terça-feira, 11 de outubro de 2016

Favoráveis à medida, especialistas apontam problemas da PEC 241


Dyelle Menezes - Contas Abertas


A necessidade de controlar os gastos públicos não está em questão na discussão sobre a PEC 241, que limita das despesas da União. O que especialistas têm apontado, no entanto, são problemas relacionados à “forma” da proposta.
Em seu blog, Felipe Salto, especialista em contas públicas favorável à PEC do Teto, apontou as melhorias que considera necessárias ao texto da proposta. O texto foi construído em conjunto com a economista Monica de Bolle.
No texto os especialistas em destacam que não adianta aprovar algo geral e esperar que, pela força da gravidade, tudo se resolva. Trata-se de tema delicadíssimo. “A sintonia fina, desde já, é crucial”, explicam.
Confira aqui o blog do Salto!
Plenário do CongressoDessa forma, foram apontados quatro problemas da PEC em versão original, e dois novos no texto revisado e aprovado em comissão especial e agora aprovado em primeiro turno na Câmara dos Deputados.
O primeiro é o prazo. A regra continua a valer por 20 anos, o que não ocorre em lugar algum do mundo. Na maior parte dos países, há combinações de regras diferentes, por períodos menores, podendo haver revisão de tempos em tempos. “Fixar uma regra assim é como colocar a política fiscal e o país em piloto automático por período longuíssimo”, explicam.
O segundo ponto destacado pelos economistas está ligado ao primeiro. Para eles, a PEC tem efeito nulo no curto prazo, já que a inflação do ano anterior – indexador escolhido pelo governo – estará acima da inflação corrente até que o movimento de declínio e convergência ao centro da meta se consolide. Para o longo prazo, com inflação baixa, dá-se o contrário: a regra produziria um primário estratosférico.
“Se o país voltar a crescer, nada mais justo e desejável que a sociedade se beneficie disso, sobretudo com mais e melhores políticas públicas. Não se deve almejar fazer primário por fazer primário. A regra de sustentabilidade da dívida pública mostra que, para um PIB crescendo em torno de 2,5% ao ano, com inflação em torno de 4,5% e juros reais também nesta faixa, o primário exigido para estabilizar uma dívida de 85% do PIB é de 2,0% a 3,0% do PIB. Com 3%, já conseguiríamos, inclusive, imprimir uma tendência de queda do endividamento bruto”, apontam.
O terceiro problema é a incompatibilidade do teto geral quando confrontado com as regras atualmente vigentes para a correção de diversas rubricas do gasto primário. São pelo menos 14 vinculações ou indexações, que fazem com que 51% da despesa primária tenha vida própria. A Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS), o seguro-desemprego, a educação e a saúde são exemplos de gastos que têm dinâmicas constitucionalmente garantidas e que não conversam com o indexador “inflação do ano passado”. A resposta do governo a esse problema é que a reforma da previdência dará conta de livrar o gasto de uma série de amarras e, assim, o teto estará sempre garantido.
O quarto problema tem a ver com as exceções à regra. Gastos com eleições, despesas de capitalização de empresas estatais e créditos extraordinários ficarão de fora. Este último é o item mais preocupante. Em 2016, já foram mais de R$ 10 bilhões com gastos autorizados via créditos extraordinários.
Novos problemas do texto aprovado
Para os especialistas, dois novos e graves problemas apareceram no novo texto da PEC. O primeiro é a proibição de realização dos chamados créditos orçamentários suplementares, mesmo no caso de despesas obrigatórias. Por exemplo, se houver algo imprevisto no número de benefícios previdenciários de um determinado ano e a despesa precisar ser incrementada, isso estará proibido. Sobraria utilizar o tal crédito extraordinário, livre do limite global, que, pelo regramento atual, só pode ser usado em casos de calamidade.
“A proibição da realização de despesas adicionais, justificadas e aprovadas pelo Congresso, por meio de créditos suplementares, contraria a lógica do processo orçamentário existente. O governo quer forçar a aceitação de espécie de orçamento impositivo sem discutir isso com ninguém”, afirmam.
A outra brecha para poder realizar algum gasto adicional será o cancelamento de despesas discricionárias, isto é, dos investimentos. Se houver superação da estimativa de receita tudo irá para o primário ou para reduzir o estoque de restos a pagar, não há escolha de política econômica.
O segundo novo problema é o mais grave de todos, avaliam os economistas. Na lista de sanções previstas no texto final – são oito – o governo determinou que, em caso de descumprimento do teto, as despesas obrigatórias não poderão sofrer reajuste. O dispositivo abrange, também, o salário mínimo. Pela Constituição, está garantido que o salário mínimo não poderá ter perdas reais. No entanto, a lei que reajusta o mínimo é ordinária: aquela que garante o PIB de dois anos antes mais a inflação, até 2019. Essa lei será atropelada por esse novo regramento.
“A verdade é que não se faz política econômica no tapetão. Ou bem se tem um programa fiscal claro, que ataque os nossos problemas centrais, ou morreremos na praia. Há tempo de mudar e de complementar a PEC do Teto, fazendo boas modificações e promovendo uma adequação do texto atual à realidade do País”, explicam.
Melhorias
Salto e De Bolle deixaram pelo menos duas contribuições que poderiam ajudar a dar robustez e força política à proposta do governo. A primeira é a fixação de um limite auxiliar para o gasto com pessoal. Os salários no serviço público têm crescido, nos últimos anos, em ritmo três vezes superior à evolução dos salários no serviço privado. Se não houver um limite claro para o gasto com pessoal, a adoção do teto geral golpeará, sem dúvida alguma, os gastos discricionários. Dito de outra forma, o investimento pagará ainda mais fortemente a conta do ajuste. Irão pelo ralo os 0,7% do PIB que hoje o governo federal investe.
A segunda proposta é adotar um limite para a dívida da União. Só assim haverá um horizonte bem definido para a política fiscal. A proposta tramita em regime de urgência no plenário do Senado. Trata-se do Projeto de Resolução do Senado (PRS) nº 84, de 2007, cujo texto substitutivo é da lavra do senador licenciado e ministro José Serra. É uma ideia interessante para fechar as brechas da PEC do Teto. Se o país souber qual o nível de dívida que deseja buscar, daqui a quinze ou vinte anos, ele poderá, com tranquilidade e bom planejamento, adotar as ações necessárias para pôr a política fiscal e a economia nos trilhos. Com calma, sim, porque todos sabemos que a dívida/PIB ainda crescerá bastante antes de começar a cair.