No xadrez global, onde as peças se movem com a imprevisibilidade de um roteiro hollywoodiano, a semana trouxe lances que expõem fraquezas e redefinem alianças e forças
I maginem a ironia: Lula, o autoproclamado líder do Sul Global, recebendo uma carta afetuosa do Hamas em 2024, agora comportado ao telefone com Trump, o showman que faz o mundo dançar ao som de “América Primeiro”.
Na segunda-feira, 6 de outubro de 2025, o mundo assistiu a um espetáculo improvável: Lula e Trump, separados por um oceano de ideologias, trocaram 30 minutos de conversa em uma videochamada. O papo, centrado em comércio e economia, incluiu promessas de encontros presenciais. Lula implorou pela revisão das tarifas adicionais de 40% impostas por Trump, uma retaliação ao julgamento de Jair Bolsonaro, condenado a 27 anos em um processo que escancarou o lado político do Supremo Tribunal Federal em uma enorme farsa judicial.
A conversa, da qual Lula fugia como o diabo foge da cruz desde 9 de julho, quando Trump anunciou as tarifas, foi um banho de realidade. Lula, que em 2024 chamou a vitória de Trump de “volta de um novo fascismo”, teve que engolir o orgulho para cortejar um líder que representa tudo o que ele abomina: soberania americana, livre mercado e valores judaico-cristãos. O destino caprichou na ironia: o campeão do Sul Global, sonhando com Brics e utopias multilaterais, agora precisa de Trump para salvar, por exemplo, o café brasileiro nas prateleiras americanas. O degelo é um lance de abertura, mas não engana. As sanções contra o STF seguem intocadas, e Trump, mestre do teatro, estica a corda antes de puxá-la com força.
Trump fez o que sempre faz: com sua veia de showman, ele postou no Truth Social que a conversa havia sido “muito produtiva”, enquanto Lula apelou aos “201 anos de amizade” entre Brasil e EUA. Platitudes no lugar de diplomacia séria. Enquanto Lula tentava salvar a pele com falsos sorrisos, Trump jogou seu soldado impiedoso no tabuleiro. A escolha de Marco Rubio, o falcão da Flórida, para liderar as negociações com o Brasil colocou Lula em um xeque diplomático — um movimento que é um tapa com luva de pelica na agenda progressista.
O contexto histórico dá o tom. Desde janeiro de 2025, quando Trump voltou à Casa Branca, as relações entre Brasil e EUA viraram uma montanha-russa. As tarifas, anunciadas em março como resposta à perseguição a Bolsonaro e a outras violações graves de direitos humanos e contra cidadãos americanos, evocam os dias da Guerra Fria, quando Washington pressionava a América Latina a escolher lados.
Lula, com sua retórica de G20 e Brics, tentou fintar, mas a dependência comercial — os EUA engolem 20% das exportações brasileiras, de soja a carne — forçou o petista a sentar à mesa. Para o mundo, a lição é clara: ideologia não enche silo. O Brasil de Lula joga com peões de discurso, enquanto Trump move rainhas de pragmatismo.
Marco Rubio: o falcão de Trump Se o telefonema foi o aquecimento, a nomeação de Marco Rubio como negociador é o xeque que faz o Planalto suar frio. Anunciada logo após a ligação, a escolha do secretário de Estado — um cubano-americano que mastiga regimes de esquerda no café da manhã — é uma provocação digna de Sun Tzu.
Rubio, que assumiu o Departamento de Estado em maio, já chamou o STF de “máquina de perseguição judicial” em tweets que incendiaram as redes sociais. Seu currículo? Combater cartéis mexicanos, esmagar a gangue venezuelana Tren de Aragua e encurralar Maduro — um portfólio que o torna o “falcão dos falcões” e um pesadelo para o Itamaraty.
Marco Rubio - @POTUS made clear that his administration will hold accountable foreign nationals who are responsible for censorship of protected expression in the United States. Brazilian Supreme Federal Court Justice Alexandre de Moraes's political witch hunt against Jair Bolsonaro created a Mostrar mais
Na quinta-feira, 9 de outubro, Rubio ligou para Mauro Vieira, o chanceler de Lula, com um convite para uma reunião em Washington. O tom de “diálogo positivo” não enganou: o Planalto queria um tecnocrata como Robert Lighthizer, ex-Representante de Comércio dos EUA e defensor ferrenho do “America First”, cuja abordagem pragmática contrasta com o falcão ideológico Rubio nas negociações com o Brasil.
Trump poderia ter designado o próprio Secretário de Tesouro, Scott Bessent ou o Secretário de Comércio, Howard Lutnick para seguir com as negociações, mas preferiu aplicar um cruzado direto que parece saído de um filme de ação dos anos 1980. Rubio, com sua retórica próvida, pró-mercado e anti-woke, é o ídolo dos que gostam de fortes emoções e pulso firme. Rubio é a personificação da luta cubana contra o comunismo. Rubio não conversa, ele dita. Sua nomeação para tocar a delicada agenda tarifária com o Brasil anuncia que qualquer alívio nas tarifas virá com preço — talvez menos barreiras ao agronegócio, mas quem sabe uma mãozinha contra o PCC.
Lula está em xeque. Negociar com Rubio é jogar damas contra um grande mestre do xadrez: um passo em falso, e o Brasil perde a rainha.
Ceder — freando relações com ditaduras ou alinhando-se contra a China no Brics — enterra a base petista; resistir é cutucar o urso americano. Rubio carrega o DNA de Reagan, que em 1983 enviou um porta-aviões ao Caribe para intimidar Castro. Sua cruzada contra cartéis e regimes de esquerda — do México à Venezuela — ecoa a Doutrina Monroe, que em 1823 já avisava: o hemisfério é nosso. Lula, com seus devaneios de G20, enfrenta um adversário que joga com as regras de Washington, não de Brasília ou da China.
A força de Trump: um acordo de paz que desafia a história e as relações de Lula
No Oriente Médio, o contraste é gritante. Em 8 de outubro, dois anos após o ataque do Hamas que matou 1,2 mil israelenses e sequestrou 250 reféns, Trump anunciou a primeira fase de um acordo de paz. Mediado por Catar, Egito e Turquia, com Jared Kushner e Steve Wittkoff nos bastidores, o plano de 20 pontos libera 20 reféns em 72 horas (previsto para 13 de outubro), retira parcialmente as tropas israelenses para uma “linha amarela” em Gaza e troca 250 prisioneiros palestinos por 1,7 mil detidos.
Netanyahu saudou o acordo como uma “conquista histórica”, enquanto o Hamas exigiu garantias contra traições israelenses. Trump anunciou na Truth Social: “Isso pavimenta o caminho para uma PAZ FORTE, DURADOURA E ETERNA”. No entanto, Trump sabe que é preciso manter um pé atrás: isso é só a primeira fase. Desarmar o Hamas e montar um governo transitório em Gaza são minas à espera de um passo errado.
A ironia da geopolítica moderna dá um sorriso de canto de boca: Lula, o campeão do multilateralismo e defensor da causa palestina, que recebeu uma carta afetuosa do chefe do Hamas, Ismail Haniyeh, em março de 2024, com elogios à sua postura contra Israel, agora engole o orgulho para ligar para Donald Trump, o “imperialista ianque” que ele tanto criticou e pede alívio em tarifas que sufocam a economia brasileira.
Trump, com mão forte, resolve as mazelas entre Israel e o Hamas — grupo que Lula indiretamente defende ao condenar só um lado —, impondo termos que o multilateralismo de Brasília nunca sonharia. O showman virou pacificador; Lula, suplicante. Força fala mais que discursos inclusivos vazios.
O contexto histórico dá peso. Trump mobilizou Catar (financiador do Hamas), Egito (guardião de fronteiras) e Turquia (apesar de antiIsrael, pragmática) para costurar o acordo. Kushner, o cérebro por trás dos Acordos de Abraão, reforça a continuidade de uma diplomacia que troca ideologia por resultados. Assim como Trump força a paz em Gaza, Rubio pode forçar o Brasil a alinhar-se com o Ocidente conservador.
Ecos de Reagan: “Peace Through Strength”
Para entender a jogada de Trump, nada melhor que convocar o velho cowboy do conservadorismo, Ronald Reagan, cujo mantra “peace through strength” — paz através da força — ainda faz esquerdistas tremerem. Em seu famoso discurso em março de 1983, Reagan não enrolou: “We maintain the peace through our strength; weakness only invites aggression.” Em bom português: a fraqueza é um convite ao caos; a força é o passaporte para a ordem. Reagan, com mísseis apontados para Moscou e um sorriso de Hollywood, desmontou a União Soviética sem disparar um único tiro. E Trump, com seu cabelo inconfundível e tuítes em letras maiúsculas, é o herdeiro que pegou o chapéu de cowboy e saiu atirando, sem dar um único tiro.
No Oriente Médio, Trump canaliza Reagan com precisão cirúrgica: sanções ao Irã, pressão no Catar e um ultimato ao Hamas — “negocie ou sumirá do mapa”. Nada de mesinhas multilaterais. É diplomacia de mostrar o porrete, com resultados que Lula, com seus laços com o Hamas, inveja enquanto discursa no G20. Trump faz o Hamas obedecer, como Reagan fez com Gorbachev.
No Brasil, o reaganismo de Trump brilha com Rubio. Enviar um falcão como ele para negociar com Lula é como Reagan mandando um portaaviões para intimidar Fidel Castro, E, bem, como funciona. Rubio, com seu sotaque de Miami e ódio visceral ao comunismo, é a encarnação da força que Reagan pregava: nada de papo furado, apenas termos claros. Lula, preso no xeque, enfrenta o mesmo dilema dos soviéticos nos
Comentário anos 1980: ceder à força americana ou ficar isolado, choramingando em cúpulas irrelevantes. A realidade bate forte: enquanto Lula sonha com um mundo de mãos dadas, Trump e Rubio jogam xadrez com peças de ferro, e o Brasil dança ao som de um hino reaganista: “América forte, mundo em ordem”. Reagan aprovaria com aquele sorriso carismático inesquecível: “Well done, Don. Well done.”
Ana Paula Henkel - Revista Oeste