Com Blog do Noblat - O Globo
Olhando bem para os escombros e, ao mesmo tempo, para as múltiplas possibilidades abertas pelos resultados das urnas, no primeiro turno das eleições municipais de domingo passado – principalmente nos casos já definidos de São Paulo e Salvador, mas também do Rio de Janeiro, a se resolver no final deste mês –é inevitável a recordação de Ulysses Guimarães. Outra vez, abre-se a oportunidade de constatação da sua sabedoria, clarividência e atualidade, nesta semana em que o Senhor Diretas teria festejado 100 anos (6/10), se vivo estivesse, e que a Constituição de 1988 comemora 28 anos (5/10) de sua promulgação. A Constituição Cidadã segue firme e com vitalidade para muito mais, apesar dos trancos que tem enfren tado ultimamente. Tim Tim!!!
Brindemos em memória a “um autêntico tecelão da História”, na definição do ilustre mineiro José Aparecido de Oliveira. O homem que, na conceituação de Tancredo Neves, outro notável de Minas, “conduzia o MDB como se fosse o Supremo Tribunal Federal”. Escrever, falar e pensar sobre Ulysses, sua visão e considerações (originais na forma e preciosas e transcendentes no conteúdo) sobre a política, eleições, as coisas, as pessoas e, principalmente, a respeito do poder e suas simbologias, torna-se ainda mais essencial neste momento confuso e complicado que atravessamos.
Mas, é preciso ressaltar, não o tipo de confusão pretendido e sugerido pelo esquentado ministro do STF, Marco Aurélio Mello, no diálogo com a presidente da Suprema Corte de Justiça do Brasil, Cármen Lúcia (transmitido ao vivo pela Globo News ), depois de ser vencido (6 a 5) em seu voto de relator na histórica sessão da última quarta-feira, 5, que decidiu pela prisão de condenados em segunda instância. Crentes ou ateus sabem que o espírito iluminado de Ulysses rondou o plenário da Corte durante toda a memorável sessão de 5 de outubro. E depois seguiu sobrevoando o Planalto Central do Brasil, encantado e vigilante.
“Com respeito à minoria vencida, o Supremo decidiu que não somos uma sociedade de castas e que mesmo crimes cometidos por poderosos encontrarão uma resposta na Justiça criminal”, pontuou o juiz Sérgio Moro, firme e implacável (com malfeitores públicos e privados), ao comentar o resultado da sessão em Brasília.
Homenagear este incrível Hamlet da vida política brasileira (a comparação é do escritor e poeta Almeida Sales) torna-se mais importante ainda, esta semana, em face da nova realidade aparentemente produzida pela veloz apuração das urnas eletrônicas e as análises, ainda mais apressadas, sobre os passos e o futuro de inquestionáveis grandes vencedores (direta ou indiretamente) da refrega de domingo. A começar por ACM Neto: o prefeito de Salvador, reeleito com 74% dos votos da quarta maior capital do País (espalhados homogeneamente por todas as sessões eleitorais, da sofisticada Barra ao subúrbio ferroviário de Periperi). Ou a lavagem da vitória acachapante de João Dória Jr, na maior e financeiramente mais importante cidade do Brasil e os reflexos dev astadores em seu “cinturão vermelho”, berço histórico do PT. Conduzido por seus próprios méritos pessoais e políticos, somados a propostas inovadoras de gestão, mas vigorosamente empurrado pelas mãos audazes e pressurosas do governador Geraldo Alckmin (PSDB), ao tocar em velocidade máxima o seu projeto tucano de poder com vistas às presidenciais de 2018.
Há grandes perdedores, igualmente. À exemplo do governador Rui Costa e de seu padrinho e guia, Jaques Wagner: ex-governador e ex-ministro de Lula e Dilma, para citar apenas dois nomes da imensa legião de petistas derrotados, no país inteiro domingo passado. Ambos, chefes da política baiana atual, onde - respaldando o pensamento de Guimarães Rosa, de que “desgraça nunca vem sozinha”, que permeia o conto fabuloso “A Hora e a Vez de Augusto Matraga” – a operação Hidra de Lerna, da Polícia Federal, deu uma “batida” em regra esta semana. O monstro, (bicho de sete cabeças, para os nordestinos) inspirado na mitologia helênica, ainda assombra e causa calafrios e tremores em poderosos dos arraiais do governo do Estado e do PT (com seus aliad os).
A conferir ainda, no final de outubro, o restante. Incluindo capitais de grande porte e relevância no contexto nacional. A começar pelo Rio de Janeiro e Belo Horizonte, mas também Recife, Fortaleza, Curitiba e Porto Alegre.
De volta a Ulysses, antes do ponto final neste artigo semanal de informação e opinião. O homenageado desta semana e saudoso timoneiro de tempos de tempestades, produziu no seu referencial “Decálogo do Estadista”, uma das páginas mais fundamentais de seu pensamento político e de homem público.
Na fundamentação do Sétimo Mandamento – A Paciência - ele ensina que a impaciência é uma das faces da estupidez. "Paciência é a capacidade para fazer a hora, não se precipitar... O estadista tem a paciência de escutar, não é falastrão. Saber escutar é um dom político. A santa paciência de escutar! A misericordiosa paciência de ouvir os redescobridores da roda, os inventores da quadratura do círculo, os chatos que “não o deixam ficar só e não o fazem companhia”... Como o peixe, o mau político apodrece pela cabeça e morre pela boca”.
Verdades insofismáveis. Ou não? Brindemos então, outra vez, a memória e a eternidade do pensamento e dos exemplos de Ulysses Guimarães. Tim Tim!!!
Ulisses Guimarães segura a Constituição de 1988 (Foto: Divulgação)