sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Infraestrutura para bons negócios

Quando pensamos em uma plataforma como Uber ou Airbnb, primeiro vem-nos à mente o aplicativo. No entanto, o aplicativo é apenas um meio — indispensável, é verdade — para fazer essa conexão, mas a plataforma é o real modelo de negócios que conecta a oferta e a demanda de bens ou serviços. Tal modelo tem possibilitado o uso das capacidades ociosas na economia e o fornecimento de serviços de forma mais eficiente.

Mas o que Uber e Airbnb têm a ver com infraestrutura? Em infraestrutura, temos uma desconexão similar àquela que essas plataformas solucionaram. Por um lado, estima-se que, para zerar o déficit no setor, os países da América Latina e Caribe deveriam investir 5% do PIB ao ano, por vários anos. No entanto, segundo estudo do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), os investimentos somaram, em média, apenas 3,6% do PIB, entre 2008 e 2013. O Brasil ficou abaixo da média da região, com 3,1% do PIB.

Por outro lado, em termos reais, a média das taxas de juros de dez anos nos países desenvolvidos está próxima de zero, o que traz desafios importantes para seus regimes de pensões. Para melhorar a solvência dos fundos de pensão, seria oportuno investir mais em infraestrutura, onde os retornos são mais altos. No entanto, levantamento da OCDE mostra que, dos muitos trilhões administrados por investidores institucionais, apenas 2% estão no setor.

Por que esse casamento ideal não acontece? Falta o meio: a plataforma que conecta o início e o fim. Essa falha de mercado é comumente relacionada ao fato de que os projetos não estão preparados para os investidores. Prepará-los significa planejar o setor a longo prazo, prover estabilidade política e jurídica, alocar os riscos adequadamente e promover processos competitivos e transparentes de licitação. A essa lista, deve-se acrescentar o envolvimento de todos os agentes relacionados aos projetos. Infraestrutura se constrói com pessoas, para as pessoas. É um meio para conectá-las, bem como seus bens e serviços, e não um fim em si mesmo. O engajamento dos agentes é uma necessidade e, sobretudo, uma vantagem, pois aumenta significativamente as chances de o projeto ser bem-sucedido, tornando-o mais sustentável e atrativo.

Uma plataforma de infraestrutura deve ser um modelo de negócios com foco nos clientes (cidadãos, usuários e investidores), que os conecte com os projetos e que também os envolva na sua concepção, desenvolvimento e maturação. O BID, como os demais bancos multilaterais de desenvolvimento, tem investido no desenvolvimento de plataformas de infraestrutura. Duas delas, a GVIP e a IISS, já estão disponíveis para os governos a custo zero. A GVIP é um ambiente virtual aberto que permite adquirir informações sobre projetos e interagir com uma rede de quase 2.500 especialistas internacionais. A IISS é uma ferramenta interativa on-line de preparação de projetos, de acesso restrito e que possibilita a participação de especialistas na modelagem econômico-financeira dos projetos e dá total transparência aos elementos técnicos dos estudos de viabilidade.

Essas ferramentas só serão exitosas se os governos as abraçarem e liderarem efetivamente a construção de uma plataforma de infraestrutura em sentido amplo: uma política que articule planejamento a longo prazo, adequada preparação de projetos, boas práticas de licitação e regulação, além do engajamento efetivo de cidadãos e investidores. A conjuntura internacional traz uma oportunidade única para reduzir o crônico déficit de infraestrutura da região, mas podemos perdê-la se não agirmos logo.

Pablo Fonseca Pereira dos Santos é gerente de infraestrutura e energia do Banco Interamericano de Desenvolvimento, e Norman Anderson é presidente da CG/LA Infrastructure