O comportamento dos preços dos ativos indica que há um enorme otimismo com relação ao programa econômico do novo governo. O ministro da Economia quer executar políticas econômicas baseadas no cumprimento de contratos, na correção das distorções tributárias, na exposição das empresas privadas à competição, com incentivos à busca de mais produtividade, com uma política monetária sólida e, acima de tudo, garantindo uma trajetória sustentável da dívida pública. Nos últimos anos o Brasil afastou-se mais e mais dos países de rendas per capita mais elevadas e dos emergentes de melhor desempenho, e precisa retomar uma trajetória sustentável de crescimento.
Em boa hora, voltaram ao debate temas como a privatização de e a intensificação dos investimentos em infraestrutura. Há evidências abundantes de que a gestão das empresas produtivas por parte do setor privado é muito mais eficiente do que por parte do governo, e não há razões pelas quais o Brasil não deva realizar, no mínimo, a privatização total do sistema de refino e distribuição de petróleo, e da geração e distribuição de energia elétrica. Nem há razões pelas quais através de leilões competitivos não sejam concedidos ao setor privado os aeroportos, portos, ferrovias e estradas de rodagem. Para que a sociedade internalize os ganhos destes investimentos é preciso que o governo se apresse em fortalecer as agências reguladoras, blindando-as contra as indicações políticas para torna-las independentes e eficazes. Com a baixa taxa real de juros permitida pela política monetária sólida e pela necessária e urgente consolidação fiscal, os recursos para tais investimentos serão mobilizados pelo mercado privado de capitais, fugindo das consequências negativas dos subsídios canalizados através dos bancos estatais.
Da mesma forma, voltou ao debate o tema da abertura da economia. Ao negligenciar nos investimentos em infraestrutura e abusar de incentivos fiscais e creditícios o País foi perdendo competitividade. Criou-se o mito que a nossa baixa competitividade derivava apenas e tão somente do câmbio sobrevalorizado, com o setor privado pressionando o governo por mais incentivos que compensassem a “fatalidade cambial”, sem atinar para o fato de que na busca da solução estava agravando ainda mais as distorções.
Foi essa dinâmica perversa que levou ao crescimento do protecionismo, quer na forma de tarifas elevadas sobre as importações, quer na forma de medidas não tarifárias, como os índices de conteúdo nacional. O fechamento da economia é um dos efeitos colaterais do crescimento do capitalismo de compadrio, que floresce em uma situação como esta, e no qual não há recompensa para os ganhos de eficiência e o aumento de produtividade, mas apenas para indivíduos com ligações políticas.
Estes são apenas alguns exemplos de ações voltadas à retomada do crescimento. O governo se propõe a fazer muito mais. Mas nada disto terá eficácia sem que seja enfrentado o desafio da consolidação fiscal. É a incerteza neste campo que nos últimos anos derrubou as taxas de investimento, e sem o aumento dos investimentos não haverá a retomada do crescimento. O ministro da Fazenda tem repetido exaustivamente que a consolidação fiscal começa com o cumprimento a curto, médio e longo prazo do teto constitucional para os gastos primários do governo federal, mas isto somente será possível com a aprovação de uma robusta reforma da previdência.
Não se trata de qualquer reforma. Para que ela faça justiça à expectativa extremamente otimista do setor privado refletida na valorização das ações, na queda das cotações do CDS brasileiro e das taxas de juros mais longas, terá que gerar nos próximos 10 anos uma economia superior aos R$ 850 bilhões da proposta original de Temer, antes que esta fosse desidratada nas negociações com o Congresso. Uma reforma da previdência desta magnitude não esgota o estoque de ajustes necessários para a consolidação fiscal, mas é fundamental para que esta ocorra.
Não será uma tarefa fácil. O governo terá de enfrentar as pressões das corporações e aprová-la no Congresso, o que requer um maciço apoio da sociedade. Para tanto, precisa se convencer e convencer a sociedade de que a recompensa é elevada, porque, sem essa reforma, todas as demais perderão sua eficácia, condenando o País a mais um prolongado período de crescimento medíocre.
*EX-PRESIDENTE DO BANCO CENTRAL E SÓCIO DA A.C. PASTORE & ASSOCIADOS
O Estado de São Paulo