SANTIAGO - AFP e REUTERS
O presidente do Chile, Sebastián Piñera, convocou oficialmente, nesta sexta-feira (27), por meio de um decreto supremo, um plebiscito constitucional para 26 de abril.
Considerada histórica, a votação decidirá se a Constituição herdada da ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990) será alterada —uma das demandas das manifestações que abalam o país há pouco mais de dois meses.
"Quero convocar com muita alegria e entusiasmo todos nossos compatriotas a participar do plebiscito a ser realizado em 26 de abril de 2020", anunciou o mandatário, que chegou ao poder em março de 2018 com postura contrária à alteração da Constituição, algo que havia sido considerada no governo de sua antecessora, a esquerdista Michelle Bachelet (2014-2018).
Piñera promulgou na segunda (23) a lei que permite convocar o plebiscito para decidir a mudança da Constituição, após um acordo político em resposta às reivindicações dos protestos que eclodiram em 18 de outubro e já deixaram ao menos 26 mortos.
Os manifestantes, assim como alguns pesquisadores, consideram a Carta atual uma das causas das desigualdades que acometem o Chile, além de criticar a ausência de dispositivos que garantam ao Estado oferecer educação e saúde como direitos.
Questionam também a legitimidade do texto, que foi sancionado em 1980 sob um governo autocrático.
Pesquisas mostram que o apoio popular ao movimento superava 75% em novembro, o que levou Piñera a reconsiderar a reação dura que vinha dando às manifestações, com repressão policial e mobilização do Exército. Um índice similar da população chilena, segundo os dados, se mostrava favorável a uma nova Constituição.
Os protestos começaram como crítica à alta da tarifa de metrô, já revogada, e passaram a questionar a desigualdade social e o aumento do custo de vida, ampliando suas ambições para reivindicar uma mudança profunda no país.
Na consulta a ser feita em abril, os chilenos devem responder a duas perguntas: se querem ou não uma nova Constituição e que tipo de órgão deve escrever essa nova Carta Magna.
Uma das alternativas é "uma convenção constitucional inteiramente composta por pessoas eleitas" pelo povo, detalhou Piñera nesta sexta. Outra é "uma convenção constitucional mista, na qual haverá metade eleita diretamente e a outra metade eleita pelo Congresso".
Segundo o ministro do Interior, Gonzalo Blumel, em novembro, quando o presidente sinalizou pela primeira vez com a mudança constitucional, a ideia é que o processo se desenrole por meio de um Congresso Constituinte, com ampla participação cidadã e um plebiscito para depois ratificar a nova Carta.
A atual Constituição não estabelece mecanismos para substituí-la nem dá ao presidente a possibilidade de convocar um plebiscito.
"Nós, chilenos, teremos a primeira palavra para escolher quais caminhos queremos seguir e quais mecanismos queremos adotar. E se uma convenção constitucional for acordada, nós chilenos também teremos a última palavra, porque haverá um plebiscito ratificador, para que a participação dos cidadãos seja ampla e eficaz", frisou Piñera nesta sexta.
O presidente indicou que a Constituição deveria ser o grande marco de unidade e estabilidade para a sociedade chilena, que segundo ele, tem diferenças legítimas internamente, “mas sociedades civilizadas as resolvem dentro da estrutura da Constituição, e não fora”.
Piñera sublinhou a importância de que a população vá as urnas, já que o voto no Chile não é obrigatório.
A eleição de 2013, vencida por Bachelet e primeira na qual o comparecimento era voluntário, registrou forte queda na participação, sobretudo entre os jovens, que hoje protagonizam o movimento social que abala o país.
Segundo dados eleitorais, menos de 50% participaram das eleições presidenciais e menos de 40% nas de prefeitos e vereadores.
Na eleição de 2017, quando Piñera voltou ao poder, houve abstenção de 60%.
Por isso, além das campanhas pelo "sim" ou "não" sobre a mudança constitucional, há outra, favorável a reinstaurar o voto obrigatório no país de 18 milhões de habitantes.