sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

Em entrevista ao NYT, Trump diz que construirá o muro mesmo sem o Congresso

Resultado de imagem para Fotos de Trump
WASHINGTON — Em tom desafiador, o presidente americano, Donald Trump, declarou nesta quinta-feira que praticamente desistiu de negociar com o Congresso por causa do seu projeto de construção de um muro na fronteira com o México. O presidente afirmou que levará adiante a  construção sem o apoio de congressistas, ao mesmo tempo em que descartou qualquer sugestão de irregularidades nas investigações que prenderam pessoas próximas a ele.
Em uma entrevista no Salão Oval da Casa Branca, Trump disse que as conversas "são um desperdício de tempo" e indicou que provavelmente agirá por conta própria quando elas oficialmente terminarem dentro duas semanas. Ele também expressou otimismo em relação a um acordo comercial com a China e negou estar em dessintonia com seus chefes de inteligência.
— Acho que Nancy Pelosi está prejudicando muito nosso país fazendo o que está fazendo. E, no final das contas, acho que arrumei a mesa muito bem — disse Trump.
Ele não fez menção de fechar o governo novamente, uma jogada que saiu pela culatra, mas sugeriu que planejava declarar uma emergência nacional para construir o muro.
— Eu arrumei a mesa, pus tudo no lugar — disse ele. — Eu preparei o cenário para fazer o que vou fazer.
Tratando de uma ampla gama de assuntos, Trump descartou as investigações que desgastaram muito a sua presidência, dizendo que seus advogados foram tranquilizados pelo vice-procurador geral, Rod J. Rosenstein, que teria assegurado que o próprio presidente não era um alvo.
— Ele disse aos advogados que eu não sou uma questão, não sou um alvo — disse Trump.
Mesmo se for esse o caso, não se sabe se o assunto seria encaminhado à Câmara para possíveis audiências de impeachment.
Trump acrescentou que nunca falou com Roger Stone, seu antigo associado que foi indiciado na semana passada, sobre o WikiLeaks e os e-mails democratas roubados que ele postou durante a eleição de 2016, nem mandou ninguém fazer isso.
— Não, eu não fiz isso. Eu nunca fiz isso — disse ele, quando pergunta se falou com Stone sobre o assunto.
E o presidente alguma vez instruiu alguém a entrar em contato com Stone sobre o WikiLeaks?
— Nunca — ele repetiu.
O presidente rejeitou a importância da Trump Tower que sua equipe estava tentando construir em Moscou no auge da campanha de 2016, e negou o relato de seu próprio advogado sobre até quando sua equipe ainda estava discutia o projeto. Ele negou que suas mensagens no Twitter sobre ex-associados que estão cooperando com promotores sejam uma intimidação de testemunhas.
Trump também disse que não desempenhou nenhum papel na Casa Branca para que Jared Kushner, seu genro e conselheiro sênior, recebesse uma autorização secreta, que o permitiria ter acesso a informações controladas. O requerimento de Kushner foi rejeitado pelo menos uma vez após preocupações levantadas pelo FBI sobre seus contatos estrangeiros. A CIA, que também manifestou preocupação, continuou a negar-lhe acesso a "informações confidenciais categorizadas".
A entrevista com Trump aconteceu em um dia cheio na Casa Branca, enquanto o presidente tenta se recuperar da paralisação parcial de 35 dias do governo, na qual fracassou na tentativa de forçar os democratas a financiar seu muro e prejudicou o seu índice de popularidade. Com a maioria dos americanos culpando-o pelo impasse, Trump expressou frustração por não ter recebido crédito pelo que viu como suas conquistas, incluindo a desregulamentação de atividades econômicas, o aumento dos gastos militares e as negociações nucleares com a Coreia do Norte.
Recém-saído de uma reunião sobre comércio com o vice-primeiro-ministro da China, Trump parecia relaxado e confiante, enquanto tentava defender a si, distribuindo folhetos que incluíam cópias impressas de dois tuítes enviados em seu nome.
A entrevista foi organizada depois que Trump entrou em contato com A.G. Sulzberger, editor do The New York Times, e o convidou para um jantar informal. Sulzberger recusou, dizendo que preferiria uma entrevista gravada que incluísse dois de seus repórteres. O presidente concordou.

'Eu adoro este trabalho'

Na entrevista, Trump estava sentado em sua mesa de trabalho, tomando goles esporádicos de sua Coca diet com cubos de gelo, bastante à vontade. Seu chefe de equipe interino, Mick Mulvaney; seu assessor sênior de comunicação, Bill Shine; e sua secretária de imprensa, Sarah Huckabee Sanders, participaram da sessão com Sulzberger e os dois repórteres.
Trump falou com uma voz baixa, com os braços cruzados bem perto de si durante perguntas sobre a investigação na Rússia, enquanto seus ajudantes ficavam inquietos. Mas seu humor estava mais leve e melhor em outros pontos. Ele ficou mais animado ao condenar a cobertura da imprensa, que considera injusta, e questionou os relatos persistentes de desordem na Casa Branca, observando que sua equipe escreve memorandos secretos de como se sentem lá, para ele ler.
— Eu tenho alguém... Acredite, eles me avaliam.
Em um ponto, ele zombou da noção de que ele estava ganhando dinheiro com a presidência, chamando o trabalho de “um fracasso” em termos financeiros. Ainda assim, rejeitou qualquer especulação de que não concorrerá à reeleição no ano que vem.
Trump cercado por repórteres e assessores da Casa Branca Foto: TOM BRENNER / NYT
Trump cercado por repórteres e assessores da Casa Branca Foto: TOM BRENNER / NYT
— Eu adoro este trabalho — afirmou, antes de acrescentar que não esperava que alguém no Partido Republicano fosse disputar a indicação da sigla com ele, apesar de vários candidatos terem apontado que concorrerão. — Eu não vejo isso acontecendo. Tenho grande apoio no partido.
Referindo-se ao campo democrata, Trump disse que o partido da oposição "realmente foi muito longe para a esquerda" e ridicularizou a senadora Elizabeth Warren, de Massachusetts, enquanto expressava admiração pelo início da campanha da senadora Kamala Harris, da Califórnia, que atraiu milhares de apoiadores.
Trump também teve palavras duras para a presidente da Câmara dos Representantes Nancy Pelosi, que se negou veementemente a aprovar até mesmo um dólar dos US$ 5,7 bilhões que ele buscou para seu muro na fronteira, que ela denunciou como "imoral". Trump apostou que ele poderia forçá-la a recuar através do fechamento do governo e ficou irritado quando não conseguiu.
— Eu sempre me dava bem com ela, mas agora não acho que vou mais — disse Trump. — Acho que ela está fazendo um tremendo desserviço ao país. Se ela não aprovar o muro, o resto é apenas um desperdício de dinheiro, tempo e energia, porque o muro é desesperadamente necessário.
Trump tem considerado declarar uma emergência para gastar dinheiro erguendo o muro mesmo sem a aprovação do Congresso, uma ação a que até mesmo alguns republicanos se opuseram e que certamente levaria a uma disputa nos tribunais.
— Eu vou continuar a construir o muro e vamos terminar o muro — disse ele. — Agora, se declaro ou não uma emergência nacional, isto você verá.

Defesa da política na Síria

O presidente defendeu as suas decisões de retirar as tropas da Síria e do Afeganistão no mesmo dia em que o Senado aprovou uma medida patrocinada pelos republicanos condenando uma "retirada precipitada" desses dois países.
— Fui eleito dizendo que estamos saindo dessas guerras intermináveis—  disse ele.
No entanto, ele não explicou por que tomou uma atitude tão assertiva ao tentar forçar a saída do presidente Nicolás Maduro da Venezuela, deixando aberta até mesmo uma opção militar, sem criticar outros países autocráticos como a Arábia Saudita.
— Estou dizendo isso: coisas terríveis estão acontecendo. Coisas terríveis estão acontecendo na Venezuela — disse ele. — Agora, na Arábia Saudita, muita melhora foi feita na Arábia Saudita —  disse ele, acrescentando que o assassinato do jornalista saudita Jamal Khashoggi foi "um crime terrível".
Em outro ponto de discórdia, o presidente disse que convocou seus chefes de inteligência, incluindo Dan Coats, o diretor nacional de inteligência, para a Casa Branca, na quinta-feira, porque havia ouvido que eles haviam questionado sua política externa durante o depoimento ao Congresso nesta semana.
Coats e os outros disseram aos legisladores que a Coréia do Norte não deve abandonar seu arsenal nuclear, que o Irã não voltou a tomar ações para construir o seu próprio e que o Estado Islâmico não foi derrotado, todas avaliações que entram em conflito com a visão de mundo do presidente.
Mas Trump disse que os chefes de inteligência disseram que as declarações de Coats foram mal interpretadas.
— Eles disseram: “Senhor, nosso testemunho foi totalmente descaracterizado — disse Trump. — Eu disse: “Do que você está falando?” E quando você lê o testemunho deles e lê as declarações deles, isso teve o sentido mudado pela imprensa.
Mesmo que tenha atacado os chefes no começo da semana, Trum disse:
— Eu estou feliz com Dan Coats.

O projeto de Moscou

Trump ofereceu um relato vago de seu envolvimento no projeto de Moscou. Michael D. Cohen, seu ex-advogado pessoal, se declarou culpado de mentir ao Congresso sobre o projeto e disse às autoridades que as conversas continuaram até o verão de 2016, mesmo quando Trump estava indo atrás da indicação republicana.
Rudolph W. Giuliani, o atual advogado do presidente, disse recentemente que as negociações ocorreram durante as eleições de novembro. Pouco depois, afirmou que estava enganado e falando apenas hipoteticamente.
— Ele estava errado — disse Trump na quinta-feira. — Rudy enganou-se um pouco. Mas o que aconteceu foi isto: eu não me importei. Esse acordo não era importante. Era essencialmente uma carta de intenções ou uma opção.
Perguntado quando foi a última conversa que ele teve sobre o projeto em 2016, Trum disse:
— Eu diria que foi cedo, por volta do meio do ano. Agora, eu não sei que Cohen foi um pouco além disso. Eu não acho que levaria muito mais tempo — afirmou. — Eu estava concorrendo à presidência; Eu estava indo muito bem. A última coisa que me importava era em construir um prédio.
Cohen tem sido o foco da ira de Trump recentemente, incluindo tweets hostis que seu ex-advogado e outros interpretaram como ameaças. Entre outras coisas, o presidente escreveu que as autoridades deveriam investigar o sogro de Cohen.
— Não é intimidação de testemunhas — disse Trump. — Não é intimidação de testemunhas de todo.
Perguntado sobre o que era, então, ele disse:
— Acho que as pessoas têm o direito de falar o que pensam. Você sabe, dizer o que lhes vêm à cabeça. Eu ouvi isso por um período de tempo. Mas outras pessoas também disseram isso. Quero dizer, muitas pessoas disseram isso.
Trump negou ter ficado chateado ao ver William P. Barr, seu indicado à procurador-geral, atestar seu longo relacionamento com Mueller durante sua audiência de confirmação e se comprometer a deixar o conselho especial terminar sua investigação.
— Eu ouvi a declaração e foi totalmente aceitável para mim, disse o presidente.
Ele disse que inicialmente não estava ciente de que Barr, como advogado particular, havia redigido um memorando criticando a possível abordagem de Mueller à obstrução da justiça.
— Quero dizer, eu li depois — disse ele. — Mas eu não sabia.Eu nunca li o memorando.

Peter Baker e Maggie Haberman do The New York Times