Por Gabriel Garcia
Marina Silva, candidata à Presidência da República pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), nunca foi uma onda. É o que garante a socióloga Fátima Pacheco Jordão, especialista em análise de pesquisas eleitorais.
Pelo contrário. Substituta de Eduardo Campos na corrida presidencial, Marina representa a insatisfação do brasileiro, que invadiu em meados do ano passado as ruas do país em busca de melhores serviços públicos.
Aos 62 anos de idade, a socióloga afirma que Marina capitalizou os votos dos eleitores descrentes com a política por passar credibilidade no seu discurso.
A socióloga considera delicada a situação do candidato do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), o senador Aécio Neves, terceiro nas pesquisas de intenção de voto. E vê estacionada a candidata do Partido dos Trabalhadores (PT), a presidente Dilma Rousseff.
Segundo ela, Aécio e Dilma têm a missão de encontrar um “discurso que motive, que represente a vontade da sociedade”.
A candidatura de Marina vai manter o fôlego ou é apenas uma onda?
Não é uma onda, o que ficou claro desde a primeira pesquisa. Ela cresce horizontalmente, em vários segmentos. As ondas mexem apenas com pessoas mais sensíveis. O voto consolidado (espontâneo) de Marina subiu: passou para 22%. Ela ocupa um espaço de pessoas indecisas, que iriam votar em branco. Eram pessoas que tinham com clareza a expectativa que mudaria alguma coisa, com alguém que preenchesse as demandas da sociedade.
O que impulsionou o desejo de mudança da sociedade?
O desejo vem antes mesmo da morte de Eduardo Campos. Não havia um candidato que respondesse a essa demanda. A Marina falou com clareza e as pessoas acreditaram. A população queria mudança, que não represente apenas disputa de poder, mas uma possibilidade de contribuição. A Marina respondeu o saúde padrão Fifa com o programa padrão Brasil.
Por que apenas Marina conseguiu capitalizar os votos dos eleitores insatisfeitos?
O sistema político, os partidos e os candidatos não tinham mais credibilidade. Num primeiro momento, o eleitor desprezou os partidos. Num segundo, votou em candidatos gozadores do sistema, como Tiririca. O governo Lula consolidou uma mudança que vem desde o Plano Real: a inflação e o dinheiro começaram a ter consistência. Esse processo deu ao cidadão capacidade de compra. Mudou-se o padrão de exigência. A Marina passa credibilidade daquilo que está falando.
O sistema político, os partidos e os candidatos não tinham mais credibilidade. Num primeiro momento, o eleitor desprezou os partidos. Num segundo, votou em candidatos gozadores do sistema, como Tiririca. O governo Lula consolidou uma mudança que vem desde o Plano Real: a inflação e o dinheiro começaram a ter consistência. Esse processo deu ao cidadão capacidade de compra. Mudou-se o padrão de exigência. A Marina passa credibilidade daquilo que está falando.
Por que o Aécio Neves não representou o nome da mudança?
Não foi problema de rede política ou de apoio de partido. Foi desempenho pessoal mesmo. Provavelmente, ele continha contradições em sua carreira profissional, ou não com a ênfase necessária. É provável que ele tenha feito gestos de mudança através de um código que a população não entende, como retornar padrões de macroeconomia mais confiáveis, com previsibilidade.
Quando foi que o cenário atual começou a se desenhar?
Houve um processo gradual, mas lógico de construção da cidadania. A redemocratização significou a dimensão do cidadão eleitor. O Plano Real, com a estabilidade da moeda, sinalizou para o eleitor questões mais profundas, como a inflação. No governo Lula, houve o consumo dentro de um padrão civilizado. Ele começa a adquirir a dimensão do contribuinte, daquele que paga imposto. Quando isso vem às ruas, sabe que um investimento pode ser feito com qualidade. Desde junho, o brasileiro percebeu que não houve resposta.
Há tempo suficiente para os candidatos Aécio e Dilma reverterem o crescimento acentuado de Marina?
Há. Agora, é muito mais difícil corrigir rumos de uma coisa perdida, no caso do Aécio. No de Dilma, ela está em um patamar cujo tempo é curto. Há meses não há mudança no seu estoque de votos. Dilma parece estacionada. As viradas políticas e eleitorais se dão no momento em que a população sente o colapso do fim do ciclo. Ou ela vai para a rua e grita, ou ela vota de uma maneira inesperada.
Terá efeito a estratégia de desconstrução da imagem de Marina, que começa a ser adotada por Dilma e Aécio?
Precisamos entender que argumentos os candidatos usam. O argumento do avião é paradoxal e contraditório. A população não acreditou. É um caso em que a população associa a Eduardo Campos. Não é um problema da Marina, que dava apenas um apoio a Eduardo Campos. Tal paradoxo pareceu bastante frágil. Se os adversários encontrarem uma formulação verdadeira, evidente que pode abalar.
Quais são as maiores inquietações que as pesquisas das últimas semanas trouxeram para os candidatos?
A nova qualidade do eleitor. A inquietação é encontrar, tanto da parte de Dilma quanto da parte de Aécio, um discurso que motive, que represente a vontade da sociedade. Aumentar o seu espaço eleitoral não está em ataque a adversários. A crítica convencional, como a Marina é incoerente, a Marina não tem partido, a Marina é sonhadora, é vista como não esclarecedora.
Temas religiosos, como aborto, estiveram presentes nas eleições passadas. Como será na eleição atual?
Tenho impressão que este tema está voltando não mais contra as mulheres, mas a favor das mulheres. É uma questão de foro íntimo, mas que não pode criminalizar mulheres que façam aborto. Essa questão não terá a mesma função da eleição passada, de desmontar candidatos.
Em 2010, os institutos de pesquisa não previram o crescimento de Marina na reta final. Por que ainda verificamos divergências nos números apresentados por institutos?
Aconteceu na eleição passada uma mudança como está ocorrendo agora. Os institutos apontaram esse crescimento (da Marina) que aconteceu nas três semanas que antecederam as eleições, o que está associado ao perfil das pessoas que esperam até o último momento para decidir. Trata-se de uma parcela de 10% a 15% de eleitores.