sexta-feira, 28 de agosto de 2020

"De Tchekhov a Pushkin, as mazelas brasileiras e o script republicano de quinta categoria"


No conto Olhos Mortos de Sono, do russo Anton Tchekhov, a babá Varka não aguenta mais manter-se desperta enquanto tem de acalmar um bebê que não para de chorar. 

Ao mesmo tempo, vê-se capturada por uma sucessão desesperadora de demandas e adversidades. 

Quando, no final, Varka estrangula a criança, a alma do leitor arrepia-se de pavor. 

Por outro lado, embora o ato seja irrefutavelmente ignóbil, surge um piscar de dúvida: “Dado o contexto, o que mais Varka poderia fazer?”.

Talvez o combate entre o presidente Jair Bolsonaro e a chamada grande imprensa tenha certos tons tchekhovianos. 

Mesmo sem estrangulamentos, há algo errado quando um presidente trata jornalistas em desacordo com as normas da civilidade. 

“Mas também é preciso verificar o contexto do qual provém o disparate presidencial”, pondera o escritor Guilherme Fiuza, colunista da Revista Oeste desde a Edição 1. 

Não se busca, aqui, absolver Bolsonaro — ou Varka. 

Todavia, observadores atentos terão interesse em considerar todos os aspectos da questão. 

É o que Fiuza propõe.

Em direção oposta às tensões com a imprensa têm se desenvolvido as novas relações com eleitores e candidatos nordestinos. 

O clima é de cordialidade, entusiasmo, simpatia. 

“Não era só o Lula que chegava assim aqui?”, brincou Bolsonaro, ao ser recebido efusivamente pela população de um pequeno município do semiárido do Rio Grande do Norte. 

Silvio Navarro e Wesley Oliveira traçam o panorama do jogo político na região e mostram como o novo equilíbrio de forças tende a impactar as eleições deste ano e, claro, a de 2022. 

Navarro, experiente jornalista político, autor do best-seller Celso Daniel: Política, Corrupção e Morte no Coração do PT, junta-se à Redação da Revista Oeste como editor-executivo — um precioso reforço ao nosso time fixo.

Personagem que caberia num conto curto de Tchekhov, quem sabe como releitura de um pseudoaristocrata com explícita imodéstia, o ministro Antonio Dias Toffoli é perfilado no artigo de Augusto Nunes

“A fidelidade ao PT e a devoção ao deus da seita o transformaram em candidato natural a superjuiz quando Lula entendeu que o escândalo do Mensalão não escaparia do julgamento no Supremo”, escreve Augusto.

Ainda na Edição 23, o colunista J. R. Guzzo lança luz sobre um sujeito que poderia aparecer perifericamente numa narrativa de outro russo, o escritor Alexander Pushkin. 

Pushkin retratou como poucos o funcionário público oportunista e corrupto. Vitalzinho, o ministro do Tribunal de Contas da União Vital do Rêgo Filho, tem o preciso esprit du rôle

Ocorre que o script das instituições republicanas do Brasil do século 21, estabelecido pela “Constituição Cidadã” de 1988, não tem equivalência com a literatura russa do século 19. 

Que frustração.

Revista Oeste