sábado, 3 de dezembro de 2016

"Não estamos longe de um período de desobediência civil", por Ronaldo Casado

Folha de São Paulo

Pedro Ladeira/Folhapress
BRASILIA, DF, BRASIL, 24-11-2016, 12h00: Votação da Lei das 10 medidas contra a corrupção no Plenário da Câmara. O relatório do dep. Onyx Lorenzoni (DEM-RS), que foi aprovado ontem na comissão, será apreciado pelo plenário, que poderá fazer emendas e alterações no texto. Na foto grupo de parlamentares conversa com o dep. Esperidião Amin (PP-SC) e com o relator Onyx Lorenzoni. (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress, PODER)
Onyx Lorenzoni (DEM-RS), relator do pacote anticorrupção, discute com deputados durante sessão


O artigo 2º da Constituição Federal diz que os Poderes da União são "independentes e harmônicos entre si". A presente crise político-institucional agrava-se com o fato de que os Poderes têm investido mais na independência que na harmonia –e ambas, como tem sido possível constatar, são indispensáveis e indissociáveis.

O projeto das dez medidas de combate à corrupção, encaminhado pelo Ministério Público e recém-aprovado com emendas pela Câmara, frustrou a expectativa da sociedade.

Faltou diálogo entre os Poderes, e o resultado é o ambiente de ressentimento recíproco que provocou, passando ao público a ideia de revanchismo. Não é isso o que o país quer nem o que precisa.

A agenda pós-impeachment tem apenas dois itens: combate à corrupção e resgate da economia. Não são permutáveis nem adiáveis. Não sendo atendidos, o impeachment, motivado pela soma deletéria de má gestão e roubalheira, por parte dos governos do PT, não terá feito sentido. E, para que essa agenda se cumpra, é preciso que se estabeleça a harmonia (o diálogo) entre os Poderes.

O projeto das dez medidas está agora no Senado, que irá cumprir seu papel institucional de casa revisora/moderadora. Terá, porém, de agir sem açodamento, como já o fez ao barrar o pedido de urgência para sua tramitação. Antes de votá-lo, precisamos ouvir a sociedade organizada –e, dentro dela, quem tem autoridade científica para se manifestar com isenção: a academia.

A sociedade tem todos os motivos para estar como está: com os nervos à flor da pele. O Congresso não pode falhar em matéria tão delicada e decisiva, qual seja o combate à corrupção.

O abuso de autoridade deve ser observado, não há dúvida, mas não ao custo de inverter o objetivo e blindar a produção de justiça. Nem uma coisa nem outra. Chegaremos ao equilíbrio, cientes de que a diferença entre o remédio e o veneno é a dose.

O custo da corrupção no Brasil ainda não foi devidamente mensurado. E não se trata apenas do expressivo custo financeiro. O pior é o custo moral, que se mede pelo descrédito da sociedade em suas instituições –sobretudo em relação à classe política– e dos agentes econômicos no país.

Quanto, em matéria de evasão de investimentos –e, por extensão, de empregos suprimidos–, a presente crise institucional já custou ao país? Há dias, o IBGE constatou que, no trimestre encerrado em outubro, o desemprego aumentou para 11,8%, a maior taxa desde que esse índice começou a ser medido, em 2012.

Fala-se que os 12 milhões de desempregados do início do ano já seriam 14 milhões. A crise, gestada pelos governos do PT, requer tratamento de choque e a mobilização de todo o Estado em prol da recuperação nacional. E isso não tem ocorrido.

O Congresso começa a fazer sua parte com a aprovação da PEC do teto de gastos públicos. Ou o Estado corta na própria carne ou não terá autoridade moral para impor sacrifícios à população.

A algazarra promovida em frente ao Congresso pelas milícias organizadas e financiadas ao tempo do PT –CUT, MST, MTST, UNE– ocorre porque acabou a mamata do dinheiro público para financiá-las. O governo fechou as torneiras.

O país não suporta mais o sangramento de seus recursos, quer em roubalheira nas estatais, quer em salários de marajás, quer na remuneração de milícias criminosas. Tudo isso atende pelo nome de corrupção. E é hora de dar um basta.

É preciso restaurar a credibilidade das instituições, sob pena de o país ingressar num período de desobediência civil. Não estamos, lamento dizer, longe disso. Não há mais espaço para o erro.