O pedido de recuperação judicial da Oi e a desaceleração da economia brasileira, somado aos cortes de custos de Vivo, TIM e Claro, farão com que os investimentos em telecomunicações despenquem neste ano. De acordo com projeções do setor, a expectativa é que os recursos destinados à ampliação e à manutenção de rede caiam cerca de 30% em 2016 em relação ao ano passado, passando de R$ 28,6 bilhões para cerca de R$ 20 bilhões. É o menor patamar desde 2010 e a maior queda percentual desde 2002. À época, o resultado havia sido influenciado pelo racionamento de energia elétrica de 2001, de acordo com os dados da SindiTelebrasil, que reúne as companhias do setor.
Para especialistas, o menor investimento vai afetar em cheio a qualidade do serviço de telecomunicações no país. Juarez Quadros, sócio da Orion Consutores e ex-ministro das Comunicações, ressalta que o menor aporte das companhias se reflete também nas empresas que fornecem infraestrutura, que passam por ajustes no quadro de funcionários.
Dados de consultores e da Abeprest, associação que reúne as companhais que prestam serviços de engenharia de telecomunicações, mostram que mais de 200 empresas já fecharam as portas desde 2015.
O consultor e engenheiro Hermano Pinto ressalta que este será o segundo ano seguido de cortes nos investimentos. Hoje, avalia ele, as companhias estão postergando as ampliações em banda larga fixa e voltando sua atuação para os investimentos em telefonia móvel, segmento que oferece um retorno financeiro mais rápido. Ele cita que hoje cerca 30% dos cabos das operadoras estão danificados.
— A preocupação, agora, é com o fluxo de caixa das operações. O investimento em fibra óptica (que permite maior conexão de dados e pelo qual ainda trafega serviços de telefonia) neste ano está muito abaixo do esperado. A modernização de rede também está aquém da demanda do país. Um exemplo é a real necessidade de manutenção dos cabos. Hoje, a preocupação é fazer investimento onde há retorno sobre o capital investido em, no máximo, doze meses. O grande problema é que as empresas estão reduzindo seus investimentos neste momento de retração, o que vai criar um gargalo quando houver a retomada do crescimento — destacou Hermano.
Preocupação com qualidade
Além da crise econômica, que abate as empresas de todos os setores, Quadros, da Orion, ressalta que o setor de telefonia ainda sofre com as mudanças de comportamento do consumidor, que está com o orçamento mais restrito devido às altas nos preços. Segundo ele, há hoje redução de receitas em quase todos os serviços, sobretudo as oriundas da voz, que ainda somam metade do faturamento das companhias.
— Já há um movimento de contenção de gastos do consumidor. Além disso, os novos aplicativos, como o WhatsApp, vem retirando receita das operadoras. Na última semana, quando o serviço saiu do ar, por uma nova decisão da Justiça do Rio, o país quase parou.
E, com menos receitas, as empresas vêm reduzindo seus investimentos. E isso é muito preocupante do ponto de vista da qualidade na prestação de serviços — afirma Quadros.
Segundo dados da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), as empresas têm amargado perda de clientes neste ano. Até maio, o segmento de telefonia móvel encolheu em 2,5 milhões de clientes, para 255,2 milhões de acessos. Além da já conhecida estagnação da telefonia fixa, a TV por assinatura, que vinha crescendo, perdeu mais de 200 mil clientes neste ano, até maio, para 18,9 milhões de usuários. Dados que, segundo especialistas do setor, devem continuar a apresentar recuo.
— Com isso, os investimentos vão cair 30% neste ano. Talvez haja algum sinal de melhora no país no último trimestre, o que pode trazer mais otimismo ao setor. Mas isso é só uma perspectiva. O fato é que o setor está no segundo ano de retração — disse uma fonte do setor que não quis se identificar.
A Vivo, do grupo espanhol Telefónica, registrou queda de 15,3% nos investimentos no primeiro trimestre deste ano em relação ao mesmo período do ano anterior, caindo de R$ 1,760 bilhão para R$ 1,491 bilhão. Na TIM, houve recuo de 23,1% na mesma base de comparação, passando de R$ 923,7 milhões para R$ 710,235 milhões. No Grupo América Móvil, dono da Claro, Embratel e NET, os investimentos podem cair de 10% a 20% neste ano. Em 2015, o grupo destinou R$ 9,3 bilhões.
Pwc PREVÊ CAIXA DA OI EM r$ 1,5 BI NO FIM DO ANO
No caso da Oi, em recuperação judicial, e com dívidas de cerca de R$ 65,4 bilhões, os investimentos tiveram alta de 22,2% nos primeiros três meses deste ano em relação ao ano anterior, passando de R$ 1,025 bilhão para R$ 1,252 bilhão. Mas o cenário deve mudar até o fim do ano, dizem fontes. Segundo um documento da Anatel, a expectativa é que a Oi poderia investir, antes do pedido de recuperação judicial, cerca de R$ 3,4 bilhões neste ano, menos que os R$ 4,1 bilhões de 2015 e os R$ 5,2 bilhões de 2014. Porém, a companhia informou, no âmbito dos documentos da recuperação judicial, divulgados no mês passado, que existe uma previsão de investimento de cerca de R$ 5,2 bilhões em 2016.
A PwC, escolhida na sexta-feira administradora judicial da Oi, estimou em documento enviado à 7ª Vara Empresarial do Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ) que a tele chegaria ao fim do ano com caixa de R$ 1,5 bilhão, ante R$ 16 bilhões em 2015. A auditoria ressaltou ainda que “a posição de caixa da Oi caiu quase 50% em apenas um trimestre, de R$ 16,5 bilhões no quarto trimestre em 2015 para R$ 8,5 bilhões no primeiro trimestre de 2016”.
Com menos investimentos, especialistas ressaltaram que a Anatel terá de aumentar a fiscalização para acompanhar se os investimentos mínimos obrigatórios estão sendo cumpridos pelas empresas. As teles, ao adquirirem licenças de telefonia móvel, se comprometem a levar redes 3G e 4G para diversas cidades. No caso da telefonia fixa, há ainda metas para garantir a qualidade de cobertura, explica Quadros:
— Terá que aumentar a fiscalização. As companhias Vivo, TIM e Claro têm suas matrizes no exterior, que sofreram muito com a questão do câmbio. A Oi preocupa por estar em um processo de recuperação judicial. A questão agora é saber como o processo será conduzido, pois a empresa tem entre seus credores diversos fornecedores de infraestrutura.
Hélio Bampi, presidente da Abeprest, diz que a crise atual na economia fez as empresas de telefonia reverem seus planos de investimentos. Segundo ele, as teles buscam cada vez mais produtividade, o que acaba reduzindo o número de funcionários ligados ao setor. Por isso, Bampi concorda com as previsões que apontam uma redução de 300 para cerca de 80 no número de companhias que prestam serviços de engenharia de telecomunicações no Brasil:
— Estamos vendo o fechamento de empresas que fazem manutenção e melhorias em rede. E são companhias dos mais variados portes.
Ricardo Morishita, diretor de Projetos e Pesquisas do Instituto Brasiliense de Direito Público, lembra que hoje o setor de telefonia é marcado “por altos preços e baixa qualidade de serviços e operações”.
— Enquanto nos países de economia mais madura a qualidade e o preço caminham juntos e o avanço tecnológico é rapidamente incorporado para melhoria da qualidade, aqui vivemos uma política na qual as empresas se esmeram em cumprir, quando assim o fazem, o limite mínimo do que é estabelecido pela regulação. A questão dos investimentos é sempre uma preocupação, pois pode afetar o consumidor — afirma Morishita.
Procurada, a Telefônica Vivo disse que continua a investir recursos necessários para oferecer os melhores serviços aos seus clientes. “A empresa tem um compromisso de longo prazo com o Brasil, expresso em investimentos que só neste ano podem chegar a R$ 8,7 bilhões”, informou. A TIM disse que segue com seu plano de investimentos na ampliação de sua infraestrutura no país. A Claro não respondeu por estar em período de silêncio. A Oi disse que não faz projeções.