No conto Olhos Mortos de Sono, do russo Anton Tchekhov, a babá Varka não aguenta mais manter-se desperta enquanto tem de acalmar um bebê que não para de chorar.
Ao mesmo tempo, vê-se capturada por uma sucessão desesperadora de demandas e adversidades.
Quando, no final, Varka estrangula a criança, a alma do leitor arrepia-se de pavor.
Por outro lado, embora o ato seja irrefutavelmente ignóbil, surge um piscar de dúvida: “Dado o contexto, o que mais Varka poderia fazer?”.
Talvez o combate entre o presidente Jair Bolsonaro e a chamada grande imprensa tenha certos tons tchekhovianos.
Mesmo sem estrangulamentos, há algo errado quando um presidente trata jornalistas em desacordo com as normas da civilidade.
“Mas também é preciso verificar o contexto do qual provém o disparate presidencial”, pondera o escritor Guilherme Fiuza, colunista da Revista Oeste desde a Edição 1.
Não se busca, aqui, absolver Bolsonaro — ou Varka.
Todavia, observadores atentos terão interesse em considerar todos os aspectos da questão.
É o que Fiuza propõe.
Em direção oposta às tensões com a imprensa têm se desenvolvido as novas relações com eleitores e candidatos nordestinos.
O clima é de cordialidade, entusiasmo, simpatia.
“Não era só o Lula que chegava assim aqui?”, brincou Bolsonaro, ao ser recebido efusivamente pela população de um pequeno município do semiárido do Rio Grande do Norte.
Silvio Navarro e Wesley Oliveira traçam o panorama do jogo político na região e mostram como o novo equilíbrio de forças tende a impactar as eleições deste ano e, claro, a de 2022.
Navarro, experiente jornalista político, autor do best-seller Celso Daniel: Política, Corrupção e Morte no Coração do PT, junta-se à Redação da Revista Oeste como editor-executivo — um precioso reforço ao nosso time fixo.
Personagem que caberia num conto curto de Tchekhov, quem sabe como releitura de um pseudoaristocrata com explícita imodéstia, o ministro Antonio Dias Toffoli é perfilado no artigo de Augusto Nunes.
“A fidelidade ao PT e a devoção ao deus da seita o transformaram em candidato natural a superjuiz quando Lula entendeu que o escândalo do Mensalão não escaparia do julgamento no Supremo”, escreve Augusto.
Ainda na Edição 23, o colunista J. R. Guzzo lança luz sobre um sujeito que poderia aparecer perifericamente numa narrativa de outro russo, o escritor Alexander Pushkin.
Pushkin retratou como poucos o funcionário público oportunista e corrupto. Vitalzinho, o ministro do Tribunal de Contas da União Vital do Rêgo Filho, tem o preciso esprit du rôle.
Ocorre que o script das instituições republicanas do Brasil do século 21, estabelecido pela “Constituição Cidadã” de 1988, não tem equivalência com a literatura russa do século 19.
Que frustração.
Revista Oeste