terça-feira, 6 de dezembro de 2016

Kim Kataguiri: "Parlamentares têm de entender que as coisas mudaram"

Folha de São Paulo


As manifestações deste domingo (4) servem de alerta para os parlamentares que ainda não entenderam que o impeachment da presidente Dilma Rousseff não resultou apenas numa mudança de governo, mas numa mudança de atitude por parte da população.

O relatório da comissão que analisou as medidas do Ministério Público foi razoável. Retirou pontos evidentemente inconstitucionais e abusivos do projeto original - como a limitação de habeas corpus, uso de "provas ilícitas obtidas de boa-fé" e o teste de integridade.

Ainda assim, muitos deputados ficaram insatisfeitos. Queriam porque queriam expandir o crime de responsabilidade para juízes e promotores - o que, não fossem a redação extremamente subjetiva do projeto e a inconveniência de votá-lo junto com as medidas, não seria problema, afinal, se os presidentes da República e do Supremo Tribunal Federal estão sujeitos a punições caso cometam crime de responsabilidade, é razoável que juízes e promotores também estejam. Por fim, a Câmara acabou aprovando o jabuti durante a madrugada.

Para piorar, no mesmo dia, o agora presidente afastado do Senado, Renan Calheiros, pautou um requerimento de urgência para a votação do projeto, que havia acabado de ser aprovado na Câmara. A votação foi simbólica, mas vários senadores se posicionaram contra. Exigiram, então, uma votação nominal. Por 44 votos a 14, o requerimento foi derrotado.

A imagem que ficou para a população foi a de que a Câmara aprovou o crime de responsabilidade apenas para retaliar o Judiciário e o Ministério Público e que Renan Calheiros está desesperado para pautá-lo. Resultado: dezenas de milhares de manifestantes tomaram as ruas pela rejeição de todo o projeto e contra o presidente do Senado.

Os parlamentares têm de entender que a população está atenta às pautas que são debatidas no Congresso e possui prioridades claras: garantir a continuidade da Operação Lava Jato e recuperar a economia.

O Ministério Público, por outro lado, deve continuar o excelente trabalho que vem fazendo com as investigações, mas sem fazer pressão por pautas corporativas ou criar atritos institucionais colocando "luvas de boxe" para aprovar projetos de lei.

Da mesma maneira que fizeram para aprovar a PEC do teto, os parlamentares devem afinar o discurso para levar em frente as outras reformas necessárias para o país voltar a crescer, como a previdenciária, a trabalhista e a tributária.

Caso contrário, a narrativa que triunfará será a das esquerdas, que, desesperadas com sua queda brusca, atacarão toda e qualquer reforma proposta pelo governo ou pelo Congresso, mesmo sabendo que isso significa afundar o país numa depressão que pode durar sabe-se lá quanto.

Temos uma oportunidade histórica de fazer as reformas estruturantes que o Brasil sempre precisou e garantir que o país do futuro se torne, um dia, o país do presente.

Brigas mesquinhas entre Poderes da República, promoção de interesses corporativos e tentativas de abafar investigações não podem estar acima daqueles que mais perdem com toda essa bagunça: os brasileiros.
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Renan, o coronel da velha política, deve ser punido, mas a liminar de Marco Aurélio atenta contra tripartição do poder

Sim, fomos às ruas para exigir a saída do senador do peemedebista. Não, isso não significa que temos de apoiar a decisão do ministro Marco Aurélio. Além de resultar apenas num afastamento provisório - o que significa que Renan pode voltar e que, enquanto isso, não se pode realizar uma nova eleição para a presidência do Senado -, a liminar do ministro do STF é inconstitucional e atropela um julgamento que estava parado devido a um pedido de vista, ou seja, o magistrado desrespeitou as regras da própria corte em que trabalha e da Carta que deveria proteger.

O caminho correto é pressionar a Procuradoria-Geral da República, na figura do senhor Rodrigo Janot, que, por alguma razão, ainda não apresentou denúncias referentes a mais de uma dezena de inquéritos que pesam sobre o senador. Além disso, pressionar para que o STF julgue Renan, que já é réu, com celeridade para que, sendo condenado, o peemedebista não só seja afastado da presidência do Senado, mas também perca seu mandato, seus direitos políticos e seja mandado para a cadeia.

Isso, sim, é atender aos gritos de "Fora Renan!" que tomou as ruas.