terça-feira, 16 de setembro de 2014

"Instituições funcionam no caso Petrobras", editorial de O Globo

Assim como na investigação, denúncia e julgamento do mensalão, instrumentos do Estado atuam para esclarecer o desvio de cifras incalculáveis da estatal



rasil, nos últimos doze anos, período em que o PT se mantém no Planalto, adotou uma diplomacia de aproximação com a América Latina. Infelizmente, com o pior do continente, o bolivarianismo chavista. No entanto, ainda bem, a nação repele a importação do pacote chavista completo: a subordinação do Poder Judiciário ao Executivo, a captura, enfim, das instituições do Estado por um partido ou corrente político-ideológica.

No início dos anos 1990, o país, ainda numa primeira etapa da redemocratização, deu surpreendente demonstração de estabilidade e maturidade institucionais com o impeachment de Fernando Collor e a posse do vice Itamar Franco, como previsto na Constituição. Era um ótimo sinal.

Com o mensalão, revelado em 2005, veio a confirmação de que a democracia representativa se fortalecera. Pois uma conspiração articulada na antessala do presidente Lula, a partir do chefe da Casa Civil José Dirceu, e com apoio na cúpula do PT, para desviar dinheiro público a fim de comprar apoio parlamentar ao governo, foi investigada, denunciada ao Supremo e este decidiu pela condenação de mensaleiros, entre eles gente poderosa, como Dirceu.

Não importou que boa parte dos ministros da Corte houvesse sido indicada por Lula e Dilma. Funcionou a instituição, e se fortaleceu um padrão de postura na Corte. O escândalo em curso na Petrobras segue, até agora, pelo mesmo caminho. Maior empresa do país, ela foi dominada por uma corrente lulopetista com ramificações sindicais. Uma aliança poderosa. Mas incapaz de impedir desdobramentos, indesejados pelo PT, da investigação realizada pela Polícia Federal, Ministério Público e Justiça Federal do Paraná, sobre a lavanderia bilionária do doleiro Alberto Youssef, da qual o diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, era cliente.

A candidata à reeleição Dilma Rousseff tem se vangloriado, em campanha, de a Polícia Federal investigar casos de corrupção. É louvável que a presidente aplauda o combate aos “malfeitos”. Mas a PF funciona, e deve ser sempre assim, independentemente da vontade dela ou de quem esteja no Planalto e no Alvorada. E é dever do chefe da nação permitir que os instrumentos de Estado funcionem como estabelece a lei, protegidos de qualquer interferência indevida. Inclusive a sua.

O esquema de lavagem financeira de Youssef processou muitos bilhões. Parte da dinheirama foi canalizada por Paulo Roberto Costa, funcionário de carreira da estatal, mas colocado na diretoria da empresa em 2004, no primeiro governo Lula.
Ele negocia trocar revelações por redução de pena. Se houver acordo com a Justiça, incluindo o Supremo, pois há parlamentares citados no processo, pode-se esclarecer aos detalhes o percurso seguido no submundo da política pelo dinheiro saqueado na estatal.
Assim como no mensalão, poderosos de turno não têm interesse em que a investigação prossiga. Paciência. O Estado nada tem a ver com isso.