domingo, 9 de setembro de 2018

Pacotes para candidatos na web vão de robôs a WhatsApp para milhões

"Sim, nós vamos eleger você!", anuncia o site Cabo Eleitoral Digital, que oferece softwares robôs que agem nas redes sociais.
Site Cabo Eleitoral Digital, que vende programas para administrar robôs nas redes sociais
Site Cabo Eleitoral Digital, que vende programas para administrar robôs nas redes sociais - Reprodução
Os robôs são apenas uma das opções de pacotes oferecidos por empresas de marketing político para candidatos nestas eleições. No kit campanha da internet, há também opções de envio de mensagem de WhatsApp para milhões de números, compra de seguidores e até comercialização de elogios por influenciadores digitais.
A lei eleitoral permite apenas impulsionamento de conteúdo em redes sociais e envio de mensagens para pessoas cadastradas previamente. Isso não impede, porém, que candidatos ajam à margem da lei, muitas vezes usando cabos eleitorais para isso.
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O site Cabo Eleitoral Digital comercializa softwares que automatizam ações repetitivas nas redes sociais. Por meio de perfis, os programas realizam ações em massa como postagens, comentários, pedidos de amizade ou acesso a grupos.
O responsável pelo site, Eleandro Tersi, 43, diz que o Facebook ainda proporciona maior alcance que as demais mídias. "No Facebook, para você chegar em 5 milhões de pessoas por dia, é superfácil", diz.
Para isso, diz ele, basta programar perfis para entrar ininterruptamente em grupos e postar mensagens do tipo: "Estou com fulano". O app com essa função custa cerca de R$ 900, e o pacote com consultoria e vários programas sai por R$ 6.000.
Tersi ensina clientes como usar os programas, além de dar dicas que podem impedir o candidato de se complicar com a Justiça Eleitoral, como não usar perfis falsos.
"Eu falo: não use seu perfil. Primeiro, pode ser rastreado. Segundo, entre estar dentro e fora da lei a linha é bem pequenininha", diz. "Então, pegue um terceiro, um cabo eleitoral que te apoia, e vamos utilizar o perfil desse cara".
Um especialista em direito eleitoral ouvido pela Folha, porém, discorda que cabos eleitorais estejam excluídos da lei.
Página comercializa disparo em massa de mensagens no WhatsApp
Página comercializa disparo em massa de mensagens no WhatsApp - Reprodução
Assim como outras páginas de marketing digital, a empresa de Tersi traz um portfólio com políticos atendidos. Como fica no Paraná, quase todos são da região Sul --incluindo de um ex-governador, deputados e vereadores.
Entre eles, está o vereador Armando Azambuja (PT), de Viamão (RS), que admite que usa meios de automatização para se comunicar com o eleitorado. Isso inclui até um robô inteligente, conhecido como chatbot, que responde pelo WhatsApp a perguntas de acordo com as palavras-chave detectadas.
"Não uso no período eleitoral porque a legislação não permite. Mas eu fico os quatro anos mostrando o trabalho que eu faço, quando não tenho concorrência com outros políticos, que começam a fazer divulgação só na eleição", afirma.
Uma análise feita pelo Instituto InternetLab mostrou que mais de 60% de 410 mil seguidores no Twitter do senador Alvaro Dias, candidato à Presidência pelo Podemos, são, na verdade, perfis robôs, controlados automaticamente por terceiros.
O segundo com maior percentual é Geraldo Alckmin, do PSDB, com 45,8%.
Fábio Malini, professor da UFES (Universidade Federal do Espírito Santo) e pesquisador de Comunicação Política e Redes Sociais, diz que o Twitter é uma rede onde os robôs tendem se proliferar.
"Tem robô que automatiza publicação e republica tudo. Outro é ciborgue, uma conta que pode ser falsa ou verdadeira, administrada por mais de uma pessoa. Ela é monotemática, está sempre elogiando ou detratando alguém", diz. "Essa conta, em certo momento, é utilizada para subir hashtags e fazer ganharem o rol de assuntos do momento".
Quando um tema entra nos Trending Topics do Twitter, pessoas reais passam a discuti-lo, diz Malini. O tema pode acabar chegando às mídias convencionais.
Dentro dessa busca por transformar um tema plantado em discussão orgânica, agências ainda oferecem a contratação de microinfluenciadores. O caso mais conhecido é o que envolve empresas ligadas ao deputado federal Miguel Corrêa (PT-MG), que articulavam a contratação de tuiteiros para elogiar candidatos petistas.
Esse tipo de serviço é oferecido de maneira mais velada, porque, além de ser contra a lei, o segredo faz parte do processo de dar aparência de espontaneidade aos elogios pagos.
O deputado Leonardo Quintão (MDB-MG) chegou a anunciar publicamente um aplicativo para contratar cabos eleitorais digitais remunerados por até R$ 9.000, mas retirou o app do ar após ser questionado pela Folha sobre o assunto.
A estratégia de comprar seguidores e curtidas é utilizada por candidatos para simular uma popularidade inexistente, o que sai relativamente barato. Há anúncios da venda de 20 mil seguidores no Twitter por R$ 400.
Outro produto fartamente oferecido aos políticos são pacotes de envios em massa de mensagens de WhatsApp. Os políticos enviam desde santinhos a propostas aos eleitores.
Segundo especialistas, o aplicativo se mostra mais eficaz para estratégias de mobilização relâmpago da militância, como, por exemplo, receber um candidato no aeroporto.
O site Na Mosca diz que oferece uma agenda com 200 milhões de números, segmentada até por bairro. É possível enviar 1 milhão de mensagens por valores a partir de R$ 0,05 por destinatário. A empresa utiliza uma plataforma informatizada e muitos chips telefônicos, que vão sendo bloqueados pelo WhatsApp --uma estratégia do aplicativo para dificultar o envio em massa.
"No momento, estamos mandando muitos orçamentos [aos políticos]", diz Priscila Dias, funcionária da empresa que espera ter o maior movimento do ano nas eleições.
Renato Ribeiro de Almeida, advogado especialista em direito eleitoral e doutor pela USP, diz que a legislação eleitoral proíbe uso de listas de números telefônicos compradas. "O candidato tem que se valer da lista de pessoas que autorizaram, porque, senão está quebrando a privacidade da pessoa", diz.
Além disso, diz ele, é proibido o uso de robôs. "A legislação hoje proíbe ferramentas não disponibilizadas pelos próprios sites nas redes sociais", afirma.

À VENDA
Robôs
Programas que repetem ações nas redes sociais, como postagem em massa e curtidas
WhatsApp em massa
Sistema pode enviar mensagens para milhões de números, direcionadas até por bairro
Compra de seguidores
Há pacotes de compra de seguidores, curtidas e visualizações de vídeos nas redes
Compra de influenciadores
Pessoas reais, com muitos seguidores em redes sociais e influentes sobre determinado público, são pagas para fazer posts elogioso

Artur Rodrigues, Folha de São Paulo