Crusoé afirma que a investigação buscou “mapear em que medida a Lava Jato estava buscando elementos desabonadores contra ministros do próprio Supremo”
A revista digital Crusoé revelou nesta sexta-feira, 18, que o inquérito das fake news foi usado por ministros do Supremo Tribunal Federal para apurar secretamente se a Lava Jato tinha ministros do STF na mira das investigações.
Em abril de 2019, após revelar que o ministro Dias Toffoli era tratado como “amigo do amigo de meu pai” em e-mails internos da empreiteira Odebrecht, uma reportagem da Crusoé foi censura do âmbito do inquérito.
“O então presidente do Supremo e outros ministros acreditavam que, para além da barulheira da militância bolsonarista, estava em curso uma maquinação ainda mais complexa, com participação de integrantes da Operação Lava Jato, para minar uma parcela da corte. Mais do que isso, eles tinham certeza de existência de investigações ultrassecretas, realizadas à sorrelfa, destinadas a apanhá-los”, diz a reportagem.
Com base em documentos sigilosos, a Crusoé afirma que a investigação tocada pelo gabinete de Alexandre de Moraes tinha uma outra face: “mapear em que medida a Lava Jato estava buscando elementos desabonadores contra ministros do próprio Supremo”.
Depois da revelação do codinome “amigo do amigo de meu pai”, os encarregados do inquérito, por ordem do ministro Alexandre de Moraes, queriam descobrir “o que mais tinha sobre Toffoli no material em poder da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba”.
Segundo aponta a revista, se iniciou uma corrida para colher o depoimento de Adriano Sá de Seixas Maia, ex-diretor jurídico da Odebrecht, que trocou e-mails com Marcelo Odebrecht sobre conversas com o “amigo do amigo de meu pai”.
“Ao ouvi-lo, por óbvio, seria possível dirimir dúvidas sobre o potencial de dano que a história representava para Toffoli. Estaria Adriano disposto a causar embaraços para o ministro? Ele poderia estar agindo em linha com Marcelo Odebrecht? Teria dito algo comprometedor à Lava Jato? As perguntas pairavam no ar”, afirma a revista.
Adriano Maia foi ouvido na sala de audiências da 7ª Vara Criminal Federal de São Paulo em 6 de maio de 2019.
Sobre as tratativas com Dias Toffoli, então advogado-geral da União, o ex-diretor jurídico da Odebrecht disse que a empreiteira apenas fez chegar ao órgão pareceres para tentar garantir seus direitos no processo de construção das usinas no rio Madeira. “Por fim, o advogado jogou água na fervura ao dizer que todo o processo foi conduzido de maneira regular”.
Outros ministros
“Outros papéis obtidos por Crusoé mostram que Adriano Maia não foi a única testemunha ouvida no inquérito do fim do mundo, por ordem do gabinete de Alexandre de Moraes, com o objetivo de averiguar se a Lava jato estava empenhada em investigar ministros do Supremo. Em outubro passado, Alexandre determinou que fossem tomados os depoimentos de dois alvos da operação, o auditor da Receita Federal Marco Aurélio Canal, ex-chefe de uma unidade do Fisco que fazia a interface com Lava jato e acabou preso sob suspeita de participar de um esquema de corrupção, e o empresário Jacob Barata Filho, conhecido como o “rei do ônibus”. Nos dois casos, mostram os depoimentos, a ideia era entender se os investigadores estavam interessados em avançar sobre ministros da corte. Canal e Barata foram ouvidos no mesmo dia, 30 de outubro, pelo mesmo desembargador Morales, o magistrado instrutor do gabinete do ministro Alexandre”.
Barata, “que tem laços familiares com a advogada Guiomar Feitosa, mulher do ministro Gilmar Mendes, respondeu assim: ‘Nesses processos somente teve contato com membros do Ministério Público Federal durante a audiências; em nenhum momento recebeu, sob qualquer circunstância, pressão ou mesmo sugestão de qualquer autoridade no sentido de prestar declarações desfavoráveis a qualquer magistrado, inclusive da Suprema Corte'”, diz a revista.
“O auditor Marco Aurélio Canal, por sua vez, foi ouvido em razão de outra celeuma. Meses antes, tinha vindo a público a existência de uma apuração interna da Receita sobre a evolução patrimonial de familiares de ministros de tribunais superiores com atuação em escritórios de advocacia. Entre os alvos do levantamento estavam Guiomar Feitosa, a mulher de Gilmar, e Roberta Rangel, mulher de Dias Toffoli”.
Marco Aurélio também negou participação no levantamento e também disse que “em nenhum momento sofreu qualquer pressão para direcionar os trabalhos fiscalizatórios na Receita em relação a qualquer autoridade; tampouco tem conhecimento (de) que qualquer outro colega seu tenha recebido tal tipo de pressão ou mesmo sugestão de direcionamento dos trabalhos”.
Afonso Marangoni, Revista Oeste