terça-feira, 27 de setembro de 2016

Banco Central prevê inflação abaixo da meta de 4,5% em 2017


  - Daniel Marenco / Agência O Globo

Gabriela Valente - O Globo
Primeiro relatório sob o comando de Ilan Goldfajn, eleva projeção de IPCA deste ano a 7,3%

A previsão para a inflação no ano que vem caiu e ficou abaixo da meta do governo. Segundo o relatório de inflação, a expectativa do Banco Central para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), usado oficialmente no sistema de metas, passou de 4,7% para 4,4%. Isso abre caminho para a autoridade monetária começar a cortar os juros básicos. 
No entanto, o BC alertou que há condicionantes. A principal dela é a aprovação da proposta que limita os gastos do governo que está no Congresso Nacional.
“As projeções aqui apresentadas dependem ainda de considerações sobre a evolução da política fiscal. Na conjuntura atual, os principais efeitos desta política estão associados ao processo de ajuste da economia, que envolve encaminhamento de importantes reformas propostas pelo Governo para apreciação pelo Congresso Nacional”, disse o BC, que lembrou que o ajuste influenciará nas expectativas e confiança.

Na contramão da melhora para o ano que vem, a previsão para este ano piorou e a probabilidade de estourar o teto da meta (que é de 6,5%) aumentou. A projeção do BC saltou de 6,9% para 7,3% em 2016. No entanto, os efeitos dos juros altos — mantidos em 14,25% ao ano desde setembro do ano passado — serão sentidos daqui para frente.

Em 2018, a projeção é de IPCA em 3,8%. A divulgação da estimativa da inflação para o fim de 2018 foi uma inovação da nova diretoria do BC. Normalmente, a autoridade monetária só divulgava as expectativas para nove trimestres à frente. Desta vez, informou a projeção para os próximos dez períodos.

Esse é o primeiro relatório de inflação do Banco Central divulgado após a troca de comando da instituição depois que a presidente Dilma Rousseff foi afastada do poder. A autarquia reformulou toda a sua comunicação para deixar mais claro o caminho que deve seguir na política de juros para controlar os preços.

O dado tão baixo para 2018 pode ter um efeito importante: influenciar os economistas que divulgam semanalmente suas projeções para a inflação. Se estão altas, contaminam a economia e — na prática — boicotam o trabalho do Banco Central de trazer a inflação da meta porque parte da remarcação dos preços é a perspectiva de que esses preços vão aumentar.


O diretor de Política Econômica, Carlos Viana de Carvalho, detalhou a mudança. Disse que o BC, a partir de agora fará divulgação de todas as projeções para os períodos em que haja a definição de meta feita pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), ou seja, em junho deve ser divulgada a previsão para 2019.

— O propósito é cumprir todo o ano calendário que tiver uma meta explicitada pelo Conselho Monetário Nacional — explicou o diretor.

CRESCIMENTO

Outra mudança relevante do relatório trimestral de inflação foi a retirada das projeções para a atividade econômica do principal capítulo, que trata das perspectivas para a inflação. Em todo o trecho, não há sequer uma única menção ao Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos pelo país). Com isso, o BC de Ilan dá um recado muito claro: o crescimento econômico não é o foco da autarquia.

Em um box à parte, o BC informou que a estimativa para o comportamento da economia neste ano foi mantida em uma retração de 3,1%.

Já para o ano que vem, a aposta é de uma retomada do crescimento. A expectativa é de expansão de 1,3% da atividade.

O texto não teceu muitos comentários sobre o assunto. Apenas deu projeções feitas com base nos dados divulgados pelo IBGE até agora.

Para o Banco Central, o cenário básico é de estabilização da atividade econômica no curto prazo e possível retomada gradual ao longo dos próximos trimestres, mas ainda num ambiente de elevado nível de ociosidade na economia. Isso significa que o investimento pode demorar um pouco mais a reagir.

O foco estava no controle da inflação. Desde que assumiu, o presidente do BC, Ilan Goldfajn, manteve, entretanto, o compromisso de entregar a inflação na meta no ano que vem. Por outro lado, tem feito de tudo para distanciar-se de seu antecessor, Alexandre Tombini.

No relatório publicado nesta terça-feira, além de o texto ser menor e muito mais claro — mudanças já imprimidas aos demais instrumentos de comunicação do Banco Central — até mesmo os gráficos estão com cores diferentes.

A cúpula do BC detalhou os efeitos da política da administração anterior até agora. Disse que há um processo de desinflação em curso apesar de inflação acima das expectativas no trimestre encerrado em agosto.

Mais uma vez, os integrantes do Comitê de Política Monetária (Copom) destacou os elementos que podem permitir maior confiança no alcance das metas: a persistência dos efeitos do choque de alimentos na inflação seja limitada; os componentes do IPCA mais sensíveis à política monetária e à atividade econômica indiquem desinflação em velocidade adequada; e que ocorra redução da incerteza sobre a aprovação e a implementação dos ajustes necessários na economia, incluindo a composição das medidas de ajuste fiscal.

PREÇO DOS ALIMENTOS

Sobre alimentos, o BC ressaltou que a queda recente nos preços de alimentos no atacado tem se transmitido para o varejo. E as projeções para alguns itens já mostram reversão da alta. “De fato, uma parte da resistência recente à queda da inflação corrente parece ter sido causada por choques temporários nos preços de alimentos. O Copom se manterá atento a sinais de que essa resistência também possa advir de mecanismos inerciais”, frisou.

Em relação aos sinais inconclusivos quanto à velocidade de desinflação em direção à meta, o Copom avaliará a tendência de desinflação no setor de serviços e os efeitos secundários que a desinflação desse grupo poderá ter sobre outros componentes do IPCA.

Quanto ao quadro fiscal, há “sinais positivos” em relação ao encaminhamento e à apreciação das reformas.

“Entretanto, o processo de tramitação ainda está no início e as incertezas quanto à aprovação e à implementação dos ajustes necessários permanecem”, diz o BC. “Essas reformas são relevantes para o Banco Central na medida em que têm impacto sobre o balanço de riscos e a trajetória da inflação em relação ao alcance das metas”.

CENÁRIO EXTERNO

Uma das grandes dúvidas dos economistas era de como o BC vê o quadro externo. Segundo o relatório, o cenário ainda apresenta “interregno benigno” para economias emergentes. No entanto, as incertezas sobre o crescimento da economia global e, especialmente, sobre a normalização das condições monetárias nos Estados Unidos persistem.

De acordo com o Banco Central, a dinâmica da economia global permaneceu frágil e heterogênea, no segundo trimestre do ano, com incertezas associadas ao ritmo de crescimento e a riscos deflacionários em importantes economias globais.

Nos EUA, a evolução favorável do mercado de trabalho, das bolsas de valores e dos preços ao consumidor impulsionou os gastos com consumo, que exerceram impacto relevante sobre a trajetória do PIB, no período. A atividade econômica também registrou aceleração no Reino Unido.

Esse desempenho contrastou com o arrefecimento observado nas economias da Área do Euro e no Japão. Na China, a adoção de medidas fiscais para impulsionar o desempenho da economia local, repercutiu sobre a evolução do PIB, no segundo trimestre, e contribuiu para a sustentação dos preços das commodities metálicas e para a redução da volatilidade nos mercados acionários.

“Nesse contexto, a despeito da ocorrência de instabilidades pontuais, os mercados financeiros globais operaram em ambiente de menor aversão ao risco, que se estendeu a agosto, refletindo, em especial, expectativas de manutenção dos juros básicos, em nível reduzido, nas principais economias maduras”, disse o BC no relatório. Ressalte-se que a instabilidade derivada do Brexit foi revertida à medida que se consolidou a percepção de seu impacto contido sobre o crescimento da economia global e da disposição do Banco da Inglaterra e de outros bancos centrais de importantes economias centrais para responder com estímulos monetários adicionais, caso necessário”.