata-se de um novo produto, não de uma revolução tecnológica. A inovação está em alojar baterias de íons de lítio já usadas em automóveis numa caixa que pode ser afixada na parede das casas.

Acoplada a painéis solares, a chamada Powerwall pode tornar residências independentes da rede elétrica. De dia, acumula a eletricidade obtida da luz do Sol; depois, passa a liberar energia para os eletrodomésticos.

O custo, porém, só é convidativo para consumidores novidadeiros: US$ 5.000 por 10 kW (quilowatts) instalados, o suficiente para alimentar uma casa por várias horas. Mesmo que não instale placas fotovoltaicas, o cliente poderá carregar a bateria na corrente regular e usá-la em apagões, por exemplo.

Elon Musk, o empresário sul-africano à frente da Tesla, quer mais: mudar o mundo, começando pelo sistema elétrico. Sua estratégia, ousada, se baseia numa drástica redução de preço no segundo produto lançado, o Powerpack.

Trata-se de um grupo de baterias acondicionado num console do porte de geladeiras e com capacidade de 100 kW. Ligadas em série, seus arranjos atingem a escala de megawatts (MW, equivalente a mil kW). Nos cálculos de Musk, 2 bilhões desses aparelhos poderiam fornecer toda a energia hoje consumida no planeta.

Atualmente, uma das principais desvantagens das energias renováveis, como a eólica (ventos) e a solar, é sua intermitência (geração interrompida com ventos fracos e à noite, respectivamente). Na cultura do setor elétrico brasileiro, essas fontes alternativas seriam por isso incapazes de dar segurança ao sistema.

Para enfrentar o risco de blecautes, o país se tornou dependente de termelétricas a combustíveis fósseis, cuja queima piora o efeito estufa. Em 2013, 18,6% da eletricidade gerada vinha de tal fonte.

Outros 76,8% provieram de renováveis (68,6% de hidrelétricas, 7% de biomassa, 1,2% de usinas eólicas). A participação de painéis solares é desprezível, com apenas 500 sistemas instalados aqui, contra 1,4 milhão na Alemanha.

Baterias eficientes e baratas podem alterar o panorama. Analistas previam que seu limiar de competitividade estava em US$ 350/kW, o que só seria atingido em 2020. Cinco anos antes, a Tesla chegou a US$ 250/kW na versão Powerpack.

Nesse ritmo, embora a energia fotovoltaica comece finalmente a aparecer no radar do governo federal, o sistema elétrico brasileiro terá de correr muito para não perder a nova onda de inovação.