| Daniel Marenco - 7.fev.2012/Folhapress | |
![]() | |
| Elena Landau, no escritório no centro do Rio de Janeiro |
MARIANA CARNEIRO - Folha de São Paulo
Antes mesmo de chegar à Presidência, assessores de Michel Temer já anunciaram que o plano do PMDB é deslanchar um programa de concessões e privatizações.
A advogada Elena Landau, 57, que comandou este processo nos anos 1990, prevê uma corrida tanto do governo federal quanto dos Estados na tentativa de vender seus ativos e fazer caixa.
"É fundamental organizar esse engarrafamento".
Segundo Landau, mesmo que não arrecade "os bilhões do passado", é preciso voltar a falar de privatização para reorganizar o Estado e reformar setores, como o de gás e energia elétrica.
*
Folha - O PMDB tem dito que vai deslanchar um programa de concessões.
Elena Landau - Se fala nisso há muito tempo, nunca deixou de ser uma prioridade, nem mesmo no governo Dilma. A agenda nova é falar em privatização.
O que poderia ser vendido?
Podemos falar em quase tudo que não seja função do Estado.
Um problema é que se fala em privatização quando se está precisando de dinheiro. Não há uma postura permanente de reforma do Estado, em que se possa fazer uma programação, como havia no passado. Começou no governo Sarney, passou pelo Collor, FHC e depois parou. Primeiro foram as empresas que estavam falidas, depois as de atividades típicas do setor privado e depois as de serviços públicos. Era um processo organizado, com previsão e decreto da Presidência.
Agora, há um mercado muito ruim e há necessidade de arrecadar. Haverá um engarrafamento, porque os Estados também estão precisando privatizar. É fundamental organizar esse engarrafamento. Para ser benfeito e transparente, o processo de privatização não pode ser feito em um mês. Tem que ter planejamento.
Quais empresas estão na lista?
Há necessidade de ter uma Valec? Não deu certo o projeto ferroviário do governo. E a Telebras? Primeiro é necessário fazer um levantamento das empresas cujas tarefas poderiam ser assumidas por outros entes estatais ou secretarias ou que simplesmente poderiam ser fechadas.
A privatização não é só para arrecadar, mas também para reorganizar um setor da economia, como fizemos com o setor de telecomunicações no governo FHC.
O que tem que ser reorganizado agora?
Em vez de investir na Petrobras para gerar um caixa que não vai fazer diferença na situação de endividamento da empresa, melhor é reunir os ativos e pensar no que se quer do setor de óleo, gás e energia elétrica do país.
Não adianta vender fatia minoritária na Gaspetro. Tem de parar com essa fixação dos 49% [máximo de controle privado]. Nenhum investidor, com o tamanho do risco do país, com a tradição de intervenção estatal que temos, vai comprar 49% de uma estatal. Tem que ser privatização de fato, venda do controle.
Vamos pensar o setor de gás da Petrobras. Vamos integrar, promover competição e usar a privatização para reorganizar este setor. Isso vale também para os Estados e suas empresas, como a Sabesp e a Cedae.
Acredita que governo Temer vá privatizar?
Ele não vai começar falando de privatização de Eletrobras, Petrobras. Mas há o que fazer com ativos da Petrobras e da Eletrobras.
Por que essas duas empresas? Porque o Tesouro absorveu muito prejuízo das duas nos últimos anos e o Tesouro tem falado em capitalizá-las. Privatizar não é só ganhar dinheiro, é também deixar de perder, e os suspeitos mais óbvios são essas duas.
No caso da Eletrobras, as distribuidoras regionais do Norte e Nordeste têm que sair do seu guarda-chuva. Elas estão absorvendo recursos que, se o intuito for manter a Eletrobras estatal, estão fazendo falta para a empresa.
Concessões são mais fáceis?
As concessões de infraestrutura paralisaram por causa dos riscos que foram acrescentados ao negócio. Riscos jurídicos, regulatórios, taxas de retorno irreais, concessionários oportunistas –os sem experiência que acabaram devolvendo a concessão ou não terminaram obras no prazo.
Quando se tem uma mudança de governo e uma retomada da confiança na capacidade do governo de respeitar um pouco mais as regras jurídicas e regulatórias, é natural que o investidor se aproxime. E os projetos estão aí.
Mas mesmo nas concessões, se não diminuir o risco ao investidor, vai continuar sendo difícil vender. O governo acabou de intervir no setor elétrico de uma maneira radical. E isso ficou na cabeça das pessoas.
O processo de privatização é mais lento porque é preciso definir o valor de uma empresa e se o objetivo for fazer uma privatização que não seja meramente para arrecadar, é preciso pensar o que se quer do setor. Mas, para chegar lá, tem que começar algum dia.
O que daria para Temer fazer em dois anos?
Dá para preparar muita coisa e fazer algumas. Temos que reorganizar e rever questões de risco, taxa de retorno.
Temos expertise, é só recuperá-lo, criar uma força-tarefa no BNDES, recuperar a coordenação que havia e que se perdeu com a dispersão por muitos ministérios. E tem que ter vontade política, superar a questão ideológica. Por exemplo, qual o motivo de manter a Infraero nos aeroportos privatizados? A estatal não conseguiu acompanhar os investimentos privados e isso acabou quebrando a empresa. E agora faz o quê, capitaliza a Infraero?
Não tem sentido. É um viés ideológico, tem que parar com essa privatização envergonhada. Não será em seis meses, mas a sinalização já é muito importante.
Mesmo que o objetivo não devesse ser caixa, o governo precisa de dinheiro. Quanto se pode arrecadar?
Não fiz a conta, mas depende do que você considera caixa. Se a empresa estiver muito mal administrada, como é o caso da Petrobras e da Eletrobras, o governo acaba tendo que falar de capitalização. O governo teria que inventar recursos para colocar nessas empresas.
Dinheiro do meu imposto, do seu, enquanto ela tem empresas que podem ser privatizadas. Esse é um mau uso dos recursos.
A privatização é uma agenda que está atrasada e pelo menos é possível colocá-la em andamento novamente. Não é porque não vai arrecadar os bilhões do passado que não vai colocar na agenda.
Muitos falam que a intervenção no setor de energia elétrica afetou a Eletrobras. Não, afetou todo o setor de energia e infraestrutura, pois mostrou que um governo intervencionista pode mudar os preços dos serviços. Isso afastou os investidores, aumentou o risco do país.
É preciso vender a Petrobras?
Um governo que começa com a expectativa de que vai tirar o país dessa situação em que está começa com mais capacidade política de fazer um programa de privatização a sério. Porque ou é isso ou é mais imposto ou mais dívida.
Mas não acho que essa força política chegue ao ponto de se discutir a venda de controle da Petrobras. Nem seria o momento, dada a situação da empresa. Não é viável nem politicamente nem economicamente.
A sra. falou em engarrafamento para privatizar. Há o que vender nos Estados?
Alagoas está fazendo um levantamento, todos estão levantando o que têm, porque não têm de onde tirar dinheiro. Não adianta fazer renegociação da dívida e continuar desperdiçando com coisas sem função. Mas não dá para fazer tudo ao mesmo tempo.
Se fizer uma lista, há empresas demais para vender e pouco mercado para comprar. Essa é uma questão para coordenar.
-
RAIO-X ELENA LANDAU, 57
Cargo
sócia do escritório de advocacia Sergio Bermudes
sócia do escritório de advocacia Sergio Bermudes
Carreira
>> Diretora do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) de 1994 a 1996 (governo Fernando Henrique Cardoso)
>> Participou da venda de diversas estatais e atuou na estruturação da privatização da Vale do Rio Doce, que ocorreu em 1997
>> Foi presidente da seção fluminense do Instituto Teotônio Vilela (órgão de formação política do PSDB)
