Desde que o deputado Eduardo Cunha foi cassado — por isso perdeu o foro especial no Supremo, teve os processos transferidos para a 13ª Vara Federal de Curitiba, depositados sobre a mesa do juiz Sérgio Moro —, era esperada a decretação da prisão do político sem mandato. Até ele próprio manteria mala de viagem pronta.
Usou-a ontem à tarde, depois de ser preso em Brasília e transferido para a carceragem da Lava-Jato na capital do Paraná. Detido em regime de prisão preventiva, não há data para ser libertado. A aposta unânime na prisão de Cunha se devia ao robusto conjunto de acusações acumuladas no MP contra ele e à própria perda da imunidade parlamentar.
Moro justificou o mandado de prisão, entre outras razões, por entender que o ex-deputado ainda tem poderes para prejudicar a Lava-Jato, e diante do risco de fuga do denunciado para o exterior — Cunha também possui passaporte italiano. E certamente recursos no exterior.
Levaram o juiz a aceitar este pedido de prisão feito pelo MP a existência comprovada de contas bancárias na Suíça não declaradas pelo ex-deputado e o caso de recebimento de propinas na compra pela Petrobras de um campo petrolífero em Benin, na África. Há mais denúncias em trânsito que podem manter o ex-deputado fora de circulação um bom tempo.
Poucos simbolizaram a impunidade dos políticos como ele. E por isso mesmo sua prisão é um alento e forte impulso ao processo, que não é de hoje na sociedade brasileira, de fortalecimento do Estado como zelador da aplicação das leis, não importando sobre quem.
Hábil manipulador do regimento da Câmara, Cunha assumiu posto de líder de bancada e a presidência da Casa, quando mostrou não ter limites no uso do poder em favor de si mesmo, no achaque de pessoas e empresas, exemplo rotundo de patrimonialismo, marca negativa da vida pública no país. Foi peça importante no impeachment de Dilma, de quem fora aliado mas acusava de trabalhar contra ele. Dilma não conseguiu escapar por dizer-se vítima. Afinal, os crimes de responsabilidade cometidos por ela eram mesmo graves.
A prisão de Cunha é um daqueles sinais fortes, e necessários, de que as instituições continuam a se fortalecer, independentemente de reações de políticos investigados. Alguns deles atuando às claras para aprovar no Congresso obstáculos legais à atuação do MP, da Justiça e da Polícia Federal. É o caso do projeto de lei contra supostos abusos de autoridade.
Um primeiro forte sinal das instituições foi emitido no processo do mensalão, em cujo desfecho terminaram presos petistas poderosos, José Dirceu o principal deles. Há pouco indultado daquela pena, mas que continua encarcerado pela atuação no petrolão, esquadrinhado pela Lava-Jato, em cujas redes também se encontra o ex-presidente Lula.
A prisão agita o mercado de especulações sobre desdobramentos políticos no governo Temer, no PMDB de modo geral, e, à esquerda, no PT e satélites, caso o ex-deputado decida fazer um acordo de delação premiada à Lava-Jato. Moro e a força-tarefa de Curitiba têm o trunfo dos inquéritos sobre os benefícios usufruídos por Cláudia Cruz, mulher de Cunha, e a filha dele, Danielle, com o dinheiro sujo arrecadado pelo marido e pai.
Livrar a família de penas de prisão em regime fechado pode ser um incentivo para que Eduardo Cunha testemunhe sobre os subterrâneos que frequentou nos governos lulopetistas, em que o PMDB, principalmente a partir do segundo mandato de Lula, passou a ter fácil trânsito. Muita gente começou a ficar mais inquieta com a prisão de ontem.