RUBENS VALENTE
BELA MEGALE
Folha de São Paulo
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Na decisão em que autorizou a deflagração da Operação Greenfield, realizada nesta segunda-feira (5), o juiz da 10ª Vara Federal de Brasília, Vallisney de Souza Oliveira, apontou que a investigação detectou que os fundos de pensão dos funcionários das estatais Caixa Econômica, Banco do Brasil, Petrobras e Correios "pagavam pelas cotas do FIP mais do que elas de fato valem, sofrendo, assim, um prejuízo 'de partida', independente do próprio sucesso que venha a empresa a ter no futuro".
Os FIPs são Fundos de Investimentos em Participações lançados por empresas no mercado de capitais para captar recursos com a venda das cotas e, assim, bancar investimentos empresariais, como ampliação de atividades.
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O juiz afirmou, na decisão, que as aquisições das cotas de pelo menos oito dos FIPs sob investigação "foram precedidas de avaliações econômico-financeiras ('valuations') irreais e tecnicamente irregulares, tendo como objetivo real superestimar o valor dos ativos da empresa, aumentando, de forma artificial, a quantia total que o próprio fundo de pensão precisa pagar para adquirir a participação acionária indireta na empresa".
O magistrado comparou a situação "aos conhecidos 'superfaturamentos' de obras públicas, no qual o valor de uma obra é superestimado a fim de justificar um pagamento a maior por parte do poder público ou dos fundos de pensão".
Segundo o Ministério Público Federal, em documento referido pelo juiz, "foram verificadas irregularidades/ilicitudes em pelo menos oito casos de investimentos dos fundos de pensão em FIPs": Cevix (participações da Funcef e da empreiteira Engevix), Multiner (fundos e administração da corretora Planer), Sondas (fundos e Sete Brasil), OAS Empreendimentos (Funcef e empreiteira homônima), Enseada (Petros, Funcef, uma agência de fomento do Amazonas e uma credora da Gradiente), RG Estaleiros (Funcef e Engevix), Florestal (Funcef, Petros e a Eldorado, controlada pela J&F, do grupo JBS) e Global Equity (Funcef, Petros, Previ e a Global Equity Administradora de Recursos).
Além dos negócios nos FIPs, conforme a decisão do juiz, a investigação também trata da aquisição direta de fundos em participação acionária na Invepar, um braço da OAS em concessão de rodovias, e um suposto prejuízo da Funcef "na alienação subfaturada de salas comerciais no edifício da OAB [Ordem dos Advogados do Brasil]" em Brasília, o que, segundo a decisão do juiz, "foi confirmado por laudo técnico, em total desprezo para com o patrimônio do fundo de pensão".
SUSPENSÃO DO MERCADO
Na mesma decisão, o juiz determinou, além de prisões e depoimentos de investigados sob coerção na PF, como medidas alternativas à prisão preventiva para um grupo de 40 investigados a suspensão "do exercício de toda e qualquer atividade no mercado financeiro e no mercado de capitais, bem como suspensão do exercício de qualquer cargo ou função de direção em empresa ou grupo empresarial", a suspensão "do exercício de toda e qualquer função pública ou de direção ou gerência, inclusive em conselhos, desempenhadas em entidades fechadas de previdência complementar" e a apreensão de passaportes.
Na lista dos 40 investigados que deverão sofrer as sanções estão José Aldemário Pinheiro, o Léo, ex-presidente e sócio do grupo OAS, Wesley e Joesley Mendonça Batista, do grupo J&F, Cristiano Kok e Gerson Almada, sócios da Engevix, o ex-diretor presidente do Postalis Alexej Predtechensky, o ex-diretor presidente da Funcef Carlos Alberto Caser, o ex-presidente da Funcef Guilherme Narciso de Lacerda, dois sócios da firma de auditoria Deloitte Touche Tohmatsu, José de Carvalho Júnior e Pieter Jacobus Marie Freriks, e a gerente-sênior da mesma empresa, Cláudia Regina Kanan Diniz, o presidente da Gradiente Eugênio Emilio Staub, o ex-diretor da Sete Brasil e réu na Operação Lava Jato, quando fez delação premiada, Eduardo Costa Vaz Musa, outro executivo da mesma empresa, João Carlos de Medeiros Ferraz, o ex-vice presidente da Engevix Gerson de Mello Almada, o ex-presidente da Previ Sérgio Ricardo da Silva Rosa, o empresário do Grupo WTorre Walter Torre Júnior, entre outros.
A PF informou que nas casas e empresas dos investigados foram apreendidos R$ 350 mil, US$ 100 mil e 50 mil euros em espécie, além de obras de arte, joias e carros de luxo. Os carros foram "entregues aos respectivos donos, que ficam como depositários fiéis dos bens e não podem dispor dos mesmos sem autorização judicial".
OUTRO LADO
A assessoria da holding J&F afirmou que os investimentos feitos pela Petros e Funcef na Eldorado foram de R$ 550 milhões no ano de 2009. "De acordo com último laudo independente (Deloitte) emitido em dezembro de 2015, a participação dos fundos atualizada é de R$ 3 bilhões, ou seja 6 vezes o valor investido inicialmente." A empresa e executivos disseram ainda que colaboram com as investigações e estão à disposição das autoridades para prestar esclarecimentos.
O Grupo WTorre, em nota, disse que não tem negócios na esfera do Poder Público. "A companhia não teve e não tem nenhuma relação direta com nenhum dos fundos de pensão citados na Operação Greenfield. A companhia e seus executivos estão, sempre que solicitados, à disposição da Justiça e demais autoridades."
"A empresa está colaborando com as autoridades para prestar os devidos esclarecimentos e não comenta investigações sob segredo de Justiça", disse a construtora Engevix, em nota.
"A Polícia Federal solicitou ao Santander o fornecimento de alguns documentos relacionados aos fundos Funcef, Global, Petros, Previ e à Sete Brasil. Fundamental esclarecer que essas investigações não têm qualquer relação com o Santander, mas sim com os referidos fundos", disse o banco Santander em nota.
"A BRAM e a BEM, na qualidade de prestadores de serviços para terceiros, respectivamente para gestão e administração de fundos de investimentos, informam que seguem estritamente o regulamento dos fundos sob sua gestão e administração e as regras definidas pelos reguladores. Acrescentam ainda que estão prestando toda a colaboração requerida pelas autoridades", diz a nota divulgada pelo Bradesco.
Em nota, a Funcef afirmou que "confirma operação da Polícia Federal em sua sede, em Brasília, para o cumprimento de mandados judiciais". "A Fundação reitera que possui rigorosos padrões éticos em todos os investimentos e na relação com seus participantes e assistidos e reafirma que está, como sempre esteve, à disposição das autoridades competentes para prestar os esclarecimentos que vierem a ser solicitados."
A Caixa afirmou que "já havia criado força-tarefa específica, constituída por técnicos do quadro de carreira da instituição, para apurar a existência de eventuais irregularidades no âmbito dos investimentos da Fundação, inclusive os que possuem administração do banco". O banco disse, ainda, que essa equipe mantém contato permanente com as autoridades e que colabora com as investigações.
A Postalis afirmou, em comunicado, que se colocou à disposição das autoridades e que "tem todo o interesse" em que os fatos sejam esclarecidos.
A Petros comunicou que está colaborando com as investigações e que a busca e apreensão limitou-se a investimentos decididos até 2011. "A Petros reforça o comprometimento da gestão com a transparência, as práticas de boa governança e a responsabilidade", defendeu.
A Previ disse que "possui um modelo de governança maduro e transparente" e que a CPI dos Fundos de Pensão, concluída recentemente na Câmara dos Deputados, não constatou nenhuma irregularidade no fundo.
A Rio Bravo afirmou ter "poucas relações com os fundos de pensão que são objeto desta investigação, mesmo trabalhando com a maior parte das empresas deste segmento, sempre com lisura, ética e total observância à legislação". A empresa disse ainda que apoiará as ações das autoridades brasileiras no combate a práticas ilegais de agentes públicos e privados que está à disposição para prestar informações e auxiliar as investigações.
A afirmou estar colaborando com a Polícia Federal, "fornecendo informações em relação a trabalhos realizados a cliente".
A Gradiente e a Sete Brasil informaram que não vão se posicionar sobre a operação. A defesa de Léo Pinheiro também afirmou que não irá se manifestar.
A reportagem ainda não conseguiu contato com as outras investigadas nem com a defesa de Vaccari.