quarta-feira, 11 de maio de 2016

Meirelles já começa a se reunir com governadores para renegociar dívidas

Endividados. Reunião de governadores na casa de Luiz Fernando Pezão (ao centro)
Endividados. Reunião de governadores na casa de Luiz Fernando Pezão (ao centro) Foto: Carlos Magno/Divulgação

Silvia Amorim,Martha Beck,Bárbara Nascimento,Eliane Oliveira - O Globo


Às vésperas de uma possível troca de comando no governo federal, os governadores do Rio, Minas Gerais, São Paulo e Santa Catarina se reuniram na terça-feira na residência de Luiz Fernando Pezão, na Zona Sul carioca, para discutir uma saída para a bilionária dívida dos estados com a União. Em meio à instabilidade política, o encontro terminou sem qualquer proposta concreta. O governador em exercício do Rio, Francisco Dornelles, expôs sua posição e defendeu uma moratória temporária do pagamento dos juros à União por pelo menos dois anos, para que os estados possam reequilibrar seus orçamentos. A tese, porém, não foi encampada formalmente pelos demais governadores.

Na reunião, houve consenso de que é preciso esperar a instalação de um eventual governo do vice-presidente Michel Temer para dar início à discussão, com o Ministério da Fazenda, sobre uma renegociação da dívida pública. Os governadores estão esperançosos de que, em uma gestão Temer, seja encontrada uma solução para a dívida dos estados, estimada em R$ 107 bilhões. O ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles, cotado para assumir o Ministério da Fazenda, já começou a se encontrar com governadores para tratar do tema e teria mostrado disposição em negociar com os estados. Meirelles teria dito que a pauta estava entre as prioridades de sua eventual gestão.

PARA SECRETÁRIO, PRAZO DE CINCO ANOS

No encontro de ontem, Dornelles foi enfático sobre a situação dos estados:

— Todos os estados estão com um fluxo de caixa muito violento, as receitas caíram, e as despesas indexadas subiram, de modo que você tem um descontrole financeiro a curto prazo, e as despesas e juros são todas muito altas. Precisávamos de uma moratória de dois anos de juros para renegociar essa dívida.

O Estado do Rio deve hoje R$ 67 bilhões à União — o que representa 67% do total da dívida pública dos estados, que soma R$ 107 bilhões. Neste ano, a estimativa é que o governo fluminense desembolse cerca de R$ 5,5 bilhões apenas com o pagamento de encargos e juros da dívida. Com o estado praticamente quebrado e sem conseguir honrar compromissos básicos, como pagamento de salários dos servidores, é exatamente desse peso que Dornelles gostaria de se livrar a curto prazo.

Para o secretário de Fazenda do estado, Julio Bueno, a penúria dos governos estaduais requer cinco anos de carência para o pagamento dos juros da dívida, e não apenas dois. Segundo ele, a dívida é consequência da pressão da Previdência fluminense, que tem um déficit de R$ 12 bilhões.

— A situação é de desespero, e isso não acontece só com o Rio. O déficit previdenciário de Minas é de R$ 10 bilhões; o de São Paulo, R$ 18 bilhões; e o do Rio Grande do Sul, de R$ 9 bilhões. Ninguém aguenta mais isso — afirmou Bueno.

Os governadores de São Paulo, Geraldo Alckmin, e de Santa Catarina, Rafael Colombo, preferiram o discurso de que é preciso esperar os desdobramentos políticos em Brasília para discutir qualquer proposta. Ivo Sartori (Rio Grande do Sul) e Renan Filho (Alagoas) participaram da reunião por telefone.

— Essa é uma questão federativa que envolve todos os estados. Mas estamos aguardando os próximos dias, é preciso esperar essa transição para depois conversar com a nova área financeira — afirmou Alckmin.

— Eu percebo que há continuidade nessa disposição de colaboração mútua — disse Colombo, ao deixar a reunião.

A pressa em resolver o imbróglio da dívida dos estados deve-se a uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) do mês passado. Os ministros suspenderam por 60 dias o julgamento que vai decidir que tipo de juros deve corrigir as dívidas dos estados. O prazo dado é para que governadores e governo federal cheguem a um acordo. A última grande renegociação entre estados e União aconteceu no governo Fernando Henrique Cardoso.

A decisão do Supremo foi tomada após 11 estados obterem liminares para trocar a fórmula de aplicação dos juros de suas dívidas, de composta para simples. Santa Catarina foi o primeiro a recorrer ao STF.

NO RIO, GASTO COM INATIVOS SALTA 118%

Alguns estados têm uma situação financeira pior que a de outros, mas, de maneira geral, o cenário não é animador para nenhum governador. O secretário de Fazenda de Santa Catarina, Antonio Gavazzoni, explicou que, apesar de o governo catarinense não ter uma situação dramática (a dívida soma R$ 9 bilhões), como é o caso de Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, os próximos anos serão difíceis para todos.

— Na reunião houve consenso de que a negociação com o governo federal não pode ficar apenas em cima da renegociação da dívida. Ela tem de passar também por outras questões, entre elas uma reforma da Previdência. A recuperação econômica do país não acontecerá se o governo não resolver a crise financeira nos estados — afirmou Gavazzoni.

Ainda não há consenso, porém, sobre qual seria a melhor solução. Uma das sugestões é o recálculo da dívida de cada estado pela União usando como indexador o INPC e juros de 4%, regra que passou a vigorar recentemente em substituição ao IGP-DI mais 6% ou 9% de juros. Com essa mudança, o valor dos débitos seria drasticamente reduzido. O problema é o impacto para os cofres federais.

A folha de pagamento do Estado do Rio cresceu 28,9% no ano passado frente a 2014, chegando a R$ 24,5 bilhões, de acordo com estudo divulgado ontem pelo Tesouro Nacional. Considerando apenas as despesas com inativos e aposentados, o valor desembolsado saltou de R$ 4,97 bilhões para R$ 10,84 bilhões nesse período — uma alta de 118%.

Com o pagamento do serviço da dívida com a União, o Rio teve uma redução entre 2014 e 2015. O montante passou de R$ 5,343 bilhões para R$ 5,260 bilhões no período, uma queda de 1,55%.