sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

Reservado, articulador e camaleão, Rodrigo Maia costurou da direita à esquerda na Câmara


Rodrigo Maia não decidiu sozinho. Ouviu de um de seus principais conselheiros políticos que, sem o PSL, partido do presidente da República, seria difícil vencer nesta sexta-feira (1º) e se tornar o primeiro homem a comandar a Câmara por três vezes consecutivas.
No fim do ano passado, o deputado eleito pelo DEM do Rio ainda tentava articular um bloco de centro que excluísse as duas maiores bancadas da Casa —PT e PSL— quando foi convencido de que o plano não era plausível.
O deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara que tenta a reeleição
O deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara que tenta a reeleição - Pedro Ladeira - 4.ago.2018/Folhapress
O emissário da advertência era o ex-ministro Moreira Franco, pai de sua mulher e com quem o parlamentar nutre uma relação muitas vezes ambígua. O recado, porém, foi suficiente para Maia, 48, perceber que não bastava ser um articulador habilidoso se quisesse garantir o ineditismo.
O cenário exigia dele um figurino mais volátil, que circulasse entre a direita representada pelo partido de Jair Bolsonaro e a esquerda sob o comando do ex-presidente Lula.
Na residência oficial, o presidente da Câmara passou a receber integrantes dos dois polos que hoje dividem o país: nomes do PT e do PSL entraram em uma costura concomitante para tentar sacramentar espaços e influência na nova legislatura.
Do lado petista, Carlos Zarattini (PT-SP), José Guimarães (PT-CE) e o líder da sigla na Casa, Paulo Pimenta (PT-PS), eram os principais interlocutores na sala de estar de Maia. Já os deputados do PSL apareciam no varejo para as nem tão longas conversas com o colega democrata.
Os diálogos mais prolongados com auxiliares de Bolsonaro restringiram-se ao ministro Paulo Guedes (Economia). A ele, Maia prometeu fazer avançar uma agenda de reformas e privatizações no Congresso e, assim, ganhou o apoio do guru econômico do presidente.
Os aliados de Lula, por sua vez, avaliavam que, fora do bloco que tinha mais chance de vencer, não teriam espaço na Mesa Diretora ou nas maiores comissões da Câmara —o que enfraqueceria a atuação institucional petista.
Novatos no poder, os ligados a Bolsonaro perceberam que era preciso entrar no jogo político para não ficar à margem das decisões.
Maia então prometeu ao PT uma secretaria —cargo que dá direito a nomeação de funcionários, além da função legislativa—, mas disse que precisava fechar primeiro um acordo com o PSL para não ficar carimbado como anti-governo.
Em 2 de janeiro, porém, quando o presidente do PSL, Luciano Bivar (PE), anunciou que a sigla estaria ao lado de Maia, o PT reagiu publicamente. Os deputados do partido de Lula admitem em reservado que não se opuseram à presença do PSL na Mesa, mas esperavam de Maia um acordo mais amplo (cargos).
Com o trato, o PSL levou uma vice-presidência e o comando do mais almejado colegiado da Casa, a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), o que frustrou petistas.
O impasse abriu uma crise e Maia precisou mexer novas peças de seu xadrez.
Namorou o PSB e conseguiu atrair PDT e PC do B para sua órbita. Desmontava assim a ideia inicial da esquerda de formar um grande bloco de oposição a seu nome.
Em 4 de janeiro, apareceu outro impasse. Arthur Lira (PP-AL) se lançou candidato à presidência da Câmara e Maia admitiu a aliados que recostava ali o maior problema para sua reeleição.
A tese do deputado era que seu antecessor, Eduardo Cunha (MDB-RJ), ordenava da cadeia os movimentos para dificultar sua recondução ao comando da Casa.
Até pouco tempo atrás, os dois eram aliados. Em 2015, foi o emedebista quem reabilitou Maia politicamente, conferindo-lhe cargos de relevância na discussão da reforma política no Congresso.
Romperam antes mesmo de Cunha renunciar e ser preso, em 2016, ano em que Maia foi eleito presidente da Câmara pela primeira vez, numa espécie de mandato tampão.
No bloco de Lira, PP, MDB e PTB tentavam atrair partidos de esquerda, entre eles o PT, para manter algum poder na Casa. Maia então ofereceu uma secretaria para cada um dos grandes partidos e esperou quem seria o primeiro a aceitar sua proposta.
Foram necessários 24 dias. Na terça-feira (28), Lira se retirou da disputa.
Desde o início das articulações, ainda em 2018, Maia navegou entre seus três perfis: reservado, quando se recolheu de entrevistas e declarações públicas para poupar sua imagem às vésperas da votação; articulador, negociando com alto e baixo clero de diversos partidos até o dia da eleição; e camaleão, ao circular entre debates conservadores e progressistas com um discurso dúbio em busca de votos.
Aos aliados de Bolsonaro, prometeu aprovar uma agenda econômica neoliberal, enquanto dizia à esquerda que barraria pontos polêmicos da pauta conservadora de costumes do novo presidente da República.
Contra Maia, concorrem nesta sexta Fábio Ramalho (MDB-MG), JHC (PSB-AL), Marcelo Freixo (PSOL-RJ), Ricardo Barros (PP-PR), Marcel van Hattem (Novo-RS) e General Peternelli (PSL-SP), este avulso, sem apoio de sua sigla.
Com 16 partidos em seu arco de apoio, o democrata espera ganhar ainda no primeiro turno, apesar de o voto secreto abrir espaço para traições.
Depois disso, resta saber qual dos Maias vai prevalecer nos próximos dois anos, em que a relação entre Congresso e Planalto está bem longe de ser tranquila.

CANDIDATOS AO COMANDO DA CÂMARA

  • Rodrigo Maia (DEM-RJ)
  • Fábio Ramalho (MDB-MG)
  • JHC (PSB-AL)
  • Marcelo Freixo (PSOL-RJ)
  • Marcel van Hattem (Novo-RS)
  • Ricardo Barros (PP-PR)
  • General Peternelli (PSL-SP)
Desistiram
  • Arthur Lira (PP-AL)
  • Alceu Moreira (MDB-RS)
  • Capitão Augusto (PR-SP)
  • ​Kim Kataguiri (DEM-SP)

Marina Dias, Folha de São Paulo