quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Ajuste fiscal correto seria corte de despesas, não aumento de impostos

Com Blog Rodrigo Constantino - Veja



O governo central, que reúne as contas do Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central, registrou superávit primário de R$ 4,101 bilhões no mês passado. O resultado é o menor para meses de outubro desde 2002, quando foi registrado superávit de R$ 3,797 bilhões.
No acumulado de janeiro a outubro, há déficit primário, que soma R$ 11,577 bilhões, ou 0,27% do Produto Interno Bruto (PIB). No mesmo período de 2013, o resultado primário era positivo em R$ 33,569 bilhões (0,84% do PIB).
A necessidade de estancar o rombo das contas públicas é evidente, até mesmo para os petistas. Mas como fazê-lo? Guido Mantega, no apagar das luzes de sua gestão, pretende aumentar impostos, como o de combustíveis. Essa é sempre a solução mais fácil: jogar a fatura para os ombros dos “contribuintes”.
Mas o brasileiro não aguenta mais pagar tanto imposto. A nossa carga tributária já está perto de 40% do PIB, uma das maiores do mundo, principalmente em relação aos países emergentes, nossos pares diretos. Como competir assim?
Em artigo publicado no Valor, José Júlio Senna, ex-diretor do Banco Central e chefe do Centro de Estudos Monetários do Ibre/FGV, argumenta que o discurso de impossibilidade de corte de gastos públicos tem justificado o constante aumento dos impostos, o que é ruim para o país.
Para o país voltar a crescer “é indispensável que se observe a retomada dos investimentos privados”, diz. E para tanto é fundamental aumentar a poupança doméstica, o que só será possível com menos impostos.
O recuo recente da confiança empresarial teria ligação direta com o aumento dos impostos, e isso teria levado à paralisação dos projetos empresariais, que ameaça a geração de empregos no futuro. “Corrigir esse quadro exige importantes ajustes microeconômicos, em especial simplificação e redução de tributos. Em suma, precisamos de menos impostos, e não mais”.
Além disso, Senna lembra que raramente o aumento do imposto no presente se reverte depois. Como dizia Milton Friedman, nada é tão permanente quanto uma política temporária de governo. Ao aumentar os impostos, eles são logo incorporados às contas públicas e levam a gastos elevados em caráter perpétuo.
O que Senna propõe, então, é um programa crível de corte gradual dos gastos públicos. “Cortes de despesa devem ser negociados com o Congresso e anunciados com clareza, cuidando-se para que seus efeitos se materializem ao longo do tempo, e não de pronto”, escreve. Mas para tanto é preciso encarar a realidade:
Para que essa estratégia seja viável, é indispensável que se debata e reconheça o caráter insustentável da política de gasto público no Brasil, em curso há muitos anos, sendo de grande relevância que não nos conformemos com a ideia de incompressibilidade do dispêndio público. Isso pode e deve mudar.
Na verdade, a aceitação da tese de que a despesa pública é incomprimível tem servido de justificativa para o continuado aumento da carga tributária. Há décadas, confrontados com situações semelhantes à atual, governos diferentes têm decidido elevar e criar impostos, disso resultando carga tributária consideravelmente superior à das demais economias emergentes. Note-se que esse peso não inibe apenas grandes projetos empresariais, mas também a formação e o crescimento de pequenos e médios negócios, tradicionais geradores de emprego formal.
A única solução estrutural para nossas contas públicas é a redução dos gastos do governo ao longo do tempo, em uma reforma séria que seja acreditada pelos principais agentes econômicos. A alternativa, de insistir sempre em mais impostos quando as contas públicas mergulham no vermelho, vai cada vez piorar mais o “Custo Brasil” e afugentar investidores.